27 trabalhadores e um ano depois da chegada da Nickel a Portugal o CEO, em Portugal, João Guerra, diz ter "muito orgulho" por poder apresentar um estudo que ilustra o "mercado maduro" desta fintech que está já disponível em 460 postos de venda de comércio local, em sítios tão próximos quanto tabacarias, por exemplo.

"Queremos ser tão locais quanto possível", explicou Marie Degrand-Guillaud, Vice-Presidente da Nickel. Contudo o interior norte de Portugal ainda continua sem ter postos de venda para criação de conta. Tanto o CEO português, como a Vice-Presidente francesa dizem não ser por nenhum motivo de exclusão territorial, muito pelo contrário, às vezes é apenas desconfiança. "Temos agora como parceiro a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal que nos vai ajudar junto das Freguesias", até porque, explicam, nessa zona muitas vezes tem que se fazer 50km para se chegar a um banco ou a uma caixa multibanco. Mas acrescentam que já há alguns locais em processo de tornarem postos de venda, "o processo de aprovação de um posto de venda demora cerca de três meses. Tem que ir ao Banco de França e ao Banco de Portugal".

"Eu saí da banca tradicional precisamente por perceber que os novos modelos de negócio, naturalmente, iam fazer parte do setor financeiro.  Talvez Portugal ainda seja o país que está um bocadinho mais atrasado em comparação com a Europa".

João Guerra dirige há um ano a Nickel em Portugal e deixa para trás um caminho na consultoria e na banca tradicional, mas não teve dúvidas no momento da saída. "Eu saí, precisamente, por perceber que os novos modelos de negócio naturalmente iam fazer parte do setor financeiro.  Talvez Portugal ainda seja o país que está um bocadinho mais atrasado em comparação com a Europa". Mas, segundo o estudo divulgado por este serviço de pagamento do BNP Paribas, o país caminha na mesma direção dos congéneres europeus. É que ainda que apenas 41% dos inquiridos refira em primeiro lugar os canais digitais em vez da banca tradicional, 73% tenciona trabalhar com instituições financeiras digitais nos próximos tempos.

Com base na experiência que tem nos países onde a Nickel está sediada - França, Espanha, Bélgica e Alemanha - João Guerra traça um cenário. "A quantidade de de fintechs novas que aparecem é enorme. Depois como tudo na vida há uma seleção natural, uns morrem outros sobrevivem. Outros são comprados pelos grandes bancos. Muitas são startups, muitas não são rentáveis." Continua, "aliás o número é forte, só 4% das  fintech e dos bancos a nível mundial é que são rentáveis." Olhando para este cenário confessa, "eu sabia que não havia volta a dar, as fintech trazem muita inovação e muita concorrência ao setor, e é isso que faz mexer. É isso que faz inovação na oferta de produtos e serviços, é isso que faz baixar o preço aos consumidores. É isso que faz, no caso dos pequenos negócios, haver muita evolução nos terminais de pagamento (TPA), que cá ainda está muito parada. Portanto, para mim a evolução era natural. Foi a razão que me levou a sair do setor e, portanto, foi a razão que me fez voltar."

"O facto de a conta ser muito simples leva a que as pessoas a queiram utilizar. E o facto de a quererem utilizar faz com que as pessoas a usem e quando a usam pensam. Um dos principais aspetos de inclusão social é a inclusão financeira."

João Guerra foca-se na concorrência como medidor da saúde do mercado, o SAPO24 provoca e questiona se a banca tradicional, mais conservadora, tem sabido lidar e receber as fintech no mercado.  Começa por se focar na Nickel dizendo que "é muito complementar à banca tradicional, e também é o nosso primeiro ano de atividade. Eu acho que o positivo é a complementaridade e que haja essa concorrência, porque  fomenta a inovação, fomenta que se procurem novas soluções. Fomenta a qualidade dos serviços e, mais uma vez, isso traduz sempre em valor acrescentado para o consumidor final. Nova oferta, melhores serviços, mais qualidade e, muitas vezes, preços mais competitivos. Nós queremos conviver de forma natural e complementarmente à banca." Mas depois de alguma insistência é peremtório, "eu nunca senti absolutamente nada de qualquer banco, acho que a banca em Portugal é muito correta e concorre entre si de forma muito saudável. Nós somos mais um player sem problema nenhum, queremos vir ajudar o setor com a certeza que todos estão interessados em que o setor evolua. É muito saudável."

