2019 é ano de Mundial de râguebi. Será no Japão, de 20 de setembro a 2 de novembro, e antecedem-lhe duas competições que prendem as atenções de todos os que gostam desta modalidade.
Em setembro teremos o Rugby Championship (competição onde participam Argentina, Austrália, África do Sul e Nova Zelândia, as quatro melhores seleções do hemisfério sul), torneio que este ano será jogado a uma só volta — o que lhe retira o toque apimentado de outras épocas.
A prender as atenções imediatas, o planeta da oval vai parar para assistir ao torneio das Seis Nações (herdeiro da Home Nations e do Asian 5 Nations), competição que junta Escócia, França, Inglaterra, Irlanda, Itália e País de Gales e que arranca no dia 1 de fevereiro e termina a 16 de março.
Os irlandeses são os campeões em título do torneio mais antigo do Mundo, numa edição em que acumularam a conquista de um Grand Slam, isto é, venceram todas as partidas em disputa.
A Irlanda viveu um dos seus melhores anos de sempre, que culminou com a vitória sobre os bicampeões mundiais em título, os All Blacks, com a eleição de Melhor Seleção do Mundo e com o seu médio de abertura Johnny Sexton a ser considerado Melhor Jogador e a protagonizar um dos melhores momentos do râguebi em 2018. No 1.º jogo do Seis Nações frente à França, um pontapé (drop) valeu três pontos e tudo o resto que se lhe seguiu.
Espreitando a edição de 2019 do Torneio das Seis Nações podemos, desde logo, dividir as seis participantes em três categorias: Irlanda e País de Gales na afirmação de poder; Inglaterra e Escócia, no regresso ao seu melhor; e França e Itália, sobreviventes a tentarem mostrar que ainda importam.
A maldição mundial afeta os campeões?
O Mundial de Râguebi disputa-se desde 1987 e arrasta consigo ao longo dos anos um mito que tem assustado os adeptos das seleções campeãs da competição europeia: vencedores em título das Seis Nações têm uma prestação negativa em mundiais.
Esta ideia é ao mesmo tempo verdadeira e falsa.
Para os que conhecem pouco a modalidade, ou os que gostam, mas são desatentos no que toca a estatísticas, ficam agora a saber que só por uma ocasião é que uma seleção europeia levantou o título de Campeões do Mundo, em oito edições da competição.
A Inglaterra foi essa “sortuda” em 2003, num ano ímpar para a formação de Sua Majestade, que teve na altura uma das melhores equipas de sempre (Jonny Wilkinson, Lawrence Dallaglio, Richard Hill, Jason Robinson, Ben Cohen, Will Greenwood, Josh Lewsey, Martin Johnson ou Phil Vickery).
Se 2003 é uma exceção, o que aconteceu nas outras edições?
Em 1987, a França foi até à final da competição e caiu perante a Nova Zelândia; 1991, a Inglaterra, detentora do Grand Slam, não conseguiu derrotar a Austrália na final; em 1995, a Inglaterra, que voltou a levantar o cetro das Seis Nações, não foi para além do 4º lugar; em 1999, a Escócia, detentora do troféu, acabou eliminada nos quartos-de-final pela Nova Zelândia; 2007 a França arrebatou o troféu e chegou a eliminar os All Blacks nos quartos, mas não foi para além das meias-finais. Para terminar, em 2011 a Inglaterra ficou pelos quartos-de-final, exatamente o mesmo desfecho em 2015 protagonizado pela Irlanda.
Em suma:
- Por quatro ocasiões, os campeões das Seis Nações ficaram pelos quartos-de-final;
- Por três ocasiões, foram a finais do Mundial. E numa sagrou-se campeão;
- Por uma ocasião, ficaram-se pelas meias-finais do maior torneio da modalidade.
A maldição é então sustentada na premissa, correta, de que quem ganha as Seis Nações não consegue levantar o título de campeão mundial (salvo a honrosa exceção de 2013). Mas é melhor ganhar algo do que sair de mãos a abanar, certo?
A dança das cadeiras acaba com uma história bonita?
2019 marcará o fim da ligação de três selecionadores aos seus “cadeirões” com particular destaque para Warren Gatland. O galês, há 12 anos no cargo de selecionador dos Dragões Vermelhos, conquistou três Seis Nações e vai deixar, sem dúvida alguma, uma marca profunda.
Para além de Gatland, Joe Schmidt e Eddie Jones despedem-se da Irlanda e Inglaterra, respetivamente.
O neozelandês levantou três títulos de campeão e projetou os irlandeses para um nível sem igual. Podendo ser considerado o “pai” desta revolução, que se iniciou a partir de 2011 e que deixa, após o Mundial, nas mãos do seu adjunto.
