Antes de ter início o diálogo consultivo da Comissão Europeia com o Parlamento Europeu (o chamado ‘diálogo estruturado’) sobre a suspensão de fundos a Portugal e Espanha, o ministro das Finanças dirigiu uma carta aos eurodeputados envolvidos no debate e, recordando que Comissão e Conselho decidiram cancelar a multa, defende que “há ainda motivos mais fortes para decidir não aplicar quaisquer sanções agora”.

“Seria contraditório com a argumentação para o cancelamento da multa e difícil de compreender para os cidadãos europeus”, escreve Centeno, numa carta dirigida aos presidentes das comissões parlamentares competentes, – Iskra Mihaylova (Desenvolvimento Regional), e Roberto Gualtieri (Assuntos Económicos e Monetários) –, eurodeputados que as integram, bem como para os presidentes das comissões parlamentares de Agricultura, do Orçamento, de Emprego e de Pescas, à qual a Lusa teve acesso.

Na carta, a que a TSF já divulgou, com a data de 14 de setembro, mas que só agora chegou aos deputados, o ministro começa por indicar que, ao decidirem, em finais de julho e início de agosto passados, o cancelamento da multa, a Comissão e o Conselho reconheceram que “Portugal sujeitou-se a um esforço de consolidação orçamental substancial e implementou um conjunto muito alargado de reformas estruturais”.

A Comissão e o Conselho, prossegue, reconheceram também que “o Governo português comprometeu-se a cumprir as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento e a proceder à implementação de mais reformas estruturais, tal como consagrado no Programa Nacional de Reformas”, e tiveram também em conta que “o ambiente económico europeu e internacional apresenta incertezas crescentes, recentemente agravadas pelo referendo britânico”.

“A Comissão e o Conselho, por decisão unânime, chegaram à conclusão de que estas e outras razões relevantes eram suficientemente fortes para não aplicar sanções a Portugal. Todas estas razões mantêm-se e continuam absolutamente válidas para o presente procedimento, desencadeado pela mesma situação”, ou seja, a ausência de ação efetiva para reduzir o défice entre 2013 e 2015, argumenta o ministro.

Mário Centeno observa então que, “na verdade, uma vez que a multa teria consequências menos danosas que qualquer suspensão de fundos estruturais e de investimento europeus, há ainda motivos mais fortes para não aplicar sanções agora”.

Entre outros argumentos, o Governo português lembra que, ao tomar uma decisão, a Comissão “deverá também ter em conta a situação económica e social dos países, sendo que Portugal continua com uma taxa de desemprego acima da média europeia, assim como o impacto na economia”, que, assinala o ministro, seria “forte”, pois “afetaria a confiança e os planos de investimento, muitos dos quais dependentes dos fundos comunitários”.

De acordo com o governante, a possível suspensão de fundos da UE, ainda que apenas dos compromissos — a Comissão já indicou que uma suspensão só afetaria fundos no futuro, e não dos pagamentos de fundos já atribuídos -, e mesmo que temporária, “iria minar os esforços em curso com vista a trazer crescimento sustentável e coesão social a Portugal, e melhorar a convergência com os parceiros europeus”.

Por outro lado, prossegue, iria “dificultar a capacidade de implementação do Programa Nacional de Reformas”, que a própria Comissão Europeia já classificou de “sólido”, bem como o cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento, numa altura em que o Governo está a implementar as medidas necessárias para alcançar um défice de 2,5% do PIB em 2016, e assim retirar o país do procedimento por défice excessivo.

Desse modo, argumenta, a suspensão de fundos “seria não só injusta e contraproducente, como iria contra os regulamentos”.

A terminar, Mário Centeno aponta então que “evitar a suspensão dos fundos estruturais e de investimento europeus não só está em linha com as regras e os princípios do regulamento, como constitui a única solução justa e inteligente para a presente situação”.

“Como tal, o Parlamento Europeu encontra-se numa posição-chave para aconselhar a Comissão a propor a não imposição de qualquer suspensão de fundos”, termina.

No quadro do processo de sanções lançado contra os dois Estados-membros no âmbito do Procedimento por Défice Excessivo, a Comissão acabou por recomendar, a 27 de julho passado, a suspensão de multas a Portugal e Espanha — decisão confirmada a 08 agosto pelo Conselho Ecofin (ministros das Finanças dos 28) -, mas segue o processo de congelamento parcial de fundos, incontornável por ser automático.