Em janeiro de 2021, João Sousa testou positivo à covid-19 nas vésperas de viajar para Melbourne. Falhou o Open da Austrália, o primeiro Grand Slam da temporada. O torneio viria a ser ganho pelo número um mundial, Novak Djokovic.
12 meses passados, o tenista sérvio, recordista de vitórias no piso rápido australiano, nove vezes vencedor do “Happy Slam” e detentor de 20 Grand Slams (em igualdade com Rafael Nadal, que está na Austrália e Roger Federer, ausente, por lesão) está fora do Melbourne Park após uma novela de recusa de vistos e exceções médicas que culminou numa deportação em dois atos e a dois tempos.
A deportação impede o sérvio de chegar ao topo dos topos dos Grand Slams. Algo que seria normal acontecer na Rod Laver Arena onde somou ao longo da carreira o recorde de 82 vitórias (e somente 8 derrotas).
Sousa, o melhor tenista português de todos os tempos, número 140 no ranking mundial, entra no quadro principal da prova entre os quatro “lucky losers” mais cotados da última ronda do qualifying.
O vimaranense de 32 anos foi repescado após ter sido eliminado no court número 5 de Melboune Park frente ao moldavo Radu Albot (123.º ATP e quinto pré-designado), em dois sets, por duplo 6-4. Pisará pela nona vez na carreira (desde 2013) a grelha principal na Austrália.
A sorte, no entanto, foi sol de pouca dura para João Sousa cujo melhor registo é a passagem à 3.ª ronda em 2015 e 2016, em ambas as vezes eliminado pelo britânico Andy Murray, finalista do recente ATP 250 de Sydney.
Na primeira eliminatória (próxima madrugada) terá pela frente o italiano Jannik Sinner, 10.º jogador do ranking e uma das grandes promessas mundiais.
Após as lesões e o annus horribilis de 2021 — saiu fora do top-100, em março, depois de ter estado durante oito anos abaixo dessa linha da hierarquia mundial —, Sousa cumpre o objetivo de regressar ao quadro principal de um torneio do Grand Slam.
Para contar as vezes em que ficou de fora dos jogos de elite teremos de contar pelos dedos de uma mão e pedir dois emprestados à outra (sete vezes) desde que debutou na terra batida de Roland Garros, em 2012.
“O objetivo da temporada passa por voltar a jogar ao meu nível, ao que tenho vindo a fazer na minha carreira e, consequentemente, regressar aos palcos principais do ATP”, disse antes de se estrear em Sydney, evento preparatório de Melbourne, onde acabaria eliminado logo no primeiro trio de sets.
Digerido o dissabor, 48 horas antes de defrontar Sinner, não escondia o contentamento antes de se focar no adversário. “Estou muito contente por disputar mais uma vez um quadro principal de um torneio do Grand Slam, algo que no ano passado me tinha sido negado por ter testado positivo à Covid-19”, recordou o 28.º jogador mundial em 16 de maio de 2016.
“Já tinha saudades de jogar este torneio, e estar num quadro principal é sempre muito especial”, explicou numa mensagem áudio enviada pela sua assessoria após ser questionado pelo SAPO24.
Sobre o adversário, com quem joga terça-feira na Austrália, admite ser “difícil”. No entanto, sublinha, “em torneios do Grand Slam não há encontros fáceis”. Por isso, terá “de jogar ao mais alto nível para ter hipóteses de o vencer”, reconhece. “Espero fazê-lo para tentar continuar no torneio”, afirmou.
João Sousa, o único português em ação
Na Austrália, João Sousa, 17.º cabeça de série da fase de qualificação, será o único português em prova.
O novo coronavírus atirou Nuno Borges para fora dos courts antes mesmo de entrar. O n.º 190 e n.º 3 do ranking nacional, adiou, desta forma, a estreia num Grand Slam, depois de um ano de excelência — primeiro ano completo no circuito profissional, primeiro torneio do ATP Tour (Estoril Open) e primeiro título no ATP Challenger Tour (Antália, na Turquia).
O tenista da Maia, 24 anos, seria, caso entrasse em ação nos courts, o 19.º português (14.º masculino) a pisar estes palcos na Era Open (1968) enquanto profissional, depois de ter estado em Roland Garros, Wimbledon e Open dos Estados Unidos, na qualidade de júnior.
Gastão Elias (216 do ATP), que em setembro interrompeu o jejum de três anos e meio sem participações em torneios deste estatuto, voltou a ficar no exato lugar em que terminou no US Open, último Grand Slam do ano. Foi eliminado no terceiro jogo do qualifying e falhou a entrada no quadro principal.
João Domingues (n.º248) caiu na primeira ronda de qualificação e Frederico Silva (239.º) nas meias-finais, não repetindo o feito do ano passado, quando se tornou o primeiro jogador luso a ultrapassar a fase de qualificação do Open da Austrália. Uma epopeia com covid-19 à mistura (cumpriu 14 dias de isolamento num hotel de Melbourne devido a contacto de risco em Doha, Qatar, onde disputou os três jogos de qualificação) terminada às mãos de Nick Kyrgios.
