O livro, que recebeu o Prémio Miguel Torga, atribuído pela Câmara de Coimbra, foi hoje lançado durante o congresso internacional "Língua Portuguesa: Uma Língua de Futuro", no Convento de São Francisco, em Coimbra.
O narrador do romance é um condenado à morte, que tem como último desejo contar uma história sobre Língua, um escravo que, a partir de Cabo Verde, seguia a bordo das naus portuguesas para servir como intérprete dos navios de brancos para a compra de negros.
Este narrador, tal como Xerazade em "Mil e Uma Noites", conta histórias para adiar a sua morte, abordando no livro o colonialismo, a abolição da escravatura, a guerra da independência, a independência, a ocupação, o capitalismo, o imperialismo e o comunismo.
"É um romance fascinante", que mostra "como contar histórias pode ser a forma suprema de comunicar entre comunidades e gerações", disse a editora de Mário Lúcio, Maria do Rosário Pedreira.
Durante o lançamento, Mário Lúcio sublinhou que o narrador, ao contar histórias durante anos na falésia onde seria seu destino morrer, acaba por "fazer renascer toda uma vida num lugar".
O escritor falou pouco da obra no lançamento, por já não se lembrar "absolutamente de nada" do livro. No entanto, sublinha que está presente neste romance a importância de se comunicar "o sonho de transformar o mundo".
Já um dos membros do júri do Prémio Miguel Torga, António Vilhena, curador da Casa da Escrita, em Coimbra, salientou que as "muitas histórias" do escravo Língua servem "como respiração para que [o narrador] afugente a morte".
Ao contar as histórias, o narrador "pode olhar da falésia sem ameaça nem constrangimento", apontou.
A vice-reitora da Universidade de Coimbra Clara Almeida Santos encontrou no livro o cruzamento entre "o onírico e o real" e em que "ter língua e ser Língua se misturam".
"Biografia do Língua" é uma metáfora das histórias redentoras, das narrativas que salvam de quase tudo e do livro da morte matada", frisou Clara Almeida Santos.
A obra, agora editada pela Dom Quixote, venceu a edição deste ano do Prémio Miguel Torga, tendo na altura Mário Lúcio Sousa dedicado o galardão aos escritores e ao povo do seu país.
Esta é a primeira vez que o Prémio Miguel Torga, ganho até agora por portugueses, é concedido a um autor oriundo de outro país de língua oficial portuguesa.
Mário Lúcio Sousa vai doar os cinco mil euros da distinção às obras de reabilitação do Campo do Tarrafal, considerando que este é "o único património comum entre Portugal e Cabo Verde", onde "portugueses e cabo-verdianos sofreram juntos".
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