Mais do que um problema de saúde pública, a pandemia depressa se transformou numa crise económica. As portas dos estabelecimentos fecharam, eventos foram cancelados, alteraram-se rotinas de trabalho e as pessoas trancaram-se em casa, para que tudo pudesse ficar bem.

Contudo, um dia as portas teriam de reabrir. Não como dantes, é certo. Surgiram novas regras, novos pormenores a que dar atenção. E, em cada área da sociedade — até naquelas em que às vezes não se pensa —, tudo teve de ser adaptado, em negociação com o Governo e com as autoridades de saúde.

Dos ginásios aos espetáculos, passando pelos e restaurantes e cabeleireiros, muita coisa mudou nos últimos meses. E estas são algumas das pessoas que, nos seus setores, tudo têm feito para que se recupere alguma normalidade — ou se ganhe o tal "novo normal".

Nova vida nos ginásios. "O nosso setor é um dos que vai sofrer mais"

É um dos setores ainda paralisados e sem data para um regresso. José Carlos Reis, presidente da AGAP [Associação de Ginásios e Academias de Portugal], conta ao SAPO24 como têm sido os últimos tempos.

"Já estivemos reunidos com a Secretaria de Estado da Juventude e Desporto e tivemos a apresentação de dois documentos, com novas regras de segurança e os apoios para o setor. Agora, estamos numa fase de negociação, com vários membros do Governo e com a Direção-Geral da Saúde [DGS]", começa por explicar.

"Apresentámos documentos, com propostas. Quanto às medidas para a reabertura, o que nós fizemos foi fazer um benchmarking daquilo que está a ser feito nos vários países da Europa em que os ginásios já estão abertos. Escolhemos as melhores práticas e apresentámos um conjunto de propostas para a abertura dos ginásios em segurança e com confiança para os nossos clientes. No entanto, queremos que essas propostas tenham as chancelas da DGS, já que, se for a entidade a propor, para os nossos clientes será transmitida muito mais confiança, como é óbvio", afirma José Carlos.

Até ao momento, "não houve um compromisso da DGS para a data de abertura, até porque essa é uma competência do Conselho de Ministros", mas a AGAP deixou já "bem expresso" que os ginásios podem abrir a 1 de junho, uma vez que, se tal não acontecer, pode estar em causa a sobrevivência de muitos ginásios que vivem já "uma situação dramática".

"Cerca de 60 a 70% são pequenas empresas, mesmo microempresas, de cariz familiar, que não tem qualquer fundo de maneio que lhes permita passar por uma situação como esta, de dois meses de inatividade. É muito complicado, é um setor que tem muitas pessoas que dependem dele", refere José Carlos Reis."São 17 mil empregados diretos, mais 15 ou 20 mil indiretos, em que a maior parte deles são prestadores de serviço, são pessoas que estão a recibos verdes. E, não havendo atividade, não têm qualquer tipo de remuneração. Os apoios são muito escassos".

Como vai ser o regresso?

Com isto, a situação não é fácil. Principalmente porque a retoma da atividade, assim que permitida, não vai ser imediata, pela decisão das pessoas. "O nosso setor é um dos que vai sofrer mais. Acredito que, no início, 40 ou 50% das pessoas vão aos ginásios sem problemas, mas vai haver uma grande quantidade que vai ter receio. O nosso setor vai ser um dos mais afetados enquanto não houver uma vacina, uma estabilidade na cura deste vírus", reflete o presidente da AGAP.

Qual é a solução para atenuar esta consequência? José Carlos não tem dúvidas. "Temos de cumprir todas as indicações que a DGS nos der. As pessoas têm de perceber que a maior preocupação dos clubes é a sua segurança, a sua saúde, e não os motivos económicos que se possam sobrepor. Nós temos de transmitir isto aos nossos clientes: estamos preocupados com eles e com a sua saúde. Nós somos entidades promotoras de saúde e não entidades que promovem doença", garante.