E os clientes parecem gostar mais desta nova liberdade que a banca digital traz, tanto que 50% dos inquiridos no estudo consideram pouco convenientes os horários de funcionamento dos bancos, embora ainda haja desconhecimento em relação às novas opções de banca digital.

João e Marie focam-se numa ideia, "a simplicidade". Marie, inclusive, faz uma demonstração ao SAPO24 de como se cria uma conta na Nickel no comércio local. No estudo, contudo, fica a faltar o número global de clientes em Portugal. E perante a possibilidade de uma conta onde há apenas uma anuidade de pouco mais de 20 euros, acessível a todos. Onde apenas é necessário um documento de cidadão para a abrir e que oferece a possibilidade de os migrantes enviarem remessas (RIA) é impossível não questionar qual a percentagem de imigrantes a usá-la. João Guerra diz também não ter números, mas acredita que em Portugal os clientes imigrantes da Nickel serão mais ao menos o espelho da realidade portuguesa. "Em Portugal vivem dois terços de portugueses e mais ao menos meio milhão de outras nacionalidades", assim os clientes da Nickel acompanharão esta realidade, de forma directamente proporcional.

"A Nickel é muito inclusiva e contribui para esse aspeto da inclusão financeira, quase por design, está no nosso ADN."

Na senda deste tema João Guerra reconhece que todo o processo de abertura de conta hoje, em Portugal, não é processo fácil. Reconhece não ter a ver apenas com os bancos, mas sim  com todo o setor, a regulação e a legislação, mas acrescenta "não é um processo fácil, mas obviamente que ele pode ser simplificado. Foi esse o trabalho enorme que nós fizemos. Cumprindo obviamente toda a legislação, olhar e pensar como é que aquele processo podia ser tornado muito mais simples e com uma experiência para o utilizador melhor. Isso atrai todos, tanto residentes e não residentes, onde se calhar", acrescenta numa suposição, "o processo de abertura de conta em Portugal ainda seja mais difícil do que para um português." E extrapola, "de facto esse aspeto da simplicidade em conjunto com os nossos valores é muito relevante e atrai, de facto, as pessoas. Até as pessoas mais novas que não têm paciência para a complexidade e da burocracia de ir ao banco. É apelativo a todos, cada vez queremos coisas mais apelativas, simples e que se possível tenham um impacto positivo na sociedade."

O confronto com os números apresentados no estudo pode ser assustador, veja-se que 42% dos inquiridos declara assinar o contrato sem ler ou entender as condições gerais da conta.

João Guerra diz com orgulho que a Nickel está a tentar inverter esta realidade. "A Nickel é muito inclusiva e contribui para esse aspeto da inclusão financeira", acredita que esse pressuposto está enraízado na empresa que representa, "quase por design, está no nosso ADN." Conta que "o facto de a conta ser muito simples leva a que as pessoas a queiram utilizar. E o facto de a quererem utilizar faz com que as pessoas a usem e quando a usam pensam." Para validar este pensamento, refere um estudo do Banco Mundial "que diz que um dos principais aspetos de inclusão social é a inclusão financeira." Refere que ter acesso ao dinheiro numa conta, com todos os dados na palma da mão é totalmente diferente de "ter as notas soltas na carteira. Isto já permite pensar com estratégia de poupança. Começa naturalmente a facilitar um aspeto de gestão orçamental do dia-a-dia, da receita mensal. Isso é muito importante, quando a pessoa não tem conta perde-se um bocado. E o facto de estar no nosso ADN, de ser muito simples de abrir,  e ser muito fácil de utilização na app, faz com que as pessoas comecem a usar. E isso leva-as a estimular todo este processo de gestão orçamental que é muito positivo."

