As empresas jornalísticas mandam todos os dias repórteres para o lugar da notícia. Cada vez menos para os lugares menos acessíveis mas que mais requerem a presença de um jornalista que nos conte o que lá está a acontecer na vida de pessoas – quase sempre em sofrimento, às vezes a protagonizar histórias extraordinárias de esperança. É sabido que o bom jornalismo tem gastos pesados em dinheiro.

Tantos repórteres, tantos deles mulheres e homens de media portugueses, do Adelino Gomes à Alexandra Lucas Coelho, do Paulo Moura à Cândida Pinto, do José Manuel Rosendo ao Ricardo Alexandre, outros mais, arriscaram a vida para poderem contar-nos com rigor a verdade que viram com os olhos deles em ocasiões de altíssima tensão de conflito em Timor, em Angola, em Gaza, nos Balcãs, no Cáucaso, na Líbia, no Egito, no México e em muitos outros lugares. Há quem como o Rosendo tenha passado pela experiência de ser raptado, há quem tenha estado muitas vezes debaixo de fogo, na linha de mira.

Agora, os media, os portugueses e também os outros, estão a ir menos aos lugares da notícia. Porque ir, apesar de ser essencial para o bom jornalismo, portanto para a democracia, sai caro.

Há, a par dos efeitos da crise económica que baixou drasticamente a receita da publicidade, a crise que resulta do sistema instalado pelas plataformas online, com a Google à cabeça, que vampirizam o trabalho feito pelos repórteres enviados especiais de jornais, rádios e televisões, e que colhem esse benefício de o difundirem sem terem gasto um cêntimo. Como comenta o muito premiado jornalista francês Sammy Ketz, chefe do escritório de reportagem da AFP em Bagdade, “é uma apropriação abusiva, despudorada, do trabalho feito por outros”.

Para que os media possam continuar a mandar repórteres para os lugares onde há história que merece ser contada e que nós devemos conhecer, é preciso mudar drasticamente o sistema. É preciso que os depredadores do trabalho dos outros passem a pagar pelo que usam.

É isto o que o Parlamento Europeu vai discutir e votar esta semana, a questão dos direitos conexos. Os gigantes da internet, sobretudo Google e Facebook têm argumentado com o malefício de a introdução do pagamento de direitos levar ao fim da internet aberta, gratuita para todos.

A resposta a esses gigantes que têm tido lucros colossais só pode ser uma: que passem a pagar eles pelos conteúdos editoriais que até aqui têm usado gratuitamente. E que o façam sem exigirem ao consumidor que seja ele a pagar toda a fatura. O que está em causa é esses gigantes deixarem de ter lucros tão estrondosos, como aconteceu com a Google que fechou as contas do ano passado com o lucro estratosférico de 12,7 mil milhões de dólares.

Naturalmente, o leitor, ouvinte ou espectador, também terá de suportar uma parte do custo, tal como pagamos a compra de um livro ou a ida a um espetáculo. O jornalismo de qualidade tem um custo, vale suportá-lo para receber o valor de estar bem informado.

A votação no Parlamento Europeu sobre os direitos conexos, por si só, não resolve tudo. Mas é um primeiro passo. É por isso que esta quarta-feira é um Dia-D para os direitos de todos nós. Portanto, para a democracia. Aliás, na mesma sessão, os eurodeputados vão também discutir decisões contra as medidas antidemocráticas de controlo dos media adotadas pelo governo de Viktor Orban, na Hungria.

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Uma primeira página escolhida hoje, esta, do Libération. E vale ler o diálogo, com incitamento à resistência, entre Jane Goodall e Edgar Morin.

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