A afirmação foi feita por Júlio Pereira, secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) à data do furto de Tancos, em junho de 2017, na comissão parlamentar de inquérito às responsabilidades políticas do furto de Tancos, hoje à tarde.
Questionado pelo CDS, sobre a reação das autoridades militares e o que se seguiu ao furto, Júlio Pereira respondeu o que teria feito se estivesse no lugar dos militares.
“Se estivesse na situação dos militares quando aconteceu isto em Tancos, a primeira coisa que faria era dar conhecimento aos serviços de informações e às polícias. Até porque, quando esse equipamento estava a ser movimentado, talvez houvesse ainda a possibilidade de detetar alguma coisa relacionada com o furto. Não foi isso que aconteceu”, afirmou.
Noutra parte da audição, o antigo secretário-geral do SIRP (Sistema de Informações da República Portuguesa) já havia dito que os responsáveis militares deveriam ter alertado as forças de segurança e serviços de informações, “em vez de inventariar” o material nos paióis.
Após o furto e o alerta que recebeu via Serviço de Informações de Segurança (SIS), que por sua vez soube através da comunicação social, os serviços fizeram o que estava previsto: acionar “as fontes” que têm no país para tentar obter mais alguma informação e alertar os “serviços congéneres”.
De resto, Júlio Pereira, juiz conselheiro do Supremo desde que saiu do SIRP, em novembro de 2017, insistiu na tese de que foi uma boa opção os serviços não terem alterado o estado de alerta do país após o furto, mantendo-se em moderado.
Júlio Pereira temia que material se destinasse a África
Júlio Pereira considerou ainda ter havido “algum amadorismo” no furto de Tancos, pelas dificuldades em fazer sair o material do pais, e admitiu que o material pudesse destinar-se a África.
Na audição de hoje, Júlio Pereira caracterizou o furto feito em junho de 2017, nos paióis de Tancos de “algum amadorismo”, até porque houve “alguma dificuldade em fazer sair esse material” do país por parte que quem roubou.
“Tiveram mais olhos que barriga”, ironizou.
Os serviços de informações fizeram, ao longo dos anos, “muitos relatórios” sobre o tráfico de armas, que caracterizou de um “negócio de oportunidade”, eventualmente com algumas ligações internas nas Forças Armadas, descreveu.
Uma das preocupações dos serviços de informações era que existisse “alguma ligação para exportar material para zonas de conflito, em África”.
Mais tarde, em resposta ao deputado do PCP Jorge Machado, Júlio Pereira explicou que “há uma relativa proximidade” a África, “há uma procura significativa” e, além do mais, houve “pessoas que estiveram nos cenários e que podem ter tido contactos”, numa referência aos contingentes de militares portugueses, por exemplo, na República Centro-Africana.
Furto sem ligação à ETA
O ex-chefe das “secretas” portuguesas recusou qualquer ligação do furto de armas de Tancos aos separatistas bascos da ETA e a uma eventual “encomenda” de material militar”.
Questionado pelo deputado do PS Jorge Gomes na comissão de inquérito ao furto de Tancos, Júlio Pereira argumentou que à data do crime, em junho de 2017, a organização armada “estava praticamente desmantelada”, com o “aparelho militar perdido”.
O ex-secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) disse até que a “última tentativa de se estabelecer” da ETA “foi aqui”, em Portugal.
Mas excluiu, em absoluto, que o furto pudesse ter sido “a pedido” da ETA.
“É uma hipótese completamente descabida”, afirmou ainda.
A suspeita da Polícia Judiciária, de uma ligação do furto em Tancos à organização separatista basca, que desde a década de 1970 reivindicou dezenas de atentados em Espanha que fizeram centenas de mortos, foi noticiada pela revista Sábado em dezembro de 2018.
O furto do material militar, entre granadas, explosivos e munições, dos paióis de Tancos foi noticiado em 29 de junho de 2017 e parte do equipamento foi recuperado quatro meses depois.
O caso ganhou importantes desenvolvimentos em 2018, tendo sido detidos, numa operação do Ministério Público e da Polícia Judiciária, sete militares da Polícia Judiciária Militar e da GNR, suspeitos de terem forjado a recuperação do material em conivência com o presumível autor do crime.
A comissão de inquérito para apurar as responsabilidades políticas no furto de material militar em Tancos, pedida pelo CDS-PP, vai decorrer até junho próximo, depois de o parlamento prolongar os trabalhos por mais 90 dias.
[Notícia atualizada às 22h26]
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