O reitor da Universidade de Lisboa (ULisboa), António Cruz Serra, foi hoje ouvido pela comissão parlamentar de educação e ciência, a pedido do PSD, que requereu a audição depois de o reitor ter feito fortes críticas à política para o ensino superior do ministério tutelado por Manuel Heitor num discurso na cerimónia de despedida do Presidente da República da instituição onde foi durante décadas professor de Direito.
Para Cruz Serra, o problema afasta muitos potenciais estudantes do ensino superior, uma vez que as famílias não têm capacidade de suportar os custos inerentes, nomeadamente o arrendamento de quartos, face à escassez de oferta em residências públicas.
E defendeu que a questão não se resolve com “concessões a privados, que manterão os preços altos”, sendo antes necessário “inundar o mercado” com residências públicas, uma posição elogiada pelo deputado do Bloco de Esquerda Luís Monteiro, que entende que a solução para o problema não passa por parcerias público-privadas e que “é importante que sejam também reitores a insurgir-se contra algumas dessas ideias peregrinas”.
Cruz Serra apelou ainda para que seja possível às universidades fazerem ajustes diretos na contratação de projetos de arquitetura para residências universitárias, dando como exemplo o prazo decorrido nos procedimentos concursais já abertos pela ULisboa para a construção de três novas residências afetas à instituição, e cujos prazos decorridos variam, até agora, entre 262 dias e os mais de 500.
“É preciso agilizar o processo, com o controlo que quiserem”, disse o reitor aos deputados, acrescentando: “Não nos podemos dar ao luxo de atrasar a construção de residências”.
O reitor pronunciou-se ainda sobre o corte de vagas em Lisboa e Porto, um dos alvos do discurso crítico ao Governo, insistindo na condenação da medida, que diz não ter produzido qualquer resultado, referindo que, pelo contrário, nas duas primeiras fases de acesso ao ensino superior pelo concurso nacional, as instituições do interior perderam alunos este ano.
“Não acompanho uma política de redução de vagas à força”, disse o reitor, que entende que a medida desperdiça a capacidade instalada nas universidades para acolher mais alunos e que não dá liberdade aos estudantes e famílias para escolher onde estudar.
Questionado pelo deputado socialista Porfírio Silva sobre o assunto, Cruz Serra disse que o “título assassino” que foi feito numa entrevista recente, no qual afirmava que não veria nenhum filho de um presidente executivo de grandes empresas a ir estudar para o interior, passou a ideia contrária ao que queria dizer, explicando que a ideia que queria passar é que quem tem dinheiro pagará universidades privadas em Lisboa e Porto e não vai estudar para instituições do interior.
Porfírio Silva questionou ainda o reitor sobre a forma como foi decidida a redução de vagas na ULisboa, perguntando se não terá sido meramente administrativa e não poderia ter sido mais política, em concertação com o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), à semelhança do que foi feito pelo conselho coordenador dos politécnicos, que decidiu em conjunto à reafetação de vagas.
“O CRUP não tem política nenhuma, nem consegue ter”, respondeu Cruz Serra, que acrescentou que se as universidades de Aveiro e Minho não tivessem sido abrangidas pelo reforço de vagas resultante do corte em Lisboa e Porto “a posição do CRUP teria sido bem diferente”.
O reitor de Lisboa pediu ainda ao parlamento “um acordo de regime” para o futuro do ensino superior, que enfrentará a breve prazo o problema da redução da natalidade, com a consequente redução do número de alunos, defendendo que o assunto “merece a atenção de todos” e que é preciso “uma estratégia” que não passe por medidas avulsas.
Um dos aspetos referidos por Cruz Serra foi a “rede caótica com oferta caótica” nas instituições, com cursos iguais em instituições diferentes em raios não superiores a 50 km.
Sobre precariedade na ciência e ensino superior, Cruz Serra disse que os bolseiros abrangidos pela lei do financiamento científico não financiados pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e os precários abrangidos pelo programa de regularização de vínculos no Estado (PREVPAP) representam um custo de cinco milhões de euros para a ULisboa, referindo não saber se o Orçamento do Estado prevê um reforço de verbas para fazer face a estes casos.
“Peço ao parlamento que possa haver da dotação das universidades para a aplicação da lei”, disse o reitor, que insistiu que as instituições não estão a ser devidamente compensadas em relação às propinas, que a partir do próximo ano letivo vão baixar.
“Apoio totalmente a redução as propinas e congelamento, até podem pô-las a zero. Agora não é possível tomar essas medidas sem reforçar os meios à disposição da universidade”, disse, voltando a referir que o congelamento do valor das propinas em vigor custa à ULisboa um milhão de euros por ano, o equivalente a 50 camas numa residência universitária, exemplificou.
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