Apoios, críticas e portas fechadas
Ora, um ano depois, a covid-19 esteve preste a retirar Kyros (115 do ATP) de cena da 110.ª edição do Open da Austrália (55.º da Era Open), a decorrer até 30 de janeiro, no Melbourne Park, na cidade de Melbourne, Estado de Vitória.
O australiano contraiu o vírus mas está apto para jogar. Antes, o excêntrico jogador que tem por hábito perguntar ao público para que lado deve executar o serviço não pediu licença a ninguém para dar o seu apoio a Novak no No Boundaries podcast. Um apoio vindo ainda da tenista francesa Alize Cornet, ao relembrar o papel de Novak, de Andy Murray, que aos microfones do Eurosport considerou que a situação “não foi boa” e de Vasek Pospisil. O checo trouxe as eleições australianas para o centro da discussão como tendo estado na base da decisão de proibição que pode impedir o sérvio de entrar em solo australiano nos próximos dois anos. Isto é, Djoko pode somente regressar aos 37 anos.
A história rocambolesca à volta do tenista, cuja ação filantrópica por via da sua fundação apoiou vítimas de covid-19 na Sérvia, não colheu, no entanto, a aprovação de todos os parceiros de court.
Rafael Nadal e Stefanos Tsitsipas, relembraram que todos sabiam que tinham de estar vacinados para entrar na Austrália, devolvendo, assim, a “bola” da culpa para Djokovic.
Emma Raducanu recordou ainda que a saga à volta de Novak distraiu o mundo das atenções do que se passa nos courts.
As portas fecharam-se na Austrália para o sérvio, mas não só. As entradas no Reino Unido e Estados Unidos da América obrigam à prova de vacina, pelo que o tenista de 34 anos poderá ficar de fora de Wimbledon e do US Open. Se não se vacinar, Djokovic não poderá participar no torneio Roland Garros, na sequência da aprovação do projeto de lei que vai impor certificado de vacinação. Há 12 dias o governo francês tinha indicado que o tenista sérvio poderia participar no torneio de Roland Garros mesmo sem estar vacinado.
Agora, porém, a ministra do Desporto francesa, Roxana Maracineanu, retificou a informação, horas depois de o Parlamento aprovar definitivamente o projeto de lei que vai impor um certificado de vacinação para muitas atividades da vida social, que inclui assistir a eventos desportivos.
Numa mensagem publicada na rede social Twitter, Maracineanu confirmou que o passaporte sanitário foi adotado, pelo que “desde que a lei seja promulgada, será obrigatória a entrada em espaços já sujeitos ao certificado (estádios, teatros ou salas) a todos os espetadores, praticantes, profissionais, franceses ou estrangeiros”.
O ténis no topo das conversas. Nadal à procura do 21.º título, Medvedev de subir a n.º 1
“Assim que o torneio começar (arrancou na madrugada), os jogadores e o público entrarem no mesmo lugar, em Melbourne Park, o ténis será o tema do topo das conversas”.
Quem o garante é Alex Corretja, antigo tenista profissional, treinador de Murray (2008-2011) e comentador do Eurosport (canal responsável pela transmissão do primeiro Grand Slam do ano).
“O AO é sempre diferente. Os jogadores vieram da pré-temporada, por vezes está calor, vento, há jogos noturnos, está tudo em aberto”, perspetiva ao SAPO24. “A preparação foi muito curta. Em normalidade teria sido bom ter mais descanso, mas desta vez, por causa da pandemia, acho melhor não ter tanto tempo de descanso, porque é difícil retomar”, explicou.
Sobre as previsões em singulares, Daniil Medvedev pode ser a barreira à pretensão de Rafa Nadal chegar aos 21 títulos Grand Slam. O russo, número 2 mundial, campeão do US Open, o primeiro Grand Slam da carreira, impediu em solo americano o sérvio Novak Djokovic de conseguir o raro feito de conquistar os quatro principais torneios no mesmo ano, é apontado como um dos favoritos. “Está em grande forma”, sentencia Alex Corretja.
No ano da celebração da 100.ª edição da competição feminina do Open da Austrália, Serena Williams e Bianca Andreescu são as grandes ausentes das partidas decididas à melhor de três sets.
A ausência da norte-americana – sete títulos na Austrália, a um da lenda local, Margaret Court — pode abrir caminho à número mundial, Ashleigh Barty. Em caso de vitória a australiana, desde 2019 no topo do ranking WTA no final das temporadas, pode bater um recorde nacional de 43 anos, pertença de Chris O’Neil, vencedora em 1978, então na cidade de Newcastle, Nova Gales do Sul. “Ash vem com bastante andamento e será muito perigosa. Está com ritmo e no ténis isso é benéfico”, finaliza Corretja.
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