Ainda há pouco mais de um mês se falava na possível venda do Manchester United. Aqui reside o fundamental problema nesta equação que não parece ter solução à vista. Neste momento não se sabe ao certo se a família Glazer, proprietária do Manchester United desde 2005, tem, ou não, um plano e um projeto de futuro para os Red Devils. Não podendo afirmar com certeza se esse é o caso, resta olhar à estratégia que parece estar a colocar em causa a grandeza, no imediato, do United e olhar também àquela que me parece ser a estratégia a seguir, sendo que há um exemplo perfeito de gestão dentro da própria Premier League.

De Sir. Alex Ferguson a José Mourinho

Desde a saída do escocês septuagenário que o clube perdeu o rumo, ou que pelo menos não tem tido a capacidade para assumir que não poderá, no imediato, ter o impacto que sempre teve na Premier League.

Um dos erros mais comuns na análise do United é o facto de se pensar que Sir. Alex Ferguson era, milagreiro. Não estará em causa a genialidade e capacidade de fazer a equipa jogar, mas também não se pode esquecer o tempo em que o fez. Os últimos seis anos na Premier League viram mudanças radicais. O United passou de pagar 27 milhões de libras por Robin van Persie para pagar 75 milhões por Romelu Lukaku, o que demonstra o quanto o futebol mudou em tão poucos anos.

O mercado inflacionou de tal forma que seria impossível ao próprio Sir. Alex Ferguson lutar pelo título hoje em dia, não tendo as condições financeiras necessárias, o que nunca foi o caso. Até podia lutar, mas teria sido, após 2012, com um hiato de títulos e com uma reconstrução da equipa de forma muito sustentada. O que nunca aconteceu até ao momento e parece continuar a não ser opção.

créditos: Oli SCARFF / AFP

José Mourinho é um treinador que produz no imediato, não é historicamente um treinador que permaneça nas equipas muito tempo e parece-me ter sido aí que ambos, o clube e o treinador, se equivocaram. Se o projecto era suposto ser a longo prazo, o treinador em português não foi a opção ideal, mesmo que este o desejasse fazer. Porquê? Porque os adeptos são habitualmente exigentes e quando se trata de um treinador com o passado de conquistas de José Mourinho, ainda mais.

Spurs, o exemplo a seguir pelos Glazer

O que o Tottenham Hotspur F.C começou a construir em 2012, última época de Sir. Alex Ferguson como treinador e de alguma forma de mudança no paradigma, foi o que o United deveria ter feito, caso tivesse conseguido identificar as suas necessidades. Com a contratação de André Villas-Boas, o Tottenham quebrava um padrão de uma velha escola de jogar para o imediato, criava assim um projeto de futuro. Levou dois anos a acertar no treinador para o projecto, mas levou ainda mais tempo até começar a ver frutos dessa visão. Como construiu o Tottenham uma equipa que é, nos últimos três anos, top 3 da Premier League?

Primeiro foi preciso um projeto. Depois foi preciso assumi-lo perante os adeptos e perante o clube e funcionários. Por fim, foi preciso consistência e paciência, o acreditar no processo é fundamental. Será que os três pontos serão facilmente aplicáveis num clube de maiores dimensões? Porque é fácil dizer que o Tottenham o fez, mas os Spurs e os adeptos não tinham expectativas adquiridas pela sua história, como tem o Manchester United. Daí ser ainda mais importante para o United ter um projeto e assumi-lo. Deixar os adeptos em águas turvas só poderia levar a um resultado: insatisfação.

Vamos por partes então. O projeto no United parece não existir. Da mesma forma que se apostam em jogadores da formação, compram-se jogadores sobrevalorizados ou na curva descendente da carreira e todos eles com características que não parecem assentar num estilo de jogo em particular.

De seguida, o assumir desse projeto. Caso o houvesse, assumir perante os adeptos e clube que durante alguns anos terão que ter paciência, uma vez que a ideia na qual o clube acredita levará alguns anos a colher resultados. Recordar que já passaram sete anos desde a saída de Alex Ferguson e o clube parece ainda não ter sequer traçado um rumo.

Por fim, e no seguimento da premissa anterior, é preciso consistência e paciência. Contratar um treinador cujo percurso mostra que requer sucesso e esse sucesso normalmente é atingido nos dois primeiros anos de contrato, não parece uma forma de demonstrar consistência ou pedir paciência aos adeptos.

Uma vez que o United não demonstra nenhuma das premissas do projeto do Tottenham, olhemos para como conseguiu Daniel Levy, Diretor Executivo dos Spurs, pôr em prática as suas ideias.

O Tottenham era, entre 2009 e 2012 uma equipa consistente que atingira o quarto e quinto lugares com regularidade, mas que se percebia estar nos seus limites. Não era uma equipa que pudesse lutar pelo título. Levy percebeu a conjuntura do futebol inglês e centrou-se na solução. Como aumentar o rendimento da equipa sem destruir as contas do clube, podendo dessa forma, em 2019, altura da finalização de construção do novo estádio do clube, poder lutar taco-a-taco pela liderança da liga e poder também começar a ultrapassar o rival Arsenal como clube mais dominante do norte de Londres?

