“Nunca a questão da propriedade se colocou. Nem antes do negócio [da compra do terreno ao casal que, dois meses antes, o registou por usucapião num Cartório de Montalegre], nem depois, nos vários contactos com a autarquia, pelo menos desde 2004/2005, devido à perda de direitos construtivos [do terreno]. Nunca a Câmara do Porto suscitou a questão”, afirmou o sócio-gerente da Selminho, Sebastião Moreira, na primeira sessão do julgamento no Tribunal Judicial da Comarca do Porto para decidir se existem, ou não, direitos de propriedade conflituantes sobre o mesmo imóvel.

O diretor municipal de Finanças e Património da Câmara esclareceu que, naqueles serviços, parte do terreno da Selminho está “registado como municipal” e apenas se constatou que a empresa o apresentava como seu quando “já era público o “designado caso Selminho [relativo a um acordo administrativo entre a imobiliária e a autarquia]” e um técnico elaborava um parecer devido “a um pedido de limpeza da propriedade”.

De acordo com Pedro Santos, os serviços municipais de Património fizeram a ligação entre o dito terreno municipal e a empresa “em junho ou julho de 2016”, após um “pedido de informação” sobre a propriedade do mesmo, feita pelos “serviços do Ambiente ou Fiscalização”.

“Quando um chefe estava a fazer um pedido de informação sobre a propriedade do terreno, confrontou-se com uma fotografia num jornal, a propósito do ‘caso Selminho’, que identificava a parcela como sendo da imobiliária”, afirmou o diretor.

Pedro Santos explicou que, abaixo do terreno em causa, inscrito como municipal e comprado pela Selminho, existe um condomínio que “pelo menos em 2013, 2014, 2015, apresentou pedidos de limpeza aos serviços do Ambiente ou da Fiscalização”.

“De cada vez que recebem estes pedidos, o Ambiente ou a Fiscalização repetiam o pedido ao Património. É o padrão”, observou.

Quanto a Sebastião Moreira, disse que à data da compra do terreno pela Selminho, por “35 mil contos”, embora não sendo o gerente da sociedade, fazia parte da mesma e teve “intervenção no negócio”.

“O meu irmão Luís Miguel pediu-me que avaliasse tecnicamente o terreno”, esclareceu o arquiteto.

Sebastião Moreira afirmou que “nunca” conheceu o casal que vendeu o terreno à Selminho nem teve “conhecimento da parte mais formal do negócio”, tratada “com os advogados”.

Acrescentou que o irmão “nunca, de todo”, referiu “problemas com o terreno”.

Ao juiz, admitiu não ter “visto cadernetas prediais para avaliar o terreno”, apontando que “o valor da venda deve ter sido indicado pelos vendedores”.

Concluiu não saber “se o vendedor indicou o preço ou se o irmão fez uma contraproposta”.

“A ideia que tenho é que foi pedido este valor e foi aceite”, declarou.

Quanto a um dos vendedores, João Batista Ferreira, indicou que “quem fez o preço do terreno foi o senhor doutor”, referindo-se ao advogado.

“Para mim acho que foi bom, era muito dinheiro”, frisou.

Momento antes, a mulher, Maria Irene Pereira Ferreira, afirmou: “Não combinámos o preço. Eles disseram que nos davam 35 mil contos”.

“Eu não tinha nada, aquele dinheiro era muita coisa”, descreveu.

Este processo cível foi movido pela Câmara do Porto em 2017, após ter sido tornado público que um técnico superior da autarquia concluiu ser municipal uma parcela de 1.661 metros quadrados que integra os 2.260 metros quadrados apresentados pela Selminho para construção na escarpa da Arrábida.

A autarquia pede em tribunal que seja declarada a nulidade da escritura que, em 2001, transferiu por usucapião esses 1.661 metros quadrados para a posse de um casal, bem como a nulidade das “transmissões subsequentes”, ou seja, o contrato de compra e venda entre o casal e a Selminho.

[Notícia atualizada às 17h12]