Depois de uma experiência traumática, como é o caso da violência sexual, a vítima passa a experienciar o mundo de outra forma. O trauma abala a sua sensação de segurança e de risco, e a vítima pode passar a viver num estado de constante alerta (hipervigilância). Mesmo em situações onde não haja perigo real, a pessoa traumatizada pode sentir-se insegura, sendo incapaz de conseguir descontrair. 

Tarefas que anteriormente eram inofensivas e parte do quotidiano como, por exemplo, sair à rua, podem passar a representar obstáculos aterradores. Para algumas pessoas, isolar-se e não sair de casa pode ser uma estratégia de sobrevivência. No entanto, até mesmo o seu lar, um espaço que se espera seguro e protegido, pode apresentar desafios. Dormir pode ser impossível, uma vez que aumenta a sensação de vulnerabilidade das vítimas. Por outro lado, as pessoas traumatizadas podem experienciar pesadelos relativos ao acontecimento traumático, enquanto que um som inesperado à noite pode deixar a pessoa exaltada sem conseguir regular a excitação que daí resulta. 

Associações de apoio especializado à vítima de violência sexual:

Quebrar o Silêncio (apoio para homens e rapazes vítimas de abusos sexuais)
910 846 589
apoio@quebrarosilencio.pt

Associação de Mulheres Contra a Violência - AMCV
213 802 165
ca@amcv.org.pt

Emancipação, Igualdade e Recuperação - EIR UMAR
914 736 078
eir.centro@gmail.com

Para alguém que foi vítima de violência sexual, o mundo muda e pode parecer que o perigo está em todo o lado, mesmo que o perigo seja invisível e inexistente. Perante esta nova realidade, como podemos esperar que a pessoa vitimada retome a sua vida depois do trauma?

Ultrapassar o trauma e voltar a viver

Comecemos pelo mais importante: é possível ultrapassar o impacto traumático da violência sexual. No entanto, ainda subsiste a crença errada de que estas experiências marcam as vítimas para a vida, sem que haja qualquer esperança de voltarem a ter uma vida normal. Todavia, isto não corresponde inteiramente à verdade. As vítimas podem retomar uma vida que seja livre do trauma experienciado.

Na Quebrar o Silêncio, é comum que os homens sobreviventes de violência sexual se questionem sobre se valerá a pena procurar apoio e remexer no passado, particularmente quando o abuso ocorreu na infância. Depois de passar anos ou mesmo décadas em silêncio, é comum que um sobrevivente hesite em procurar apoio. Não é fácil começar o processo de recuperação do trauma, porque o mesmo implica abordar questões difíceis e dolorosas. No entanto, é igualmente importante clarificar que com ajuda especializada é possível retomar o controlo da vida e viver de forma descontraída e em segurança. O trauma experienciado não tem de ser uma sentença para vida que é irreparável. Antes pelo contrário.

Uma das questões centrais do trauma é que mesmo que tenha acontecido há décadas continua a estar presente na vida das vítimas. As suas consequências e impacto fazem-se sentir no presente, mesmo que, por vezes, os sobreviventes não tenham essa consciência. O trauma afeta a relação consigo próprio e com os outros, a auto-estima e a assertividade, ou ainda a vida profissional e amorosa. Estas são algumas das muitas consequências experienciadas pelas vítimas. 

Procurar ajuda e iniciar o processo de recuperação é uma forma de conseguir retomar o controlo da vida para que esta deixe de ser afetada pelo trauma. Exemplo disso, são os testemunhos de homens que terminaram o apoio da Quebrar o Silêncio. Em vários destes relatos, conseguimos ver o estado em que as vítimas estavam antes de procurar ajuda, e a alteração que sentem após terminarem o apoio. Como o António (nome fictício) refere: «Tive várias sessões de apoio psicológico (...), o que me fez tornar uma outra pessoa e me fez compreender que a culpa não foi minha e me tirou toda a raiva que existia dentro de mim. Fico muito grato, jamais imaginei que seria possível. Tenho 67 anos e sinto-me realizado na vida.»

Numa altura que se fala imenso dos abusos sexuais, seja no contexto da igreja ou noutros, é importante transmitirmos uma mensagem de esperança para quem passou por este tipo de experiências. É possível recuperar do trauma do abuso sexual e é possível retomar uma vida descontraída e vivida em segurança.

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