A ideia foi simples, apostar na formação de jogadores, na criação de condições que permitissem aos jogadores jovens jogar, ganhar experiência, podendo mais tarde dar frutos ao clube e à equipa. A contratação de jogadores com potencial, mas que estavam ainda longe do seu pico de carreira tornou-se num hábito para os Spurs.

Formação - Harry Kane; Harry Winks.

Contratações:

2012 - Hugo Lloris; Jan Vertonghen; Moussa Dembélé.

2013 - Danny Rose; Érik Lamela; Christian Eriksen.

2014 - Eric Dier; Ben Davies.

2015 - Kieran Trippier; Toby Alderweireld; Dele Alli; Son Heung-Min.

2016 - Victor Wanyama; Moussa Sissoko.

2017 - Lucas Moura.

Como se pode observar pelas datas de contratações dos Spurs, o projeto há muito que está a ser pensado. Olhando à equipa mais utilizada por Mauricio Pochettino, a consistência, evolução e consolidação está presente em cada nome. Todos eles perto do pico de forma nos dias de hoje, a maior parte ainda com vários anos de margem de progressão. A uma equipa à qual foi dada tempo e espaço, juntou-se um treinador que não foi contratado para ganhar no imediato, que não tinha pressão associada e que pode assim, agora, colher os frutos de uma árvore plantada há já muito tempo.

Poderá ainda não ter capacidade de lutar pelo título, mas será realista dizer que está numa fase e com qualidade suficiente, em que decidir investir e apostar em três ou quatro peças de valor, poderá então subir as expectativas de forma considerável. 

O caminho errado

A contratação do norueguês Ole Gunnar Solskjær parece ser acertada, mas também errada caso seja apenas temporária.

Solskjær é conhecedor do clube, não tem pressão associada e poderia ser a cara de um projecto de média/longa duração que abrisse, mais tarde, as portas a um treinador de renome caso o norueguês não conseguisse dar seguimento ao projeto com uma sólida candidatura ao título dentro de alguns anos. Assim, e caso se confirme a contratação de um novo treinador no início de época, a pressão voltará. Não sendo acompanhada de um investimento ao nível do rival Manchester City, será muito provavelmente o início de mais um período de insucesso no Manchester United.

Adepto do Manchester United “O United tornou-se em tudo aquilo que nos riamos nos nossos rivais: Gastamos como o City, vivemos de glórias passadas como o Liverpool, lutamos pelo quarto lugar como o Arsenal e mudamos de treinador como o Chelsea.”

Segundo a imprensa inglesa, independentemente do treinador que assumir o comando técnico do Manchester United na próxima temporada, o clube tem preparada uma proposta de 162 milhões de libras por Gareth Bale. Se mais exemplos eram necessários para provar que a estratégia dos Glazer não tem um fio condutor e uma ideia sólida, aqui fica mais um. Contratar um jogador no pico da sua carreira, e rodeá-lo de jogadores cuja consolidação ainda se está a fazer, parece mais uma vez uma tática desesperada de alcançar resultados imediatos. O Manchester City fê-lo, já depois de construir durante alguns anos, mas fê-lo contratando mais de catorze jogadores, por mais de quinhentos milhões de libras. Além disso, a manutenção de uma equipa que dê, à partida, mais garantias precisa de constante manutenção. Assim sendo está projetado o gasto de mais trezentos milhões de libras no verão que se aproxima, já que Pep Guardiola diz-se, já ter identificado mais três alvos a contratar de forma a preparar a substituição de Otamendi, Fernandinho, entre outros.

Outro exemplo de investimento é o Liverpool. Que só gastando uma fortuna em três jogadores no mercado de verão passado, consegue hoje em dia lutar de igual para igual com os azuis de Manchester. No caso do Liverpool a chegada ao topo foi feita de forma ligeiramente diferente, tendo a identificação de talento em conjunto com um treinador e uma filosofia produzido a química ideal entre fatores. Não deixa ainda assim de ter que investir de forma extraordinária.

Como se vê o jogo do dinheiro e do sucesso imediato pode ser jogado, mas para isso é preciso assumir-se que se joga. Fingir-se que se joga esse jogo, contratando uma super estrela por uma valor estratosférico não aumenta em nada as chances da equipa ter sucesso, apenas cria uma ilusão nos adeptos que acompanham a equipa.

Esta semana na Premier League

Esta semana apresenta-nos uma tradição inglesa em que todo o país pára em frente à televisão para assistir ao famoso boxing day do qual já tive oportunidade de falar.

A edição deste ano não nos reservou jogos grandes, para quarta-feira dia 26 de Dezembro, mas o que não faltará será emoção, pois qualquer que seja o jogo em cartaz, a probabilidade de termos espectáculo é enorme.

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