"A evolução da pandemia conduziu a medidas de confinamento que vão ter um impacto significativo, em particular nos setores mais afetados pela necessidade de distanciamento social", disse o ministro de Estado e das Finanças hoje numa audição regimental na Comissão de Orçamento e Finanças (COF) da Assembleia da República.

"Tal implica que no Programa de Estabilidade teremos de rever significativamente o cenário macroeconómico para 2021 e teremos de rever em alta o défice orçamental para 2021", disse o governante.

Por outro lado, João Leão disse acreditar que "o sucesso na aprovação das vacinas" dá "confiança numa recuperação económica ainda mais robusta no segundo semestre deste ano", face ao anteriormente esperado.

"Estamos confiantes que 2021 será um ano de recuperação económica devido a esta recuperação muito intensa no segundo semestre deste ano", afirmou ainda o ministro.

"Do lado do Governo queremos deixar uma mensagem muito forte de apoio e compromisso às empresas e aos trabalhadores que veem a sua atividade condicionada pela pandemia: a garantia que as medidas de apoio às empresas e ao emprego - como o 'layoff' e outras - se vão manter enquanto durar a pandemia e a atividade económica estiver condicionada, custe o que custar", disse João Leão.

O ministro disse ainda que as medidas extraordinárias de apoio às famílias também se vão manter enquanto durar a pandemia, advogando que não se pode "deixar ninguém para trás".

"Neste contexto exigente temos de evitar o perigo de se retirarem os apoios à economia demasiado cedo. Temos de ter margem para manter os apoios de emergência às empresas e às famílias enquanto a pandemia durar", disse anteriormente o ministro.

João Leão salientou que o Orçamento do Estado para 2021 (OE2021) tem "um 'mix' de combinação de políticas para as duas diferentes fases da pandemia e da economia".

O governante elencou medidas "para a fase de emergência e suporte", como "o 'lay-off', a nova prestação social, a prorrogação do subsídio de desemprego, as moratórias e os empréstimos com garantia do Estado" como medidas que se têm adaptado ao longo da crise associada à pandemia de covid-19.

João Leão falou ainda de "um conjunto de medidas para a fase de relançamento da economia, como o investimento público superior a 23%", o "aumento da liquidez das famílias pela via da diminuição das retenções na fonte do IRS", "a descida dos impostos pela via do IVA da eletricidade", que, segundo o ministro, são medidas que totalizam 500 milhões de euros.

Mais tarde na audição, o ministro previu ainda que em 2021 o Governo vai "ter que gastar muito mais em 'lay-off'".

"Temos cerca de 212 mil trabalhadores no 'lay-off' simplificado e vamos ter de reforçar muito além do previsto, não só neste regime, mas também depois no apoio à retoma progressiva", anteviu João Leão.

No início da sua intervenção, o governante tinha afirmado que "a terceira vaga da pandemia tem sido muito mais intensa que o esperado para a Europa e, em particular, em Portugal".

"A pandemia tem tido consequências devastadoras e tem exigido de todos um sacrifício e uma capacidade de adaptação notável", assinalou.

Para 2021, o Governo prevê, atualmente, um crescimento económico de 5,4% e um défice de 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB).

Não é possível executar orçamento a 100% em todos os setores

O ministro de Estado e das Finanças, João Leão, defendeu hoje que a execução a 100% dos orçamentos do Estado não é possível, refutando críticas da oposição acerca de execução abaixo do orçamentado em 2020.

"Tem-se discutido recentemente o grau de execução do orçamento de 2020. O valor orçamentado em contabilidade pública representa um teto máximo de despesa autorizado pela Assembleia da República. A dotação representa o limite máximo do que pode ser executado, não é uma previsão do que vai ser executado", disse hoje o ministro no parlamento.

O ministro argumentou que "caso se executasse um valor superior ao orçamento global, isso, de facto, seria ilegal", acrescentando que "em todos os orçamentos estes tetos nunca são atingidos simultaneamente em todas as áreas".

"É assim noutros países, sempre foi assim ao longo do tempo na Administração Central, na Segurança Social, na Administração Regional, na Administração Local", enumerou.

O governante assinalou que durante 2020 algumas entidades públicas "não executaram receita própria que não tiveram, porque não podem executar algo que não existe", referindo, por outro lado, que em alguns setores, como a saúde, ou a Segurança Social, executaram acima do previsto.

Nas intervenções dos partidos durante a comissão, todos os deputados criticaram a política de despesa seguida pelo Governo em 2020.

Pelo PSD, o deputado Duarte Pacheco disse que durante a governação PS "a despesa ficou sempre abaixo daquilo que era autorizado pelo parlamento, o que não é propriamente mau se as necessidades estiverem satisfeitas e se o investimento público estiver a níveis aceitáveis".

"Mas aquilo que aconteceu em 2020 é uma situação excecional. E porque estamos numa situação excecional, que gerou a maior crise económica da nossa democracia", algo que "leva o Governo a apresentar um orçamento suplementar a pedir reforço de despesa para apoiar as famílias e as empresas e os próprios organismos do Estado que precisavam de ajuda, e o parlamento concedeu", de acordo com o deputado.

Para Duarte Pacheco, chegado o fim do ano, "a realidade é o que é", acusando o ministro de "poupar sete mil milhões de euros face àquilo que pediu ao parlamento", dizendo que ou o ministro "foi incapaz de preparar um orçamento suplementar rigoroso", ou "identificou capazmente as prioridades, avaliou corretamente as necessidades, mas optou por não executar a despesa".

Pelo BE, a deputada Mariana Mortágua disse que o ministro "passou o ano de 2020 a regatear apoios", como o subsídio de risco dos profissionais de saúde, mas que se ficou a saber "no final do ano que não executou, tudo somado, um cêntimo da despesa autorizada pelo suplementar".

"Não nos pode dizer que ajustou a receita à despesa, porque se assim fosse o défice não tinha ficado abaixo do previsto em 3.500 milhões de euros em contabilidade pública", argumentou a parlamentar bloquista.

Mariana Mortágua disse ainda que o Governo "nem sequer executou o que estava orçamentado antes da pandemia em 2.382 milhões de euros", algo que somado ao orçamento suplementar significam quase sete mil milhões de euros por gastar, um valor que a deputada comparou aos gastos com a Escola Pública.

O deputado do PCP Duarte Alves centrou a sua intervenção nas medidas para 2021, sem deixar de referir que "muitas das medidas, para serem executadas este ano, têm de começar a sua execução no início de 2021", o que olhando para os números de 2020 "não descansam" o PCP.

"Na verdade, aquilo que apetece perguntar é para que é que serviu o orçamento suplementar. Pois se a despesa ficou abaixo até do orçamento inicial, para que é que serviu o orçamento suplementar?", questionou.

Pelo PAN, o deputado André Silva disse que o Governo "tinha autorização para gastar até 13,8 mil milhões de euros no combate às crises" que se vive, e "optou por não o fazer, gastando apenas 10,3 mil milhões de euros", referindo também o investimento público abaixo do orçamentado.

A deputada do CDS-PP Cecília Meireles afirmou querer perceber "qual a diferença entre a propaganda e a realidade", questionando o ministro acerca dos 22 mil milhões de euros anunciados pelo titular da pasta da Economia do total de apoios, dizendo que pelo menos 3.500 milhões não chegaram às empresas.

O deputado único da Iniciativa Liberal, João Cotrim de Figueiredo, disse ao ministro que tinha que "convir que um teto previsto antes de pandemia acabar por nem sequer funcionar como teto numa situação de pandemia é bizarro".