Adorava começar esta crónica da mesma forma que os youtubers começam os vídeos. Mas receio que tivesse de escrever com tantos erros ortográficos e jargão millennial que o corrector automático me abandonaria o computador e ia antes procurar um pergaminho onde se pudesse alojar, bem longe, para não ter de assistir ao genocídio da língua portuguesa. Além do óbvio e doloroso risco que correria de me assemelhar àqueles adultos que tentam “falar à jovem” para parecerem super cool, sendo que, quando o fazem, deixam um ambiente tão constrangedor no ar que a Greta já está a pensar incluir este fenómeno nos seus discursos como uma grande causa de poluição atmosférica.
Mais uma semana, mais uma história do mundo da internet que põe os youtubers na berlinda. Desta vez não é um senhor de 37 anos – de barba estilizada e boné para trás - que anda a dar beijos na boca a infantes. Claro que há quem, como eu, continue angustiantemente chocado com esse caso. É-me demasiado complicado interiorizar que alguém daquela idade ainda use boné para trás e tenha coragem para usar aquela barba que parece um carreirinho de formigas fãs de tunning.
Não é agora o caso. Por ora, o YouTube inundou-se das lágrimas de muitos youtubers depois de a plataforma apagar alguns dos seus vídeos por promoverem sites ilegais de apostas. É nestas alturas que nos faz falta o Artur Albarrán. O drama, a tragédia, o horror. O politicamente correcto está mesmo a destruir o mundo como o conhecemos e agora já nem se pode incentivar crianças a gastar o dinheiro dos pais em Black Jack, charutos e bourbon. Absurdo. Eu que andava aqui mortinho para ter filhos só para os levar a casas de strip e casinos a partir dos 2 anos e meio, e fazem esta desfeita ao mundo.
Urge, no entanto, perceber de onde vem toda esta tristeza dos youtubers por já não conseguirem ganhar dinheiro com estes vídeos (respirem, relaxem, eles continuam a ter um bom pé-de-meia), seja por serem directamente patrocinados ou pela monetização dos vídeos.
A adoração ao Santo Dinheiro, padroeiro da opulência, espírito santo do capitalismo e a mais bonita manifestação do poder cegamente vazio.
Não raras vezes podemos ver estes youtubers a fazer vídeos sobre as suas mansões, os carros de centenas de milhares de euros e, naquele que foi o exemplo que me deixou mais triste, a sua colecção de ténis que lhe custou até agora 10 mil euros. Ia chorando. Como é que alguém pode ser realmente feliz se ainda só gastou 10 mil euros em ténis? É isto que queremos ensinar aos milhares de miúdos que vêem estes vídeos? E onde é que que está a ambição? Não queremos ir mais longe? Como é que se pode sentir amado e respeitado se só tem 170 pares de ténis? Agora, por acaso, ia dizer que também é preciso investir em meias, mas acabei de me lembrar que um deles ostenta orgulhosamente as suas meias Gucci que lhe custaram 200 euros.
Faz falta doutrinar mais os nossos jovens para a assimilação de que o dinheiro é tudo na vida e de que nunca é suficiente. Mas atenção que esta doutrinação não pode ser feita com livros. Primeiro, porque o dinheiro que se gasta num livro é muito mais bem empregue num pano de cozinha da Armani, por exemplo. E depois, porque se corre o risco de os miúdos apanharem um livro que lhes diga que é possível ter uma vida completamente preenchida sem a acumulação de bens materiais inúteis, e ainda damos por nós a perguntar às crianças o que é que eles querem ser quando forem grandes, e a ouvir respostas como médico, professor ou músico em vez de youtuber.
Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:
- Extremamente Desagradável: A rubrica da Joana Marques na RR (também em podcast) tem muita graça, e até foi ela a culpada por ter chegado a alguns vídeos de youtubers.
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