Voltando aos números alarmantes, 47% acredita pagar até 60 euros de comissões de manutenção de conta, sendo que quase 30% tem consciência de pagar mais de 60 euros e os restantes pensam não pagar nada, ou nem saber quanto pagam". Mas mais gritante são os "48% que declaram não conhecer o preçário do seu banco, dos quais 20% afirma nem saber onde encontrá-lo".

"As pessoas sentem desconforto, uma aparente menor transparência e depois sentem uma desconfiança generalizada com a banca tradicional. Que eu também não acho que seja só exclusivo de Portugal."

João concorda que os números são preocupantes, mas não os estranha. Lembra que "um banco universal  tem clientes particulares, tem empresas, tem uma oferta muito grande e a legislação não facilita. Há alguns preçários que têm cento e tal páginas. Todo o processo não é fácil", reconhece. E dá o exemplo da Nickel como oposição,  "a nossa missão foi o nosso preçário ser simples. Tem quatro ou cinco páginas e além dos 20 euros há pouco mais a pagar - em transferências não SEPA, por exemplo - e é muito fácil de entender."

Garante que os valores da empresa fazem com que não queiram que "as pessoas sejam apanhadas de surpresa. Que é isso que não gostam na banca tradicional hoje. As pessoas pagam comissões que nem sabem de que são. Os bancos comunicam, seguramente que num extrato ou num email foi lá. Todos cumprem, não tenho duvida absolutamente nenhuma. Mas as pessoas não lêem ou não percebem e depois sentem esse desconforto, essa aparente menor transparência e depois sentem uma desconfiança generalizada com a banca tradicional. Que eu também não acho que seja só exclusivo de Portugal."

"O tema da segurança para nós é super importante, sabemos que as populações mais fragilizadas e com menor literacia financeira são mais fáceis de atacar."

É impossível falar-se de fintech sem se soltarem os alarmes da cibersegurança, a Nickel tem estratégias para estar o máximo blindada possível. O tema surge depois de se questionar João Guerra acerca dos limites que a conta tem nos movimentos. "Há várias razões para termos os limites, a primeira é uma proteção ao cliente. O tema da segurança para nós é super importante e temos uma equipa gigante com todo o apoio do BNP Paribas a trabalhar nesse aspeto." E, quase como um círculo vicioso, volta-se ao mesmo,  "sabemos que as populações mais fragilizadas e com menor literacia financeira são pessoas mais fáceis de atacar".  Justifica, "todos esses sistemas são super importantes. Como temos perfeita consciência disto quando uma pessoa abre a conta, a conta vem bastante limitada a todos os níveis. Nomeadamente nas formas de sair dinheiro da conta, pelas mais diversas vias. Se alguém roubar ou perder o cartão, ou hackear a app, seja qualquer tipo de fraude, os movimentos estão muito limitados. Obviamente que a pessoa pode ir aumentando esses limites, mas é uma proteção que pomos no início."

Para já o MBWAY continuará a não ser uma possibilidade para aqueles que têm cartão Nickel, "estamos a ver com a SIBS, estamos a avaliar". Também os pequenos créditos, créditos ao consumo e produtos de poupança ficam para já afastados, mas não fora de vista "se o produto for simples, útil e universal é uma coisa que pode estar em cima da mesa".

Mais longe está o mercado dos pequenos negócios. "Para já a licença que temos enquanto instituição de pagamento e de particulares nem permite. Nós avaliamos o tipo de oferta em concreto para os particulares, ofertas que façam sentido para estes clientes. O mercado de empresas sejam pequenos ou grandes ainda não está no nosso espectro a curto prazo. Se caírem nesta grelha de critérios dos nossos valores, pode ser interessante explorar porque temos esses parceiros todos. Mas para já ainda não."