E tem mais uma certeza: os ginásios portugueses "são dos mais seguros e qualificados de todo o mundo".

Até aqui, todo o trabalho foi diferente. Os espaços que estavam cheios ficaram vazios, mas as aulas passaram para outra realidade. "Tivemos de mudar o trabalho presencial para o trabalho online. Hoje em dia os clubes são praticamente online e é uma constante adaptação. Entretanto, há cerca de duas semanas, passámos a ter autorização para dar aulas no exterior, os clubes tiveram também de se adaptar a essa realidade. É possível juntar cinco pessoas no exterior, os personal trainers estão a trabalhar, é uma adaptação constante. O nosso setor, felizmente, é um setor muito apto e que tem mostrado uma capacidade muito grande de inovação", diz com orgulho.

Apesar das diferenças, José Carlos diz que "o feedback tem sido muito positivo". "Estamos a conseguir manter a maioria dos nossos clientes, têm-se mantido fiéis e continuam, de certa forma, a contribuir para a sobrevivência".

O que já se sabe sobre a prática desportiva

Publicada em Diário da República, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 33-A/2020, de 30 de abril de 2020, declara "o encerramento obrigatório dos ginásios e academias". Contudo, há uma alteração no documento: passou a ser permitida a atividade física e a prática desportiva ao ar livre que não envolva contacto físico, desde que no respeito de regras de higiene e sanitárias.

Assim, a prática de atividade física e desportiva em contexto não competitivo e ao ar livre pode ser realizada, desde que se verifique um distanciamento mínimo de dois metros entre cidadãos, para atividades que se realizem lado a lado, ou de quatro metros, para atividades em fila.

Ao ar livre, é permitido o exercício de atividade física e desportiva até cinco praticantes com enquadramento de um técnico, ou a prática de atividade física e desportiva recreacional até dois praticantes.

Mas nem tudo é como antes: há agora o impedimento de partilha de materiais e equipamentos e não é possível aceder a balneários.

Não há, até ao momento, data para a reabertura dos ginásios, mas tudo aponta para 1 de junho.

Nos espetáculos e festivais a paragem foi "absoluta". Agora, "é preciso voltar a sentir a energia dos artistas ao vivo"

Sandra Faria representa a Associação de Promotores e Espetáculos, Festivais e Eventos (APEFE). Ao SAPO24, começa por explicar que, em todo o processo neste tempo de pandemia, "desde o primeiro momento, a Associação tem tido diálogo com o Governo, com várias entidades envolvidas e com os associados, com vista a avaliar o problema e encontrar soluções para o setor".

Depois, contextualiza com aquilo que já se sabe: "a questão dos festivais, no fundo, já está resolvida". Disse-o antes da aprovação, em sede de comissão parlamentar, da proposta de lei do Governo sobre a proibição, até 30 de setembro.

Contudo, vai mais a fundo e explica como tudo se passou — deitando por terra algumas notícias que tinham saído. Porque, até haver uma decisão sobre um tema que mexe com milhares de pessoas, muitos passos são dados.

"Um grupo de promotores de festivais e a APEFE foram ouvidos anteriormente à proposta de lei pelo Governo. Ao contrário daquilo que saiu nas notícias, fora do contexto, não foram os promotores que pediram para existir a proibição dos festivais. O que foi pedido foi que houvesse uma decisão: se o Governo não deixa fazer os festivais como eles são, com as características que têm, então que existisse uma decisão para se saber como iam ser", começa por referir.

Afinal, não é só estalar os dedos. "Um festival não se organiza de um dia para o outro e há sempre um trabalho grande, de meses, principalmente se tiver artistas internacionais. Sabemos que o festival, como todos nós o conhecemos, com multiartistas, com vários palcos, este ano não pode acontecer", diz Sandra.

As salas de espetáculo e a necessidade de repensar o dia-a-dia

No que diz respeito aos espetáculos ainda não é claro o que vai acontecer. "Estamos a aguardar a todo o momento que saiam as medidas para as reaberturas das salas, sejam recintos abertos ou fechados com lugares marcados sentados", refere.

