Diário de quarentena, por Patrícia Reis. Dia 11


Ontem, 21 de março, foi o Dia da Poesia e eu, como faço sempre, liguei à poetisa Maria Teresa Horta. Falámos sobre os poemas que tem publicado no Facebook, sobre coisas de família e, claro, deste momento que nunca imaginámos viver. Dizia-me ela, daquele jeito que tem de dizer as coisas, que era estranho não ouvir os aviões a rasgar os céus, os carros na avenida, as travagem bruscas. Talvez ao contrário de muitos, Teresa incluída, eu possa dizer que sinto um enorme conforto com o silêncio. Não temos a noção exacta de como somos bombardeados por ruído e o silêncio é um tesouro imenso.

A Maria Teresa Horta, que é uma grande poetisa e escritora, faz o grande favor de ser minha amiga e as conversas são fáceis, por isso concordamos que discordamos e continuamos a conversar sobre o futuro, ou sobre aquilo a que a Teresa chama “uma espécie de futuro”. Disse-me: Nasci em 1937, nunca imaginei viver isto.

Para comemorar o Dia da Poesia, a Teresa publicou nas redes sociais um poema do seu livro Poesis (2017). Aqui o deixo, para lerem e sentirem o poder imenso da poesia:

POEMA A POEMA

Poema a poema escrevo poesia
dia após dia, após noite e sobressalto
cerro e sussurro e de novo tumulto
*
Poema a poema escrevo o desassossego
a translúcida lisura de asa, a harmonia
que deseja o verso no corpo da luz
*
Poema a poema vou tocando, tomando
o corpo da escrita,afagando a linguagem
num lento e indizível prazer indeterminável
*
Sonho, após sonho, após metáfora
após sintaxe
Palavra após palavra, após palavra
*
após palavra...