Já Eddie Jones foi o homem que colou os “cacos” que era a seleção inglesa em 2015, guiando a Rosa a um bicampeonato nas Seis Nações, para além de 18 jogos sempre a ganhar. O australiano que gosta de fazer uso dos mind games, quer sair pela porta grande e igualar o registo de Warren Gatland e Joe Schmidt como os selecionadores mais titulados em exercício.
Por outro lado, os dois selecionadores de nacionalidade neozelandesa têm a oportunidade apanhar Benard Laporte, o treinador com mais títulos no século XXI sempre ao serviço da França (agora é o presidente da Federação Francesa de Râguebi).
Será, portanto, uma última salva de honra para três homens que trouxeram títulos, recordes, registos impressionantes voltarem, pela última vez, em 2019, a medirem forças. Até porque um deles vai dizer adeus à competição (Joe Schmidt) e outros dois poderão passar para o hemisfério sul.
Quem são as maiores lendas?
Para quem aprecia jogadores fenomenais com muitos anos nas pernas, mas com uma jovialidade genial que força qualquer adepto a aplaudir, então estas Seis Nações vão ter alguns que valem a pena ter em consideração.
Curiosamente, a maioria são capitães das suas formações. Comecemos pelo mais lendário: Sergio Parisse. O n.º 8 vai completar 36 anos em setembro, sem ter perdido qualquer ponta do seu vigor com uma “agressividade” no contacto fenomenal, para além de uma voz de comando que impõe respeito.
Nascido em Buenos Aires, de pais italianos, o gigante careca soma 134 internacionalizações, 65 das quais nas Seis Nações. Basta somar mais uma e ultrapassa o irlandês Brian O’Driscoll como o jogador com mais jogos na competição.
Por falar em irlandeses, Rory Best, quase 37 anos feitos e mais de 113 internacionalizações pelo Trevo, talonador à antiga com pinceladas do novo virtuosismo dos avançados contemporâneos, é um autêntico carro-de-combate, movendo-se de uma forma agressiva, rápida e de uma pura genialidade que transporta a Irlanda para outra dimensão.
O País de Gales tem a “torre” Alun Wyn Jones, que caminha para os 35 anos sem mostrar uma ponta de velhice. Com 120 jogos pelos Dragões Vermelhos, o 2.ª linha de 1,98 metros mexe-se como poucos da sua posição, é um placador dotado e exprime como poucos o papel de líder.
Na seleção de Sua Majestade, Dylan Hartley e Mike Brown assumem o papel de veteranos em exercício das suas funções, com o talonador a estar muito perto das 100 internacionalizações, enquanto que o defesa, aos 33 anos, volta a estar debaixo dos holofotes.
A Escócia e França passam por processos de renovação e, curiosamente, não têm nenhum veterano (ou que se encaixe nestes parâmetros) em atividade.
Que jogos a ver?
As Seis Nações decorrem sempre por um período de cinco fins de semana divididos entre fevereiro e março. Em 2019 o calendário começa logo com um jogo, no mínimo, decisivo: Irlanda-Inglaterra.
Se em 2017 e 2018 este jogo ficou para o último “dia”, em 2019 merece honras de primeiro jogo da competição. Uma derrota não põe fim à campanha de qualquer uma das seleções, mas uma vitória vai dar o tónico necessário para lutar pelo Grand Slam.
A Inglaterra está sem ganhar à Irlanda desde 2017. Como nota, de lamento, não teremos um duelo Johnny Sexton versus Owen Farrell, uma vez que o inglês está lesionado e não há ainda data para regressar à competição. O encontro está agendado para o dia 2 de fevereiro, às 16h45.
O segundo jogo de visionamento obrigatório é precisamente o penúltimo da última jornada: País de Gales-Irlanda (16 de março, às 14h45). Ao contrário do que se pode pensar, os galeses têm uma oportunidade de ouro para sair em 2019 com o “caneco” na mão e estão há 8 jogos sem perder, um registo de classe para os comandados de Warren Gatland.
Com o jogo marcado para o Millennium Stadium, em Cardiff (será que vão fechar a cúpula de forma a tornar o barulho ensurdecedor?), a Irlanda vai ter um desafio extremamente exigente que os colocará à prova na luta pelo Grand Slam.
Para os galeses a possibilidade de fecharem a campanha com uma vitória sobre os campeões em título será o melhor prémio possível (a par de serem campeões das Seis Nações) e uma despedida merecida para Warren Gatland.
Como nota final, atenção a Jacob Stockadale, o ponta irlandês que com 21 anos bateu o recorde de ensaios em só uma edição (7 em 2018).
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