Joana Mendes Varela mora em Achada São Filipe, na cidade da Praia, mas todos os anos leva a família inteira para semear milho e feijões numa parcela de terreno em Órgãos Pequeno, no município de São Lourenço dos Órgãos, no centro da ilha de Santiago.
As primeiras chuvas caídas em meados de julho foram insuficientes para levar esta agricultora a lançar as sementes à terra e só no início de agosto tomou coragem, esperando que chova mais nos próximos dias para a geminação das sementes.
Nos três anos anteriores, não houve milho nem feijões para colheita, apenas palha, que deu para algum consolo, segundo Joana Mendes, que também faz criação de gado e tem outras parcelas de terreno em outros sítios da ilha de Santiago.
“As coisas ainda estão fracas, mas temos esperança, porque esperança é a última a morrer. Esperamos que continue assim e que venha a chuva”, disse à agência Lusa a agricultora, que levou duas filhas e dois netos à horta para semear três litros de milho e um de feijões, em terra ainda ressequida.
“O cabo-verdiano tem coragem e esperança”, prosseguiu Joana Mendes, que espera igualmente que a pandemia do novo coronavírus termine e que todos tenham vida e saúde para trabalhar a terra.
Ainda em São Lourenço dos Órgãos, na zona de Achadinha, o agricultor Narciso Brito Ferreira, 59 anos, começou por recordar à Lusa os últimos três anos de seca severa em Cabo Verde.
“Três anos maus”, desabafou, dizendo que à falta de produtos agrícolas e de água juntou-se a escassez de pasto para os animais e de sementes. “Tudo descontrolado”.
Talvez por isso ainda não tomou coragem para cultivar todas as suas terras, apenas as que estão em zonas mais húmidas, esperando mais chuvas nos próximos dias.
“Estamos nas mãos de Deus. Temos fé que Deus pode mudar o tempo e as coisas podem melhorar”, afirmou o agricultor.
Caso tarde em chover, este lavrador de 59 anos não tem dúvidas que as coisas podem complicar-se ainda mais em Santiago, a maior ilha do país e cujos concelhos do interior têm uma grande predominância agrícola.
“Acordo e olho para o céu para ver como vai ser. Se o tempo melhorar, ficamos esperançosos, mas se piorar ficamos desanimados. Mas temos fé que a qualquer momento possa chover”, previu Narciso Ferreira.
Mais animado está Cecílio Pereira Fernandes, 38 anos, agricultor na zona de Purgueira, no concelho vizinho de São Salvador do Mundo, cujas terras ainda estão molhadas e numa fase mais avançada das sementeiras, na chamada monda ou coroa do milho mais crescido.
“E em setembro já estaremos a tirar as flores do milho, tal como antigamente. Por isso este ano estou com moral para trabalhar todos os dias”, previu, esperando que as suas culturas não sejam afetadas este ano pela praga de gafanhotos, tal como aconteceu no ano passado.
Cecílio também trabalha como carpinteiro, mas por estes dias o tempo é praticamente todo dedicado à agricultura, tendo semeado 10 litros de milho e cinco litros de feijões nas terras ao redor da sua casa em Purgueira, à beira da estrada de acesso aos concelhos do interior de Santiago.
E um desses concelhos é Santa Catarina, que também vive essencialmente da agricultura, mas onde ainda não choveu o suficiente este ano, pelo que os agricultores lançam as sementes em terra seca, à espera de chuva.
É o caso de Lindinho da Veiga, 43 anos, que também levou a família inteira para cultivar pela segunda vez uma parcela de terreno em Achada Falcão, com 10 litros de milho e feijões.
Se na primeira vez o milho acabou por se danificar no chão porque a chuva era pouca, desde vez este agricultor não tira os olhos do céu à espera que caia em abundância este mês.
“É essa a nossa esperança (as chuvas) porque não há outro tipo de trabalho”, disse à Lusa o agricultor cabo-verdiano, que espera que a chuva possa vir ainda a atenuar as dificuldades criadas pela pandemia do novo coronavírus.
Em meados de julho a chuva voltou a cair com alguma intensidade em algumas ilhas de Cabo Verde, após três anos irregulares e em quantidade insuficiente, o que provocou seca extrema no arquipélago.
No ano passado, choveu apenas alguns dias no mês de setembro, provocando uma praga de gafanhotos em Santiago, Brava, São Nicolau e São Vicente, que o Governo começou a combater este ano ainda em estado larval.
Dados do V Recenseamento Geral da Agricultura (RGA) concluíram que o número de agricultores diminuiu quase 18% em
em 11 anos, de 2004 a 2015 e publicados em 2017, e que uma em cada três pessoas (182.396) dedicava-se à prática da agricultura.
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