Nesse sentido, a APEFE apresentou, a pedido do Governo, uma proposta de guia de boas práticas para a abertura das salas. Mas não ficou por aí. "Entretanto também recebemos, da parte do Ministério da Cultura, uma proposta de guia da parte deles. Já entregámos os nossos comentários a essa proposta, juntamente com o nosso guia. O que esperamos é que possam ser comunicadas as várias fases", aponta.

Mas o que são estas várias fases? "Todos nós sabemos que este surto tem várias fases. O próprio Governo avalia de 15 em 15 dias a situação, com a DGS e, por isso, é preciso pensar que as medidas que vão tomar da primeira quinzena de junho — porque as salas podem abrir no dia 1 — talvez vão ser diferentes das medidas em julho e em agosto. Tem de se ter em conta esta evolução".

No fim de todas as negociações, "é importante que o público e os artistas voltem às salas com a máxima segurança". Contudo, a situação pode não ser fácil.

"Se as salas abrirem só com 1/3 da lotação, para a maioria das salas privadas é incomportável fazer espetáculos nessas condições, porque não conseguem viabilizar e abrir. Mas se tivermos uma luz ao fundo do túnel a dizer que os primeiros 15 dias são assim e, depois, aumentamos para metade ou 2/3, até à lotação completa, isso é completamente diferente. É por isso que defendemos a criação destas fases", justifica Sandra.

Muda-se a forma de trabalhar, mas confia-se no regresso

Todavia, os impactos não se fazem sentir apenas ao nível da Associação. A nível pessoal, no trabalho de cada um, também tudo é diferente. Sandra também o sente na pele.

"Eu tinha dois espetáculos em Lisboa e uns a correr pelo país, mais a tournée internacional do Salvador Sobral. É uma paragem absoluta, passámos a uma atividade zero. É muito frustrante vermos uma equipa toda parada: artistas, técnicos, autores", lamenta.

"Os promotores são os primeiros da cadeia, não é? Quando promovemos um espetáculo, a partir daí há uma série de pessoas que trabalham connosco, e de repente, ninguém trabalha. São milhares de pessoas. Atrás de cada artista há os invisíveis dos bastidores, que são muitos. São muitas famílias. Tudo isto é muito preocupante, há pessoas a passarem sérias dificuldades", atira.

"No caso dos meus trabalhadores, tive de recorrer ao lay-off. Se as salas abrirem com 1/3 da lotação, eu não poderei trabalhar e então não poderei fazer nada. É uma situação muito complicada, nunca vivida", frisa.

Contudo, há algum otimismo — e a certeza do que é preciso fazer. "Precisamos todos uns dos outros e que as pessoas regressem aos espetáculos e às salas, porque a cultura também é um bem essencial", garante a promotora.

Nestes tempos de pandemia, apesar de todas as adaptações, o trabalho não fica parado. Há, aliás, muita coisa a fazer e a pensar. Sandra conta que, na APEFE, os cinco membros da direção se reunem diariamente, por vezes mais do que uma vez.

"Se tivermos acesso a alguma informação que saiu, se for necessário alguma resposta mais rápida, voltamos a reunir. Tem sido um trabalho muito intenso. Também reunimos com os nossos associados, estamos a criar uma proposta de medidas, não só para fazer face ao problema, mas para organizar tudo para quando isto passar. Já estamos a trabalhar sobre o que queremos num futuro próximo. Têm sido dias intensos, apesar de não desenvolvermos a nossa atividade e não estarmos a trabalhar em espetáculos ao vivo", confidencia.

Nesta dinâmica, é impossível não pensar no que aí vem. Trabalha-se já de olhos postos no dia em que a normalidade possa regressar. "Eu gosto muito de ouvir o Dr. Pedro Simas [virologista] a falar, tem falado muito bem e acho que nós temos de voltar à vida. Temos de voltar às nossas vidas normais, com alertas, com cuidados", atira.

