
No debate promovido pela RTP, quase 30 minutos foram dedicados a um dos temas que vai marcar a campanha eleitoral e, eventualmente, decidir as eleições: a conduta ética do primeiro-ministro no caso Spinumviva e, por arrasto, de quem é a culpa de termos eleições antecipadas. Uma pergunta que anda, provavelmente, na cabeça de muitos portugueses num cenário político em que as sondagens mostram o desagrado geral por mais umas eleições.
"Eu fiz tudo de boa fé, dentro daquilo que são os parâmetros da lei"
Luís Montenegro manteve o seu discurso. A culpa, disse, é da oposição que rejeitou a moção de confiança."Eu fiz tudo de boa fé, dentro daquilo que são os parâmetros da lei, dos parâmetros do comportamento ético; nunca tive nenhum comportamento ilegal”, reiterou.
O moderador, Carlos Daniel, também reiterou – contrapondo com a visão dos demais partidos. “Como sabe, ao seu redor estão sete pessoas que consideram que não esteve bem neste processo, embora com graus de censura diferentes”. O mesmo moderador que relembrou a Pedro Nuno Santos a afirmação proferida no frente a frente com Luís Montenegro, a 30 de abril, quando deu a entender que o primeiro-ministro quis usar o timing do debate para divulgar, publicamente, informações sobre os outros clientes da Spinumviva, cuja identidade tinha inicialmente recusado partilhar – “tirou um coelho da cartola”, afirmou então o líder socialista.
"Para mim, é claro que Luís Montenegro não tem a credibilidade nem a idoneidade necessária para a função de primeiro-ministro"
Na resposta, Pedro Nuno Santos começou por afirmar que não tinha “muito a acrescentar” sobre o tema. “Para mim, é claro que Luís Montenegro não tem a credibilidade nem a idoneidade necessária para a função de primeiro-ministro. Um primeiro-ministro é transparente, não foge ao escrutínio, não evita obrigações declarativas ao Tribunal Constitucional, nem à entidade para a transparência”.
Seguiu-se André Ventura, também ele questionado com o facto que marcou o frente a frente que já teve com Luís Montenegro e no qual se absteve de falar do caso Spinumviva. Porquê, pergunta o moderador?
"Obviamente não foi transparente. E quando soube que havia uma comissão de inquérito, quis evitá-la. E mandou o país para eleições para evitar um escrutínio no Parlamento"
“Os assuntos do debate são os assuntos que surgem no debate”, foi a resposta. “Disse que era uma pequena empresa familiar, uma pequena coisa familiar, e portanto dizendo às pessoas, não se preocupem, isto aqui não tem nada. (...) Obviamente não foi transparente. E quando soube que havia uma comissão de inquérito, quis evitá-la. E mandou o país para eleições para evitar um escrutínio no Parlamento. Isto é o que sabemos hoje.”
"Se houver o mesmo caso, ou outro caso, o que é que faz? Leva o país outra vez para uma moção de confiança?”
Rui Rocha retoma a questão sobre quem recai a responsabilidade do atual cenário político e defende o que tem defendido, que todos, “à exceção da Iniciativa Liberal, contribuíram para uma crise política, para irmos a eleições”.
“E, portanto, a pergunta que se põe a partir daqui é como é que todos eles conseguem assegurar aos portugueses condições de um mínimo de estabilidade (...) Isto é uma pergunta que o Luís Montenegro tem que responder. Se houver o mesmo caso, ou outro caso, o que é que faz? Leva o país outra vez para uma moção de confiança?”.
“Quis abrir uma empresa de consultoria e manter essa empresa enquanto era primeiro-ministro e manter as avenças dessa empresa, portanto, acumular tudo"
A ronda ainda vai a meio e é a vez de Mariana Mortágua lamentar não “não ter podido debater este tema com o Luís Montenegro cara a cara”, numa alusão ao facto de o líder do PSD ter passado o debate com o BE para Nuno Melo, líder do CDS.
“Agora temos a oportunidade de o fazer, ainda que seja um pouco mais gelado e não tão cara a cara. Parece-me que a República tem que se levar a sério. E o Luís Montenegro é vítima apenas das suas escolhas e da falta de noção do que implica ser primeiro-ministro”.
