A serra da Estrela é motivo de notícias quando se cobre de neve. São imagens bonitas, um fenómeno aguardado por miúdos e graúdos. Depois lá vêm as estradas cortadas e um ou outro inconveniente associado.

Agora, em pleno mês de agosto, as imagens que passam nas televisões mostram o terreno montanhoso de uma outra cor. O verde das árvores dá lugar ao queimado, ao alaranjado das chamas. A serra da Estrela está a arder. E isso não é um assunto fácil — afinal, já arderam cerca de 10.000 hectares.

O investigador Miguel Almeida, da Universidade de Coimbra, destaca a complexidade do incêndio que deflagrou no concelho da Covilhã na madrugada de sábado e que já se estendeu a municípios do distrito da Guarda.

“Os incêndios explicam-se muitas vezes com base num triângulo, constituído pela topografia, os combustíveis [como vegetação] e as condições meteorológicas, e a verdade é que os três vértices do triângulo estão perfeitamente coadunados” neste caso, disse.

Em declarações à agência Lusa, considerou que este fogo “é muito complexo e dominado pela topografia, visto que é uma zona de montanha, e pelo vento que se tem levantado durante as tardes”.

“Por outro lado, temos uma sobrecarga de combustíveis e sobretudo combustíveis que estão muito secos. Todos sabemos a seca que o país atravessa e essa seca reflete-se aqui, na perda de humidade dos combustíveis, tornando-os muito disponíveis para arderem”, disse.

Questionado sobre críticas que têm sido feitas ao combate a este incêndio, Miguel Almeida escusou-se a comentar algumas e considerou que outras “não são justas”, nomeadamente as que se dirigem à estratégia definida para a operação.

“Quando se critica a estratégia de combate, aí, não me parece que estejam a ser justos, porque me parece que o combate está a ser feito como pode ser feito, [perante] condições extremamente nocivas e difíceis”, argumentou.

Para o investigador, “há algumas coisas que poderiam ter sido feitas”, mas não “do lado do combate - sobretudo do lado da preparação para este tipo de cenários ou da prevenção”.

“De facto, é muito difícil chegar a determinadas encostas, porque não há acessos”, disse, reconhecendo tratar-se de uma zona de parque natural em que “as intervenções nem sempre são possíveis”. Ainda assim, acrescentou, “a verdade é que isso faz com que se criem muito menos acessos”.

Em “alturas de aflição” a tendência é olhar “para o combate e apontar sempre o dedo ao combate”, mas Portugal tem “um dos sistemas de combate mais robustos e mais desenvolvidos da Europa”, defendeu Miguel Almeida.

“Com certeza, há coisas a melhorar, com certeza que a estratégia seguida não terá sido perfeita, mas o que eu tenho observado no terreno é que os meios estão bem posicionados, que há uma estratégia definida. Claro que não é fácil combater um incêndio com toda esta complexidade”, rematou.