E, para isso, é preciso trabalhar: abrir salas, fazer espetáculos, divulgar.  Mas não terá o público receio em voltar à normalidade? A promotora não hesita na resposta. "O público vai ter confiança para voltar, mas precisa que seja tudo bem comunicado. Se a mensagem for a do medo, as pessoas vão ter receio de sair. Temos de combater essa mensagem com outras, como: 'as pessoas vão estar em segurança, há boas medidas sanitárias para as salas, com todos os cuidados a ter e, portanto, será muito seguro ir ver um espetáculo'. Precisamos todos de ir ver espetáculos, de rir, de chorar, de nos emocionarmos. Aliás, temos feito isso à distância, pelas redes sociais, pela televisão. Agora, é preciso voltar a sentir a energia dos artistas ao vivo", remata.

Os apoios à Cultura

O primeiro-ministro, António Costa, anunciou já o lançamento de uma linha de financiamento de 30 milhões de euros para ser usada pelos municípios na programação cultural.

Essa linha é "um programa de financiamento de 30 milhões de euros aos municípios para poderem organizar um conjunto de atividades que permitam a um dos setores mais duramente atingidos por esta crise [provocada pela pandemia da covid-19] encontrar um espaço de reanimação", afirmou António Costa.

António Costa realçou que esta linha "é fundamental para o setor da cultura", frisando que "os municípios são dos maiores investidores de cultura no país", passando agora a dispor "de condições" para organizar eventos durante o verão.

"Neste verão, não é possível realizar festivais, mas é possível realizar em segurança espetáculos de música, por exemplo, quer ao ar livre quer em espaço coberto", vincou, referindo ainda que na reunião discutiu-se também como se pode acelerar a execução de 1500 milhões de euros de fundos comunitários por executar e como aplicar 300 milhões de euros que "é possível obter do quadro da reprogramação dos fundos comunitários já existentes". Os municípios, salientou o líder do Governo, "são os agentes do Estado com melhores condições para realizar investimentos de maior proximidade que dinamizam a economia local e com maior eficiência".

O anúncio do primeiro-ministro surgiu um dia após a vigília 'Cultura e Artes', que decorreu em várias cidades portuguesas, em que profissionais do setor criticaram as medidas de apoio do Governo para esta área.

Restauração. "A nossa preocupação é que daqui a um ano cá estejamos todos"

Daniel Serra, presidente da associação nacional de restaurantes PRO.VAR, refere ao SAPO24 que o caminho até à reabertura dos restaurantes, que aconteceu a 18 de maio, foi feito de muita negociação e ideias em cima da mesa — mesmo antes de tudo começar.

"Logo no momento em que a questão se agudizou com a covid-19 e, ao vermos uma perda significativa da faturação nos restaurantes, os associados da PRO.VAR juntaram-se e procuraram saber se havia alguma resposta para o estava para acontecer. Estamos aqui a falar nos finais de fevereiro, inícios de março, num tempo em que a covid-19 ainda estava a dar os primeiros passos", começa por referir.

"Antes de a pandemia chegar cá já tinha impacto na economia, porque os turistas já estavam a deixar de vir, já se notava um decréscimo significativo. Março já foi catastrófico, ainda antes do encerramento forçado", recorda.

Por isso, era preciso agir. A primeira medida, conta, foi reunir com os empresários — cerca de 40, que representam mais de 2.500 trabalhadores — e fazer uma carta aberta ao primeiro-ministro pedindo o encerramento dos restaurantes — tudo ainda antes de se anunciar que era preciso fechar portas.

"A partir daí pedimos várias reuniões, onde lançámos várias propostas ao Governo, para serem discutidas. Entretanto deu-se o encerramento e as primeiras medidas foram avançadas. Nos telefonemas que fizemos com alguns secretários de Estado, do Turismo ao Comércio, fomos recebendo uma abertura muito grande para sermos ouvidos, apresentando medidas para a proteção das empresas", diz o presidente da PRO.VAR.

