Depois de anos com uma taxa de inflação muito baixa, a reabertura da economia após a pandemia e os preços mais elevados dos produtos energéticos fizeram soar os primeiros alarmes na reta final de 2021.
O fenómeno agudizou-se ao longo de 2022, levando o Banco Central Europeu (BCE) a subir, em julho desse ano, pela primeira vez em 11 anos as taxas de juro, com o objetivo de fazer regressar a taxa de inflação para a meta de 2%.
Apesar da guerra na Ucrânia não dar sinais de ter fim, o impacto sobre a energia e sobre os produtos alimentares atenuaram-se e ao longo de 2022 começaram a surgir os primeiros sinais de que a inflação poderá estar numa rota descendente, que segundo os economistas se deverá confirmar como sustentada em 2024.
“O ritmo de descida da inflação que observamos a partir do verão não deverá ser repetível devido a efeitos de base. Para 2024 há três aspetos importantes a contribuir para uma inflação mais baixa: a política monetária é restritiva, a evolução dos preços da energia e outras commodities é encorajadora e estamos perante um abrandamento da atividade”, explica o presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros.
No entanto, o economista assinala que “2024 não deverá ser assim tão mau para o consumo já que teremos um alívio nos juros e na inflação, tendo os salários recuperado”.
“Haverá, provavelmente, um acréscimo de rendimento disponível face a 2023 em muitos casos, o que deverá suportar o consumo e impedir uma queda tão pronunciada na inflação. Os preços dos bens deverão subir pouco ou nada, mas enquanto o desemprego não aumentar, os preços dos serviços deverão continuar suportados”, refere.
O economista aponta para um intervalo da inflação média não harmonizada entre 1,8% e 2,3% em Portugal em 2024, acreditando que relativamente à previsão do BCE de uma taxa de 2,7% em 2024 será revista em baixa ao longo do ano.
O economista sénior do Banco Carregosa Paulo Rosa também prevê ser “bem provável que a inflação continue a desacelerar em 2024, não sendo mesmo de excluir um período deflacionista se as economias portuguesa e da zona euro entrarem em recessão”.
A taxa de inflação homóloga da zona euro recuou, em novembro, para os 2,4%, segundo a estimativa rápida divulgada pelo Eurostat.
Este valor, o mais baixo desde julho de 2021 (2,2%), compara-se com o de 2,9% registado em outubro e a de 10,1% de novembro de 2022, medida pelo Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC).
O professor do ISEG António Ascenção Costa considera que “a recente queda da inflação, mais rápida que o esperado, decorre da resolução dos problemas da oferta que estiveram na origem do surto inflacionista inicial”.
“Sem agravamento das tensões geopolíticas, com impactos imprevisíveis na oferta mundial de algumas matérias-primas ou mesmo de bens especializados, a evolução da inflação deverá continuar no sentido da queda”, prevê o economista sobre a evolução no próximo ano.
Um cenário também admitido pelo diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, Pedro Braz Teixeira, que assinala que “a guerra no Médio Oriente se mantiver circunscrita, espera-se que a inflação prossiga a sua trajetória descendente”.
Apesar do relativo otimismo, os decisores do BCE têm sublinhado que ainda não é possível “declarar vitória” contra a inflação, alertando que atingir os 2% que pretende pode ainda levar algum tempo.
A presidente do BCE, Christine Lagarde, tem repetido apelos para prudência nos aumentos salariais, alertando que a inflação estava agora a ser mais impulsionada por fontes internas do que por fontes externas.
“As pressões salariais, entretanto, permanecem fortes. A nossa avaliação atual é que isto reflete principalmente efeitos de ‘recuperação’ relacionados com a inflação passada, e não uma dinâmica auto-realizável. E esperamos que os salários continuem a ser um factor-chave que impulsiona a inflação interna”, disse.
O coordenador do NECEP — Católica-Lisbon Forecasting Lab, João Borges de Assunção, considera que “há o risco das subidas de salários acima” da meta de 2%, entre 2022 e 2024, poderem dificultar o trabalho do BCE.
Na última projeção em outubro, o NECEP apontava para um ponto central para a inflação na zona euro em 2024 entre 3% e 5% e um pouco mais baixo em Portugal, entre 2,5% e 4,5%.
“Os dados da inflação de outubro e novembro, porém, saíram bastante bons, o que torna os valores na parte inferior dos intervalos de projeção mais verosímeis”, explica.
Para o economista, “a evolução das taxas de juro é a partir de agora mais incerta”, já que “os que defendem que a subida dos juros já foi suficiente para combater a inflação têm agora argumentos”, mas “quem teme que as subidas de salários se repercutam em aumentos permanentes de preços, particularmente nos serviços, também têm argumentos”.
“Provavelmente o BCE quererá ver muitos meses com a inflação mensal, expurgada das componentes voláteis, consistente com uma inflação anual de 2% antes de considerar que o problema deste episódio de inflação entre 2021 e 2023 ficou resolvido”, conclui.
AAT (IG/ALN) // JNM
Lusa/Fim
Comentários