“Quis abrir uma empresa de consultoria e manter essa empresa enquanto era primeiro-ministro e manter as avenças dessa empresa, portanto, acumular tudo. Quando isto foi descoberto e confrontado com isso, escolheu não dar explicações. Nós enviámos perguntas críticas e até hoje não foram respondidas (...) eu posso responder a uma pergunta com um relato de futebol. E não é só porque eu não queria um relato de futebol, é porque eu perguntei sobre... ...contas bancárias e declarações”.
"Aquilo que se conhecia há um mês atrás era mais que suficiente para que Luís Montenegro se tivesse demitido"
“Nós fomos muito claros desde a primeira hora. Aquilo que se conhecia há um mês atrás era mais que suficiente para que Luís Montenegro se tivesse demitido.(...) – o líder do PCP, Paulo Raimundo, manteve as linhas gerais do que tem defendido desde que foi revelado o caso Spinumviva.
“Não era preciso saber mais nada para se chegar à conclusão que o primeiro-ministro, naquele famoso sábado à noite, o que devia ter tido para anunciar ao país era a sua demissão. Não foi isso que Luís Montenegro fez. Quis salvar a sua imagem, numa fuga para a frente, mas quis também salvar a sua política”.
“Acha normal que, durante meses ou anos, vamos ficar a perguntar-nos sobre cada decisão, sobre cada concurso ganho por uma empresa que tenha sido sua cliente ou cliente da sua empresa, familiar?"
Quase a fechar, o líder do Livre, Rui Tavares, teve das intervenções mais confrontativas e concretas.
“Eu senti-me enganado, talvez outras pessoas no Parlamento se tenham sentido enganadas Porque nos ocultou informação e continuou a ocultar informação. (...) Não quis fechar a empresa, não quis vender a empresa, porque prejudicaria o seu projeto familiar. Mas porque é que não fez aquilo que se faz em tantos lugares do mundo, dos países com os quais gostamos de nos comparar? Que ainda agora, recentemente, foi feito pelo seu homólogo, primeiro-ministro do Canadá, que tinha um fundo de mil milhões de dólares?”.
“Acha normal que, durante meses ou anos, vamos ficar a perguntar-nos sobre cada decisão, sobre cada concurso ganho por uma empresa que tenha sido sua cliente ou cliente da sua empresa familiar, de porquê é que aquela decisão foi tomada”.
"Queremos discutir os problemas dos portugueses, porque o que está neste momento em suspenso, com mais de 25 milhões de euros que vamos gastar neste ato eleitoral"
“Luís Montenegro não foi o único nem a fugir aos debates, nem a esta questão. Deu-me vontade de rir, ao ver o Chega, que não respondeu cabalmente a todas as questões que tinha na sua bancada, ou a Iniciativa Liberal a desvalorizar aquilo que se passou. Quando ainda o anterior líder da iniciativa liberal tentava apropriar-se daquilo que era, por exemplo, a conquista do PAN do Portal da Transparência, mas agora a transparência fica para o segundo plano. Só que eu não quero passar este debate a discutir este tema. Queremos discutir os problemas dos portugueses, porque o que está neste momento em suspenso, com mais de 25 milhões de euros que vamos gastar neste ato eleitoral, são as respostas para a crise climática, são as respostas para a saúde animal”, rematou Inês Sousa Real do PAN.
"Nenhuma destas sete personalidades que estão aqui ao meu lado se vai sentir algum dia esclarecida. Porque o objetivo não é o esclarecimento, o objetivo é a luta política pura e dura"
O tema Spinumviva fechou com uma última declaração de Luís Montenegro: “Nenhuma destas sete personalidades que estão aqui ao meu lado se vai sentir algum dia esclarecida. Porque o objetivo não é o esclarecimento, o objetivo é a luta política pura e dura. Eu quero é dizer às portuguesas e aos portugueses que estão em casa, eu nunca violei o meu dever de exclusividade, eu nunca tomei uma decisão influenciada por nenhum outro interesse que não seja o interesse coletivo ou o interesse público.”
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