Para Daniel, a possibilidade de serem ouvidos permitiu acelerar o processo. "Era uma forma de se conseguir, sem correr tantos riscos, reconhecer soluções para o setor. Reconhecemos que o Governo foi inteligente, por procurar estar muito próximo das associações setoriais. Elas, mais do que ninguém, conhecem realmente a realidade. Desta forma conseguiram, de certo modo, implementar medidas eficientes".

Além disso, mantém-se a esperança no regresso da normalidade quase na sua totalidade. "Nós, portugueses, somos muito bons a cumprir mas também na adaptação. Somos um exemplo a seguir. E tenho a espetativa de que, daqui a um mês, quando abrirem as fronteiras de Espanha, sejamos invadidos, no bom sentido, pelos espanhóis, que olham para nós como um país exemplo. Eu acredito na recuperação", afirma convicto.

Contudo, as medidas "não foram totalmente eficazes porque há sempre a questão da burocracia, dos vícios do sistema, tanto a nível político como bancário", refere, reconhecendo no entanto que "há uma grande interligação" entre o Governo e as associações, "apesar de também ter havido contestação pela demora das regras na totalidade", atira. "Há males que vêm por bem".

Diferente, mas com sentido

No fim de tudo, a análise é positiva quanto à implementação das regras. "A DGS teve bom senso e apresentou uma séria de recomendações que foram sempre no sentido de manter a segurança", afirma Daniel.

Mesmo assim, apesar de tudo o que ficou definido, alguns restaurantes optaram por não abrir. O presidente da associação não estranha a decisão. "Como costumo dizer, não há uma segunda oportunidade para causar uma boa impressão. Estamos a falar de uma questão muito sensível, na reabertura há que ter todo o cuidado. Também há casos em que ficaram fechados para ver o que isto ia dar, era mais para observar, para poder estar preparado e ver as falhas", aponta.

Para quem já abriu portas, a aventura é constante. Muita coisa mudou, é preciso ter atenção redobrada. "Claro que existem algumas distrações quanto aos próprios trabalhadores e clientes, é tudo novo", diz Daniel. "Há quem entre sem máscara, depois metem máscara, pedem desculpa. Entretanto o funcionário também se esquece do cinzeiro na mesa, que não deve ter. De repente há restaurantes que têm toalhas nas mesas que devem ser só decorativas, mas que devem ser depois substituídas, quando vem o cliente, por toalhas higienizadas. Há aqui todo um trabalho que estamos todos a fazer".

Todavia, ainda há poucas pessoas nas ruas. A esperança é a vinda do bom tempo e a passagem da palavra. É preciso que uns arrisquem para que os outros ouçam os testemunhos e percebam que é seguro voltar aos restaurantes.

"Quem tem a experiência acaba por sair com outra ideia, pronto a repetir e a aconselhar. É um caminho de confiança que se vai conquistando. A nossa maior incógnita é a questão económica das pessoas, se isso vai afetar muito ou não. Se não afetar, acredito que rapidamente voltamos à normalidade", refere.

Um futuro que ainda se espera

Para Daniel, a nível pessoal, também não estão a ser tempos fáceis. Com dois espaços para gerir, ainda não conseguiu abrir nenhum e tem seis pessoas a trabalhar consigo. "São ambos em espaços comerciais e negócios de Wine Bar, são experiências de consumo no local", explica.

Mas "isto vai passar", acredita. É essa a mensagem que transmite a quem trabalha consigo e a todos os empresários da restauração, e respetivos trabalhadores.

"A nossa preocupação é que daqui a um ano cá estejamos todos. Não quero que ninguém fique de fora, muito menos os mais frágeis. E aqui, na PRO.VAR, tanto defendemos o micro-restaurante como o que tem uma Estrela Michelin", garante Daniel.

