Nasser Al-Khelaïfi tornou-se dono do Paris Saint-Germain em 2011 com um plano claro de fazer do clube da capital francesa uma grande potência — quiçá, a maior — do futebol mundial. Em 11 anos, foram gastos 1.405,6 milhões de euros em jogadores no Parque dos Príncipes, valor que apenas contabiliza transferências entre clubes e que não inclui, por exemplo, os contratos milionários de atletas que chegaram a Paris a custo zero, como é o caso de Lionel Messi ou Sergio Ramos. No mesmo período, foram contratados seis treinadores diferentes. Em 11 anos, o PSG venceu a Ligue1 sete vezes — número que deverá ascender a oito no final da presente temporada, uma vez que os parisienses têm 13 pontos de vantagem sobre o segundo classificado do campeonato francês, o Nice —, ergueu seis vezes a Coupe de France e a Taça da Liga e saiu ainda vencedor da Supertaça francesa em oito ocasiões.
O parágrafo é grande, mas isso não muda o desfecho da última década: a prateleira de troféus além fronteiras do PSG continua a mesma de 2001, ano em que venceu o segundo título europeu da história do clube, uma Taça Intertoto. Antes, na época 1995/96, tinha vencido a Taça das Taças.
De 2011 para a frente, o objetivo era claro: vencer a Liga dos Campeões. Foi para isso que Al-Khelaïfi foi, desde que chegou, adensando a constelação de estrelas. Começou, no primeiro ano da presidência, com a contratação de Javier Pastore ao Palermo (42 milhões de euros) e de Thiago Motta ao Inter de Milão (11,5 ME), no que toca a jogadores, e de Carlo Ancelotti para o banco, que chegou para o lugar de Antoine Kombouaré, que esteve longe dos bons resultados. Em 2012/13, chegaram a Paris, vindos do AC Milan, Thiago Silva (42 ME) e Zlatan Ibrahimovic (21 ME), nomes sonantes a que se somaram as chegadas de Lucas Moura (40 ME), Ezequiel Lavezzi (30 ME) e David Beckham (custo zero). Em 2013/14, bateu-se o recorde da transferência mais cara de sempre do clube com a contratação de Edison Cavani ao Nápoles por 64,5 milhões de euros; na mesma temporada começava o reinado mais longo de um treinador no Parque dos Príncipes, o de Laurent Blanc, antiga estrela francesa que por ali ficaria três épocas.
A temporada 2014/15 trouxe à capital francesa David Luiz (49,5 ME) e a época seguinte Ángel Di María (63 ME). Em 2016/17, Unai Emery, com três Ligas Europas conquistadas consecutivamente ao serviço do Sevilha, chegava ao clube, ao mesmo tempo que o jovem talento alemão Julian Draxler (36 ME), o jovem português Gonçalo Guedes (30 ME), ex-SL Benfica, e a promessa argentina Giovani Lo Celso (10 ME).
É importante fazer uma pausa na fatura para dizer que, até aqui, a receita europeia, se assim se pode chamar, consistiu nos seguintes resultados:
2011/12 - Eliminado da Liga Europa na fase de grupos
2012/13 - Eliminado da Liga dos Campeões nos quartos-de-final pelo FC Barcelona
2013/14 - Eliminado da Liga dos Campeões nos quartos-de-final pelo Chelsea
2014/15 - Eliminado da Liga dos Campeões nos quartos-de-final pelo FC Barcelona
2015/16 - Eliminado da Liga dos Campeões nos quartos-de-final pelo Chelsea
2016/17 - Eliminado da Liga dos Campeões nos oitavos-de-final pelo FC Barcelona
Em cinco anos de Champions, cinco eliminações nas fases do "mata-mata", três aos pés daquela que é consagrada como uma das melhores equipas da história do futebol moderno, o Barça de Luis Enrique e de 'La MSN', o trio ofensivo composto por Messi, Suárez e Neymar. A última perante o Barça, de 2016/17, foi particularmente dura: aconteceu após uma vitória por 4-0 no Parque dos Príncipes, a que se seguiu uma derrota por 6-1 em Camp Nou, naquela que é ainda hoje a maior remontada de sempre da competição. As outras duas aconteceram aos pés dos "azuis" de Londres, o único projeto milionário que, à data da publicação deste artigo, conseguiu real sucesso desportivo a nível europeu, com a conquista de duas Ligas dos Campeões, duas Ligas Europa, duas Supertaças Europeias e um Mundial de Clubes.
