Apenas 6% dos obesos que atingem o peso alvo com dieta e exercício o conseguem manter ao fim de cinco anos. Dados descortinados por Joana Martins, médica e doente bariátrica. “Não é falta de vontade, é viver numa prisão calórica, de monitorização e de culpa. O corpo luta contra nós”. Depois de três dietas bem-sucedidas, fez sempre parte dos 94% que recuperam o peso anterior. Quando chegou aos 117kg optou por uma cirurgia bariátrica.

Ouça aqui a conversa com Joana Martins

Não se mexia com facilidade, os joelhos doíam, suava muito, tinha “uma vida sexual de bosta”, manter a produtividade era um exercício de tenacidade e resiliência. Um ano após ter optado pela via da cirurgia, Joana Martins, pediatra, perdeu 50kg e sabe que ganhou mais uma década de vida. “Mais dez anos para ver os meus filhos brincar”, diz. Contudo, não pensa em si como uma pessoa magra, vê-se sempre como obesa. “É um fantasma que carrego”.

Nestes 50 minutos de conversa, explica o processo de tomada de consciência, a procura de uma estratégia de combate à obesidade com resultados duradouros. “Faço terapia porque ninguém sobrevive com 120 quilos tantos anos e a querer ver uma luz ao fundo do túnel. Fiz dietas, queria encontrar solução para o problema da obesidade: porque é que eu me refugio na porcaria dos hidratos? Porque é que como massa com pesto às 11 da noite porque o dia correu tão mal?”.

Numa sociedade gordofóbica, na qual os obesos lutam por se integrar, pressionados por padrões de beleza estética que não conseguem cumprir e por estereótipos nefastos sobre os seus comportamentos, a saúde mental é afetada e o silêncio sobre as várias formas de discriminação é persistente. Os estudos indicam que uma pessoa com excesso de peso tem mais dificuldades de socialização, de adaptação no mercado de trabalho. “A ideia do gordinho feliz” não se aplica, diz Joana Martins, que fala da sua experiência sem qualquer entrave, porque como médica e como mulher obesa, sabe que o silêncio não ajuda ninguém. “Psicologicamente mental é estar mergulhada na culpa, cada quilo a mais era culpa minha. Como é que atingi os 117kg? Comi-os todos!”.