O ex-diretor da Polícia Judiciária Militar (PJM) e arguido no processo sobre o furto e recuperação do armamento dos dois paióis nacionais de Tancos começou hoje a ser julgado por violação de segredo de justiça, mas o despacho do Ministério Público que determina esse estatuto não foi incluído no processo.

Depois da audição do arguido, a procuradora de julgamento sentiu necessidade de pedir a apensação ao processo do referido despacho que determina que o inquérito de Tancos, do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), estava em segredo de justiça.

Luis Vieira é acusado de ter partilhado informações da investigação com o antigo ministro da Defesa Azeredo Lopes e com outros militares, tanto em conversas como no envio de documentos.

O ex-diretor da PJM negou que alguma vez tivesse violado o segredo de justiça e disse que soube que o inquérito tinha sido blindado pela nota à comunicação social da então procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, em julho de 2017, quando determinou que a investigação ao furto de Tancos fosse da responsabilidade da PJ e do DCIAP.

“Houve pormenores que a comunicação social deu que eram muito mais graves, porque eram da investigação criminal. Eu apenas manifestei o meu desagrado em que o crime fosse investigado pela PJ e não pela PJM”, afirmou.

Sobre a acusação de ter falado da investigação na visita do Presidente da República aos paióis (04 de julho de 2017), o arguido negou e comentou que até se tinha “sentido constrangido” quando Marcelo Rebelo de Sousa lhe fez perguntas.

“Foi o ministro da Defesa [Azeredo Lopes] que deu conta do meu constrangimento em falar da investigação criminal e disse ao senhor Presidente da República”, contou ao tribunal, adiantando que Marcelo Rebelo de Sousa queria saber “quantos estavam envolvidos” nos crimes.

O ex-responsável da PJM foi perentório em afirmar que está “absolutamente convencido” que o furto de Tancos é um crime militar, logo da responsabilidade da PJ militar, e que todas as diligências que fez foi no sentido de haver a possibilidade de uma reversão da decisão da PGR.

Luis Vieira, antecipando um pouco a sua audição em julgamento no processo de Tancos, que decorre em Santarém, explicou que elaborou um memorando e uma fita do tempo sobre o caso “para memória futura” e para que se soubesse do seu desconforto com a retirada da investigação à PJM e que nenhum desses documentos tinha pormenores da investigação criminal.

O Ministério Público extraiu uma certidão do processo de Tancos por entender que o arguido violou o segredo de justiça quando partilhou por diversas vezes e com vários intervenientes informações do processo criminal sobre o furto do armamento que estava a ser investigado e às quais teve acesso pelas funções que exercia na PJM.

Descreve o MP que, no início de julho de 2017 e depois de ter sido informado pela procuradora-geral da República que a PJM ficaria afastada da titularidade da investigação, manifestou por diversas vezes o seu desagrado com a decisão, lamentando o papel menor que foi atribuído à polícia judiciária militar no inquérito.

Uma das vezes que o arguido abordou o assunto foi quando, perante o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes e o seu chefe de gabinete, major-general António Martins Pereira, “relatou a ambos todos os elementos relativos à investigação desde o seu início”, bem como a decisão da PGR e lhes entregou o denominado de “memorando” e a “fita do tempo”.

Para o MP, o arguido sabia que o memorando e a fita do tempo “faziam referência à investigação tramitada (…) cuja investigação era levada a cabo pelo Unidade Nacional de Combate ao Terrorismo da PJ e que estava a coberto de segredo de justiça”.

O ex-diretor da PJM sabia que “os elementos e informações que transmitiu” diziam respeito ao processo que estava sujeito a segredo de justiça, “pelo que lhe estava vedado, até pelo exercício das suas funções, pois foi nesse âmbito que tomou conhecimento dos mesmos, divulgar e/ou comentar esses elementos/informações”.

Na versão do MP, “o arguido atuou do modo descrito sempre com o intuito de conseguir influência política e/ou hierárquica a favor da sua posição, no sentido de ser cometida à PJM a titularidade da investigação penal, e que, assim, permitisse reverter a decisão da PGR, com a qual não se conformava, o que sabia estar-lhe legalmente vedado”.

Luis Vieira contesta e afirma que apenas pretendeu dar a conhecer à sua tutela administrativa que a atividade investigatória da PJM tinha sido desconsiderada.

A segunda sessão do julgamento, que decorre no juízo local criminal de Lisboa, no Campus de Justiça, está marcada para quinta feira.