O relatório anual da Amnistia Internacional diz que Portugal está menos mal, mas... a adversativa é tramada. Não vivemos na Síria, é certo, mas continuamos a viver num país com uso excessivo de força policial, com prisões sem condições dignas desse nome a alguns níveis, com tremenda dificuldade em lidar com a população com deficiências variadas e mantemos um nível pobre de acesso aos meios de saúde.

Sim, não somos a Síria e podemos suspirar de alívio mas não podemos encolher os ombros e dizer: ok, menos mal.

Em pleno século XXI já deveríamos ter ultrapassado algumas destas questões, não é verdade? A comparação com outros países pode ser benéfica, contudo é apenas uma forma de maquilhar a realidade.

Diz o ditado que olhos que não vêem, coração que não sofre. Nós vemos todos os dias coisas atrozes e importa resolver sem ficar à espera que alguém o faça por nós.

Diz o relatório anual da Amnistia Internacional que o mundo  - em um ano - tornou-se mais sombrio. Há discursos nacionalistas, racistas, xenófobos, populistas. Líderes a gritar a plenos pulmões que importa devolver a América aos americanos (quem serão esses na verdade?), a Holanda aos holandeses, a França aos franceses e por aí fora.

O mundo encolhe-se em pensamentos de antecipação, cenários de catástrofe e, de repente, parece que estamos de volta ao início dos anos 30 do século passado: estamos na iminência de algo terrível mas não façamos nada, vamos esperar para ver.

O que é que isto tudo tem a ver com os erros portugueses ao nível dos direitos humanos apontados neste relatório? Tudo, basta olhar para o big picture. Os direitos humanos são vastos, estão consagrados há muitos anos numa declaração universal. Em teoria estamos todos em sintonia.

Na prática, estamos todos em guerra, porque a paz e a igualdade ainda não existem, os direitos humanos ficam bem impressos num póster e pouco mais.

Dizem que a História se repete. Não creio que assim seja, creio que os homens é que são, na essência, capazes das mesmas coisas. Nelson Mandela dizia que há coisas impossíveis de acontecer, até ao momento em que acontecem.

Está a acontecer. Continua a acontecer.