Com os olhos postos no futuro mas com noção dos constrangimentos, o presidente da associação nacional de restaurantes tem ainda várias medidas que gostaria de ver implementadas. E, para isso, é necessários que as conversações com o Governo não tenham já um fim.

"As consequências de todas estas regras, embora sejam necessárias para garantir a saúde dos clientes e dos trabalhadores, vão inviabilizar os restaurantes. Por isso, apresentámos um conjunto de contrapartidas ao Governo, no sentido de salvaguardar o interesse das empresas nos próximos tempos, permitindo que elas sobrevivam e que os trabalhadores não sejam mandados para o desemprego", começa por referir.

Mas as conversas não ficam apenas pelas máximas entidades: é preciso descer à realidade de cada local. Neste sentido, a PRO.VAR contactou as 308 câmaras municipais do país e pediu a cada uma delas que fizesse "das suas ruas o palco dos restaurantes, que isentasse a taxa de esplanadas, e possibilitasse o seu alargamento". E, neste momento, já se verificam  acordos com cerca de 90% dessas câmaras.

"Estamos a tentar que as câmaras possam pôr a economia a funcionar localmente. E posso avançar aqui com uma medida: estamos a pedir a subscrição de um manifesto, com várias propostas para os estabelecimentos comerciais. Por isso, o Governo vai receber 308 manifestos, com uma linha de pensamento comum, incluindo a questão da redução do IVA, e outras coisas que façam sentido em cada caso. O Governo, começando a receber os manifestos, vai ter de fazer alguma coisa. Isto dá-nos mais força", explica.

No fim, a conclusão é só uma: em dois meses e meio aprende-se muito e valoriza-se ainda mais. "No tempo em que a restauração esteve fechada deu para as pessoas valorizarem o setor e a sua importância na economia. A retoma prevê-se lenta mas aquilo que passamos é que temos de cumprir com as regras, com a exigência, e vamos dar confiança máxima aos clientes. Temos de nos ajudar uns aos outros para ultrapassar este momento difícil", remata.

O que já foi definido para o setor da restauração

Os restaurantes, cafés e pastelarias, que até aqui podiam funcionar apenas em ‘take-away’ ou com entregas, reabriram portas a 18 de maio, podendo servir os clientes no interior dos espaços, com normas de segurança e lotação máxima reduzida a metade.

De acordo com o Plano de Desconfinamento, aprovado em Conselho de Ministros, restaurantes, cafés, pastelarias, assim como lojas com porta aberta para a rua até 400 metros quadrados, salvo exceções definidas pelas autarquias, podem voltar a receber clientes no interior dos espaços.

Também os estabelecimentos turísticos e o alojamento local voltam a poder disponibilizar os seus serviços de bebidas e restauração para o exterior e não apenas para os seus clientes, como até aqui acontecia.

No entanto, a lotação dos estabelecimentos de restauração está agora limitada a metade, devendo ainda ser promovida a ocupação de esplanadas.

Por outro lado, têm que ser cumpridas as normas de higiene e segurança, que foram acordadas entre a Direção-Geral da Saúde e a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP).

As medidas que entram agora em funcionamento têm sido contestadas pelo setor, nomeadamente, no que toca à limitação da capacidade, o que já levou, pelo menos, 20% dos estabelecimentos a avisarem não ter condições para abrir, segundo os dados da AHRESP.

Cabeleireiros. "Estar parado foi um abalo, foi ir às contas pessoais para tentar que os colaboradores tivessem as suas contas em dia"

Miguel Garcia, presidente da Associação Portuguesa de Barbeiros, Cabeleireiros e Institutos de Beleza, conta ao SAPO24 como tem sido todo o processo, da negociação com o Governo até à reabertura dos espaços.

"Antes de tudo, o nosso primeiro passo foi a construção de um compromisso do setor. Aquelas normas que enviámos para a ASAE, para a ACT e para a DGS, e que foram muito elogiadas e aceites", começa por explicar. "Depois disso, e de ser tudo divulgado, tivemos autorização para abrir no dia 4 de maio, com toda a segurança", refere.

