“Além de latente, é um assunto cada vez mais preocupante e transversal. Tivemos duas premissas. Em primeiro lugar, que este livro não tivesse apenas os resultados do estudo, mas também as expressões utilizadas por atletas e pais. Depois, que nos apresentasse soluções. A FPF viu que era interessante e achou por bem publicar o que se fez”, disse à agência Lusa Jorge Heleno, vice-presidente da AF Santarém e coordenador do projeto.

A obra “Pais e atletas no futebol - um estudo sobre comportamentos” foi apresentada na segunda-feira, em Santarém, numa iniciativa inserida nas comemorações do centenário daquela associação distrital, tendo partido dos resultados obtidos na investigação “Joga limpo: desporto e direitos humanos - os atletas, os seus públicos e o seu suporte social”.

Focado na conduta turbulenta dos encarregados de educação e do público em geral nas bancadas dos recintos durante jogos de escalões de formação de futebol ou de futsal, o inquérito juntou respostas de “cerca de 300 pais” às de “quase 480 atletas”, com idades compreendidas entre 12 e 15 anos, envolvendo mais de duas dezenas de clubes locais.

“Os miúdos expressaram o que lhes ia na alma, sem estarem condicionados por nenhum adulto. Por outro lado, os pais tiveram uma resposta social, de compromisso e séria, mas acabaram por ir ao encontro de uma grande conclusão: temos de fazer alguma coisa. Os atletas não se sentem bem quando reconhecem as vozes dos seus pais e do público. Os progenitores também não se reveem neste ambiente e já acham contra eles próprios que se deve fazer algo para parar com esta agressividade verbal”, reconheceu Jorge Heleno.

Esses depoimentos remontam à temporada 2021/22 e permitiram verificar que os jovens atletas “encaram o jogo de um modo formativo” dentro das quatro linhas, em oposição ao “modo competitivo” exteriorizado pelos pais e encarregados de educação fora de campo.

“Um miúdo disse que o seu pai errou e que só espera que o possamos desculpar. Outro partilhou que gostava mesmo de dizer ao dele para que se calasse e lhe deixasse jogar futebol e fazer aquilo que mais gosta. São estas respostas que nos comovem”, assumiu.

Na sequência da análise e do cruzamento de dados, que tiveram a cooperação de duas psicólogas, o estudo captou uma “amplitude de opiniões” de especialistas académicos e desportivos e redundou num livro editado pela Cultura Editora e integrado na coleção da FPF, ajudando a melhorar o ambiente nas competições organizadas pela AF Santarém.

“Só pelo facto de termos feito o inquérito, já houve alguma diminuição das participações relativamente àquilo que se passava nos campos. Bastou suscitar a questão e discutir o que se está a passar. Houve um efeito muito agradável e espero que a leitura deste livro nos possa ajudar ainda mais a tentar baixar esta agressividade. Não se pode extingui-la, infelizmente. Isto é uma questão geracional. Agora, estou convicto de que se conseguirá diminuir aquilo que se passa nos clubes e nos campos, sobretudo na fase formativa dos atletas”, afiançou Jorge Heleno, esperando alargar o debate do tema à escala nacional.

Em 2019, a FPF lançou a campanha “Deixa Jogar” para combater os episódios de mau comportamento nos recintos desportivos, consciencializar os encarregados de educação dos atletas e o público em geral e fomentar as boas práticas e os exemplos de fair-play.