Procurando responder a seis anos ainda distantes dos resultados prometidos, em 2017/18, o PSG contrata Neymar ao Barcelona, naquela que é ainda hoje a a transferência mais cara da história do futebol: 222 milhões de euros. Na mesma época, com menos holofotes, chega Kylian Mbappé ao Parque dos Príncipes. No entanto, a chegada da estrela brasileira não foi suficiente para mudar a sorte parisiense na maior competição de futebol de clubes do mundo e, logo nos oitavos-de-final, novamente, os pupilos de Emery não resistiram ao futebol do Real Madrid de Cristiano Ronaldo e companhia que começava ali a reta final para a terceira Champions consecutiva.
Em 2018/19, Thomas Tuchel, ex-treinador do Borussia Dortmund, assumiu o comando técnico do clube. E depois de uma primeira época em que o PSG voltou a cair nos oitavos da Champions, desta feita aos pés de um modesto Manchester United, o alemão conseguiu chegar à final da Liga dos Campeões. Com uma equipa que apenas conservava Thiago Silva como um dos primeiros rostos do projeto megalómano de Nasser Al-Khelaïfi, os franceses debateram-se até ao último minuto com o Bayern Munich, mas um golo de Kingsley Coman, um antigo jogador da formação do emblema de Paris — que somou apenas quatro jogos pela equipa principal — foi suficiente para que os bávaros levassem a taça.
Em 2020/21, Tuchel muda-se para Londres, para treinar o Chelsea, e o PSG contrata Mauricio Pochettino, treinador que em 2019 tinha levado o Tottenham à final da liga milionária, de onde saiu derrotado pelo Liverpool. Mas o técnico argentino estava longe de viver os melhores meses com que poderia ter sonhado em Paris. Não só deixou fugir o campeonato francês para o Lille de José Fonte e Renato Sanches, como caiu nas meias-finais da Liga dos Campeões diante do Manchester City, deixando os adeptos dos parisienses a ver o Chelsea vencer a segunda Champions da história.
Se estes últimos dez anos podiam tentar ser desculpados por lesões, falta de tempo e azares, 2021/22 era o ano sem desculpas possíveis. A custo zero, o PSG foi buscar Lionel Messi, Gianluigi Donnarumma, Georginio Wijnaldum e Sergio Ramos. Por 66,5 milhões de euros, contratou Achraf Hakimi. Por empréstimo, foi buscar o jovem Nuno Mendes ao Sporting CP.
Com uma equipa com uma Bola de Ouro à cabeça, uma frente de ataque de gabarito mundial — com Messi, Neymar e Mbappé — dois guarda-redes de topo — um, Keylor Navas, com quatro Ligas dos Campeões no palmarés, outro, Donnarumma com um Euro acabado de conquistar com a seleção italiana —, com um plantel difícil de definir em qualidades pela quantidade de talento disponível, o PSG não conseguiu ser o clube europeu que queria ser. Acabou por perder esta quarta-feira por 3-1 no Santiago Bernabéu, aos pés do Real Madrid, depois de ter vencido a primeira-mão em casa por 1-0 e de 145 minutos, no conjunto dos dois jogos, em que, desportivamente, esteve sempre por cima.
Condenado por erros que não podem acontecer em equipas ditas grandes, como aqueles que aconteceram esta noite no primeiro e terceiro golo dos merengues, os franceses não foram perdoados pelo pé de Karim Benzema que, com um hattrick, volta a atirar o projeto do PSG ao chão e obriga a repensá-lo, numa altura em que a comunicação social espanhola dá como iminente a possível saída a custo zero de Mbappé para o Real Madrid — e que, a confirmar-se, confirma também que não são só os milhões que fazem uma equipa vencedora.
*Todos os valores foram retirados do site Transfermarkt
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