“Os bancos com sede no Reino Unido são os maiores detentores da dívida dos países pobres; dos 73 países elegíveis para a iniciativa de alívio da dívida apresentada pelo G20 em resposta à covid-19, 30% da sua dívida aos credores privados é devida a empresas no Reino Unido”, lê-se numa nota envidada à Lusa, na qual se especifica que este valor compara com os 18% devidos aos bancos chineses e os 7% a instituições financeiras norte-americanas.
“Os números do Banco Mundial [nas Estatísticas Internacionais sobre a Dívida] mostram que os credores com sede no Reino Unido são os que estão a lucrar mais com o falhanço dos credores privados em participarem na suspensão da dívida”, acrescenta a ONG britânica, usando a atualização dos dados do Banco Mundial sobre a dívida para vincar o papel das instituições financeiras britânicas na questão da dívida dos países em maiores dificuldades, nomeadamente os africanos.
“Até agora três países candidataram-se ao novo Enquadramento Comum do G20 para a reestruturação da dívida, e a maioria dos pagamentos da dívida do Chade, Etiópia e Zâmbia é devida a credores privados, sendo 33% da sua dívida a empresas britânicas, 23% a chinesas e 15% a norte-americanas”, acrescenta o CJD.
Os números divulgados pelo Banco Mundial e usados por esta ONG que se dedica à promoção da dívida sustentável a nível mundial abrangem apenas os empréstimos contraídos pelos países junto de bancos e instituições financeiras, deixando de fora a emissão de títulos de dívida soberana (Eurobonds).
Ainda assim, segundo o CJD, “90% dos títulos de dívida dos países em desenvolvimento elegíveis para as iniciativas do G20 sobre a dívida são governados pela lei britânica, sendo 100% no caso da Etiópia e da Zâmbia”.
A DSSI valeu a suspensão de pagamentos no valor de 5,3 mil milhões de dólares (4,3 mil milhões de euros) a outros governos, dos quais 2,1 mil milhões de dólares, cerca de 1,7 mil milhões de euros, foram para bancos públicos chineses, não tendo havido qualquer suspensão a credores privados.
A DSSI é uma iniciativa lançada pelo G20 em abril do ano passado que garantia uma moratória sobre os pagamentos da dívida dos países mais endividados aos países mais desenvolvidos e às instituições financeiras multilaterais, com um prazo inicial até dezembro de 2020, que foi depois prolongado até junho deste ano, com possibilidade de nova extensão por seis meses.
Esta iniciativa apenas sugeria aos países que procurassem um alívio da dívida junto do setor privado, ao passo que o Enquadramento Comum, aprovado pelo G20 em novembro, defende que é forçoso que os credores privados sejam abordados, ainda que não diga explicitamente o que acontece caso não haja acordo entre o devedor e o credor.
O pedido de adesão a este Enquadramento por parte da Etiópia, no final de janeiro, agitou os investidores, que encararam o país como o primeiro de vários países na África subsaariana a pedirem alívio da dívida, o que é também a perspetiva da diretora executiva da Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA), que antevê que mais países sigam o exemplo do Chade, da Zâmbia e da Etiópia.
A proposta apresentada pelo G20 e Clube de Paris em novembro é a segunda fase da DSSI, lançada em abril, e que foi bastante criticada por não obrigar os privados a participarem do esforço, já que abriria caminho a que os países endividados não pagassem aos credores oficiais e bilaterais (países e instituições multilaterais financeiras) e continuassem a servir a dívida privada.
Este enquadramento pretende trazer todos os agentes da dívida para o terreno, incluindo os bancos privados e públicos da China, que se tornaram os maiores credores dos governos dos países em desenvolvimento, nomeadamente os africanos.
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