No relatório "Trabalho Infantil: estimativas globais de 2020, tendências e o caminho a seguir", da OIT e do Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a propósito do Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, que se assinala em 12 de junho, destaca-se a necessidade de se porem em prática medidas para combater o fenómeno, que poderá ser agravado pela pandemia.
O documento acentua que pela primeira vez em 20 anos a evolução da erradicação do trabalho infantil "inverteu o seu sentido", contrariando a tendência de queda registada entre 2000 e 2016, período durante o qual se assistiu a uma redução de menos 94 milhões de crianças no mundo do trabalho.
Nos últimos quatro anos, esse aumento foi de 8,4 milhões de pessoas, refere.
De acordo com o relatório, hoje tornado público, "cerca de nove milhões a mais de crianças estão em risco devido aos efeitos da covid-19" até ao final de 2022 e "esse número poderá aumentar para 46 milhões de crianças, caso não venham a ter acesso a medidas de proteção social essenciais".
"Novas crises económicas e o encerramento de escolas, devido à covid-19, podem significar que as crianças trabalham mais horas, ou em condições agravadas, enquanto muitas outras podem ser forçadas às piores formas de trabalho infantil, devido à perda de emprego e rendimento em famílias vulneráveis", alerta-se no documento.
A diretora-executiva da Unicef, Henrietta Fore, avisou, citada num comunicado, que se está "a perder terreno na luta contra o trabalho infantil", referindo que "o ano passado não facilitou" esse trabalho.
Henrietta Fore defendeu a importância de se investir em programas que desincentivem o trabalho infantil, numa altura em que o encerramento de escolas, crises económicas e ajustes nos orçamentos nacionais podem forçar as famílias "a tomar decisões muito drásticas".
"Instamos os governos e os bancos internacionais de desenvolvimento a priorizar os investimentos em programas que permitam que as crianças saiam do mercado de trabalho e regressem à escola, assim como a apostar em programas de proteção social que evitem que as famílias tenham de recorrer ao trabalho infantil", pediu.
O relatório revela ainda um aumento substancial no número de crianças entre os 5 e os 11 anos que trabalham e que representam mais de metade de todos os casos de trabalho infantil no mundo.
O número de crianças com idades entre 5 e 17 anos, envolvidas em trabalhos perigoso, atividades laborais que podem prejudicar a sua saúde, segurança física ou desenvolvimento cognitivo, aumentou 6,5 milhões desde 2016, situando-se atualmente em 79 milhões de crianças, acrescenta.
A publicação indica que 70% dos casos de trabalho infantil, o equivalente a 112 milhões de crianças, acontecem no setor agrícola, 20%, o correspondente a 31,4 milhões de menores, nos serviços, e 10%, 16,5 milhões de crianças, trabalham na indústria.
O trabalho infantil nas áreas rurais (14%) é quase três vezes superior quando comprado com as áreas urbanas (5%).
"Quase 28% das crianças com idades entre os 5 e os 11 anos e 35% das crianças entre os 12 e os 14 anos que trabalham não frequentam a escola", enfatizou o relatório, que informa existir uma maior incidência nos rapazes no trabalho infantil, esbatendo-se essa disparidade quando se considera o trabalho doméstico.
Por seu lado, o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, declarou também citado no mesmo comunicado que estas novas estimativas "são um alerta" e apelou para que se intervenha, para não ser posta em risco "toda uma nova geração de crianças".
"A proteção social inclusiva permite que as famílias mantenham os seus filhos na escola, mesmo em situação económica adversa. O aumento do investimento é essencial para promover o desenvolvimento rural e o trabalho decente no setor agrícola", preconizou Guy Ryder.
"Estamos num momento crucial e os resultados alcançados vão depender, em grande parte, das medidas que tomarmos" e é necessário reiterar o compromisso e a vontade "para reverter esta situação e para interromper o ciclo da pobreza e do trabalho infantil", pediu Guy Ryder.
O relatório adverte que "o trabalho infantil compromete a educação das crianças, restringe os seus direitos, limita as suas oportunidades futuras e contribui para a manutenção de ciclos intergeracionais de pobreza viciosos e de trabalho infantil".
Além do aumento dos gastos com educação e a facilitação do regresso das crianças à escola, a OIT e a Unicef defendem a promoção do trabalho digno para adultos, "para que as famílias não tenham que recorrer à ajuda dos filhos para gerar rendimento familiar".
As previsões anunciadas pelas duas entidades baseiam-se na extrapolação de dados de 106 pesquisas que cobrem mais de 70% da população mundial de crianças entre os 5 e os 17 anos.
Comentários