#DiárioDaRússia: Saransk, nem contado vocês acreditavam

Este artigo tem mais de 6 anos
Saransk era uma localidade improvável para receber jogos do Campeonato do Mundo. Foram gastos mais de 500 milhões de euros num estádio novo, numa cidade onde joga uma equipa da terceira divisão, e para a construção de complexos habitacionais. Num deserto de betão que contrasta com a azáfama de Moscovo e com o quotidiano preenchido de Sóchi, Saransk é quase... surreal.
#DiárioDaRússia: Saransk, nem contado vocês acreditavam
FILIPPO MONTEFORTE / AFP

De cima avista-se uma muralha de betão, descobre-se a Catedral de São Teodoro Ushakov (a Catedral da Igreja Ortodoxa Russa na Mordóvia) e a Mordovia Arena, imponentes num deserto verde de campos agrícolas.

Aterrámos em Saransk por volta das 9h30 da manhã. Foi a primeira vez que estive num aeroporto em que único avião ali parado era aquele onde ainda estava, à espera que o carro com as escadas chegasse para podermos descer.

O aeroporto é recente, construído propositadamente para servir a cidade durante o Campeonato do Mundo. Ainda não está totalmente terminado e é bastante pequeno. Quando o atravessámos, longe da confusão de qualquer outro aeroporto, ainda se sentia o cheiro a novo.

Lá fora um autocarro levou-nos até perto da zona envolvente do estádio, do novo estádio do Mordovia Saransk, um clube que recentemente se sagrou campeão da terceira divisão russa, numa época em que somou uma assistência média de 1,5 mil espetadores. Ora, o Mordovia Arena tem 48 mil lugares (e ficará reduzido a 28 mil quando o Mundial deixar a Rússia).

A viagem de autocarro permitiu-nos uma pequena ‘tour’ por uma Saransk completamente renovada, com estradas novas e onde os empreendimentos habitacionais construídos para este Mundial - que estão neste momento às moscas, devido à inflação de preços antes da competição e que acabam, agora, com pessoas a tentar vender noites em apartamentos a preços irrisórios à porta do aeroporto - ‘engoliam’ as casas e as pequenas hortas de quem insistiu ficar.

Saransk parece também ser sinónimo de... silêncio total. Quase como se fosse uma cidade construída de propósito para este mês 'mundialista'. Muito li sobre este local antes de embarcar. Dizia-se que era algo surreal. E a verdade é que esta é, das 12 cidades escolhidas para acolher este Campeonato do Mundo, a mais polémica. De longe.

Primeiro, porque não tem um clube a disputar os principais escalões do futebol russo (e deixou de fora, por exemplo, Krasnodar, uma cidade com um clube da primeira divisão). Depois, diz-se, pela amizade entre Vladimir Putin e Nikolai Merkushin, antigo governador da Mordóvia e pai de Alexei Merkushin, o atual governador da região.

Sobre esta última razão, basta dizer que nas últimas eleições russas, a Mordóvia foi a segunda região de todo o país a dar o maior apoio ao atual presidente da Rússia: 87% da população votou em Putin.

A metamorfose de uma antiga cidade militar

A cerca de 500 quilómetros de Moscovo, Saransk tem cerca de 300 mil habitantes, números bastantes tímidos para aquela que é a realidade russa.

Na génese da cidade está uma natureza militar, bem vincada na altura da antiga URSS - época em que albergava várias unidades de indústria bélica -, em que só se entrava possuindo um visto especial.

Durante o período da Perestroika, muitas dessas fábricas fecharam, foram desmanteladas ou reconvertidas, o que levou a uma grande quebra da população.

Hoje, é uma cidade nova, onde foram gastos mais de 500 milhões de euros para fazer de Saransk a mais improvável localidade a receber jogos do Mundial. Mas vai recebê-los. Quatro, no total, e todos da fase de grupos. O Portugal-Irão desta segunda-feira é um deles.

A cidade que quer juntar Ronaldo a Derpardieu

Em 2013, desiludido com a sua situação fiscal em França - devido à polémica lei da tributação das grandes fortunas -, o ator francês Gerard Depardieu, conhecido pelo seu papel no filme “Cyrano de Bergerac” (que lhe valeu, inclusive, a nomeação para o Óscar de melhor ator principal em 1990), pediu a nacionalidade russa. O pedido foi prontamente atendido por Putin, que não só lhe concedeu passaporte russo, como lhe ofereceu uma casa em Saransk.

Mas as gentes da Mordávia querem que o ator francês tenha companhia e portanto, em vésperas do Portugal-Irão, fizeram um vídeo para tentar convencer o craque português a mudar-se para cá e ainda lhe pintaram um mural.

Assim é Saransk, a mais improvável das cidades russas a receber jogos do Campeonato do Mundo.


Diário da Rússia é uma rubrica pela voz (e teclas) de Abílio Reis e Tomás Albino Gomes, equipa do SAPO24 enviada à Rússia para fazer cobertura do Mundial. Um diário que é mais do que futebol, porque a bola não se faz só de bola, mas também das pessoas que fazem a festa. Acompanhe a competição a par e passo no Especial "Histórias de futebol em viagem pela Rússia".

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