A presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista disse hoje ao SAPO24 que está a analisar o caso e poderá proceder a uma queixa que pode fundamentar-se na usurpação de funções, uma vez que a entrevistadora foi identificada como jornalista e, cumulativamente, não se opôs à identificação.

"Alguém que é identificado como jornalista e/ou não se opõe está a violar a lei, mais especificamente o número quarto do Estatuto do Jornalista", que prevê que a profissão só pode ser realizada por pessoas habilitadas com Carteira Profissional válida.

Licínia Girão acrescenta que "ninguém pode exercer jornalismo sem o título", conferido a quem faz da profissão a sua "ocupação principal, permanente e remunerada". A responsável acrescenta que a CCPJ poderá entregar uma queixa perante as autoridades judiciais, com fundamento no crime de "usurpação de funções", previsto no Código Penal.

O crime de usurpação de funções está previsto no Código Penal e aplica-se, entre outras circunstâncias, a quem "exercer profissão ou praticar ato próprio de uma profissão para a qual a lei exige título ou preenchimento de certas condições, arrogando-se, expressa ou tacitamente, possuí-lo ou preenchê-las, quando o não possui ou não as preenche".

Relativamente ao caso em específico, a Comissão revela que a pessoa em questão já teve a habilitação de jornalista até 2008. Desde então não renovou o título o que a "impede de exercer funções de jornalista", ao abrigo da lei. Em caso de aplicação da contraordenação, a multa poderá até aos 5.000 euros.

Também o Órgão e Comunicação Social que veiculou a entrevista, neste caso a SIC, poderá ser multado, caso se comprove que identificou como jornalista ou tem ao serviço uma pessoa sem título que se identifique como tal, num espaço que o público identifica como de informação. No caso das empresas de Comunicação Social a lei é específica: "Nenhuma empresa com atividade no domínio da comunicação social pode admitir ou manter ao seu serviço, como jornalista profissional, indivíduo que não se mostre habilitado, (...)  salvo se tiver requerido o título de habilitação e se encontrar a aguardar decisão."

A presidente da Comissão da Carteira Profissional dos Jornalistas salvaguarda que, perante suspeitas de crime, "qualquer cidadão pode apresentar queixa nas autoridades".

Lícinia Girão salienta que todas as pessoas podem fazer entrevistas e escrever textos ou artigos, mas ninguém se pode substituir aos jornalistas. A responsável adianta que há cerca de quatro dezenas de casos que podem estar a violar a lei por falta de título profissional, mas que na sua maioria se prendem com atrasos de renovação e incompatibilidades profissionais, como é o caso de funções em publicidade, marketing ou assessoria de imprensa.

A entrevista foi emitida no dia em que o primeiro-ministro afirmou que pretende em Portugal um jornalismo livre, sem intromissão de poderes, sustentável do ponto de vista financeiro, mas mais tranquilo, menos ofegante, com garantias de qualidade e sem perguntas sopradas.

O líder do executivo considerou que seria melhor se a comunicação social fosse “mais tranquila na forma como informa, na forma como transmite os acontecimentos e não tão ofegante”.

Ofegante, “às vezes, de uma notícia que parece que é de vida ou de morte, quando afinal as coisas estão a funcionar, quando afinal é preciso saber que em cada momento nós estamos a discutir um determinado assunto”, completou.

Apontou, como exemplo, as vezes em que os jornalistas o tentam “apanhar à porta de um evento, ou à saída de um evento”, para lhe perguntarem “se o PS já respondeu ou não sei o quê, ou se eu já respondi ao PS”.