Contudo, ao contrário do que se podia esperar, voltar ao trabalho não foi assim tão diferente — e não há que ter receios. "As pessoas viram que é seguro; vejo pelas minhas clientes. Mas mesmo antes desta pandemia, já tínhamos uma série de cuidados e estávamos habituados a trabalhar com luvas ou com máscara. Agora, foi só uma questão de cuidados acrescidos", reflete Miguel.

O regresso e os impactos da paragem

A reabertura dos cabeleireiros era algo bastante esperado, o que se refletiu nas marcações. "Na primeira semana, semana e meia, tivemos uma grande afluência. Havia muita gente a necessitar de retoques no cabelo, de fazer os crescimentos da cor, as nuances, dar algum brilho no cabelo", conta.

Mas o mesmo ritmo não acompanhou a segunda fase de desconfinamento, muito mais "lenta". "Esperamos que, a partir do início de junho, com a abertura dos centros comerciais e com a função pública já em pleno, se comece a trabalhar mais", anseia Miguel Garcia.

E mais trabalho pode significar uma melhoria daquilo que ainda falta resolver: a crise que se faz sentir. Miguel Garcia dá o seu exemplo pessoal que, diz, é um ponto de partida para o que se passa um pouco por todo o setor.

"Estar parado foi um abalo, foi ir às contas pessoais para tentar que os colaboradores tivessem as suas contas em dia. Tenho dois salões, num deles já está resolvida a situação de lay-off, mas no outro ainda não recebi nada. Vai ser complicado pagar os vencimentos no final de maio, mas quem trabalha não pode ficar sem receber", salienta.

"Estamos preocupados com o presente e com o futuro. Porque temos plena noção, cada vez mais, de que isto não se vai resolver até ao final de junho. E em julho, agosto e setembro não sabemos como vai ser. A economia está a arrancar muito lentamente", reflete o presidente da associação. Por isso, defende, é preciso continuar com as conversações com o Governo. Associação propõe, para já, a prorrogação por mais seis meses, "no mínimo", do lay-off.

O que foi definido para a abertura

Os cabeleireiros, barbeiros e institutos de beleza têm de ter um plano de contingência para a covid-19, devem recusar a entrada de clientes que apresentem “sintomas compatíveis” com a doença e trabalhar apenas por marcação para garantir um menor número de pessoas dentro das instalações e cumprir um distanciamento de dois metros entre elas.

Se existirem clientes em espera, estes devem aguardar fora do estabelecimento, com uma distância mínima de dois metros entre si, segundo o documento-o, divulgado hoje.

Devem ser criados horários de trabalho diferenciados, para “reduzir o número de trabalhadores em simultâneo no estabelecimento”, e manter a porta aberta para minimizar o toque no puxador. Em caso de não ser possível, deve higienizar-se o manípulo após a sua utilização.

À entrada do estabelecimento, deve haver gel e álcool e “incentivar o seu uso” através de pósteres disponíveis no site da DGS.

Os cumprimentos devem ser apenas por “aceno de cabeça ou verbalmente” e cabe ao cliente colocar os seus haveres no bengaleiro, não devendo este levar sacos de compras para o interior do espaço.

Deve ser pedido ao cliente que cumpra “a etiqueta respiratória” quando tossir ou espirrar e deve ser afixado nas casas de banho o folheto da DGS sobre a lavagem correta das mãos.

Também não pode ser oferecida comida, nem café, chá ou outra bebida e não devem existir revistas, tablet, informações escritas, etc.

Os funcionários devem usar máscara cirúrgica, óculos de proteção, ou de preferência viseiras, e o calçado e roupa são de uso exclusivo, lavada diariamente e “quando possível trocada entre clientes ou descartável”.

Devem lavar ou desinfetar frequentemente as mãos entre clientes, depois de tocar em dinheiro/cartões de crédito, entre outras situações, e não devem usar adornos.