Na apresentação de uma investigação conjunta com o Organized Crime and Corruption Reporting Project (OCCRP), em Bruxelas, o diretor estratégico da Transparência Internacional, Casey Kelso, apontou Portugal e Hungria como exemplos de países comunitários que não têm sido “suficientemente rigorosos” no cumprimento das diligências instituídas para a atribuição de ‘vistos gold’.
“Em Portugal, não há diligências suficientes para verificar a proveniência da riqueza dos aplicantes”, sublinhou, indicando que basta a apresentação de um registo criminal.
Para corroborar a sua afirmação, o diretor estratégico da Transparência Internacional, que referiu que Portugal é um caso de estudo de como estes programas podem corromper um Governo, indicou o caso do ex-ministro da Administração Interna Miguel Macedo, que está a ser julgado no âmbito do processo em que se investiga a atribuição de ‘vistos gold’ a cidadãos estrangeiros.
“O julgamento que está a decorrer em Portugal é paradigmático [dos perigos dos ‘vistos gold’]. Há 11 pessoas que exerciam cargos públicos que estão a ser julgadas”, reforçou a responsável estratégica para a União Europeia (UE) da organização não-governamental Global Witness.
Rachel Owens elogiou a eurodeputada socialista Ana Gomes, que definiu como uma “campeã na luta contra os vistos gold”, e lembrou que uma vez que alguém obtém a cidadania portuguesa pode circular livremente na UE.
No caso português, a investigação destaca a aquisição de ‘vistos gold’ por parte de membros da “classe dirigente” de Angola, através da compra de propriedades em território nacional.
“Não sabemos quanto está a ser investido no imobiliário, porque é um setor tão opaco que simplesmente não conseguimos obter os dados”, reconheceu Casey Kelso, argumentando que os preços “excessivos” da habitação registados neste momento em Lisboa são uma consequência do programa.
Segundo dados publicados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, entre 08 de outubro de 2012, data de lançamento do programa, e 31 de janeiro de 2018, os ‘vistos gold’ representaram um investimento de 3,5 mil milhões de euros, dos quais 3,1 mil milhões resultantes do setor imobiliário.
O diretor da Transparência Internacional, Carl Dolan, assumiu “uma preocupação crescente” relativamente ao que estes esquemas representam para a integridade do Espaço Schengen. “Estas pessoas estão a comprar o acesso à cidadania comunitária e à UE”, completou.
A investigação concluiu que os programas dos ‘vistos gold’ são vulneráveis a abusos e minam a luta contra a corrupção na UE e nos países vizinhos, devido, entre outras coisas, à ausência de um escrutínio rigoroso à origem da riqueza dos beneficiários dos ‘vistos gold’, e à opacidade quanto à identidade dos beneficiários.
“[Os ‘vistos gold’] são irresistíveis para países pequenos, que tem alguns problemas económicos. Os governos tendem a manter o anonimato destas pessoas, que não querem ser expostas. O dinheiro é a base de tudo”, reconheceu Jody McPhillips, do OCCRP, que sublinhou que este é um negócio de milhares de milhões de euros para os Estados.
Os resultados da investigação, que decorreu nos últimos seis meses, e que incidiu sobre os programas de oito Estados-Membros – Portugal, Áustria, Bulgária, Chipre, Hungria, Letónia, Lituânia e Malta –, e de Arménia e Montenegro, serão apresentados esta tarde junto de entidades comunitárias.
“Vamos expor estes esquemas representam um risco para a integridade europeia e para os valores comunitários. A Comissão Europeia tem um papel crucial a desempenhar para proteger os seus cidadãos de esquemas de corrupção. Este estudo apresenta sugestões sobre as diligências que a União Europeia pode tomar para evitar que isto aconteça”, explicou Rachel Owens.
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