Ontem, naturalmente, não se falou de outra coisa. Hoje, também naturalmente, de pouco mais se falou. É um caso judicial histórico, é um acontecimento democrático de grande importância para o país, é um dos dias mais importantes da vida do João Miguel Tavares e do José Gomes Ferreira.

Sobre o resultado da homilia de Ivo Rosa, a minha competência técnica – vulgo, os meus conhecimentos de Direito – é tão vasta como a grande maioria dos portugueses, o que me permite emitir um qualificado: “isto é tudo uma cambada de gatunos, de ladrões e de chupistas”. E isto foi das coisas que mais me tem impressionado entre ontem e hoje. É que quase toda a gente tem opiniões jurídicas muito sólidas, e há muito mais gente entendida em Direito do que eu pensava. Aliás, dá-me ideia que com este caso o Direito é o novo futebol. O “só sei que nada sei”, do outro Sócrates, é coisa que não se aplica a quase toda a gente, pelos vistos.

Outra das coisas que mais me impressionou, talvez mais que tudo, é por esta hora haver uma petição já assinada por 50.000 (sim, cinquenta mil) pessoas para retirar o juiz Ivo Rosa da magistratura. Isto é espectacular. Não gostamos das decisões do juiz? Fazemos uma petição para o tirar de lá. Se a justiça e a democracia funcionassem mais assim, o país andava melhor. Mas é por não sermos regidos a petições públicas por tudo e por nada que não passamos da cepa torta.

Não gostamos do Primeiro-Ministro? Petição para sair. Não concordamos com o que disse o Presidente da República? Petição para se trocar de presidente. Não queremos mais petições descabidas? Petição para acabar com elas.

Não vos vou mentir, fiquei fascinado com estas, pelo menos, 50.000 pessoas que acham que a justiça e a democracia são um buffet de resort de pulseirinha. Mas, já agora, podiam adiantar serviço e propor já para o cargo, para substituir Ivo Rosas, a pessoa que mais lhes agrada (se conseguirem chegar a um consenso). Eu, por mim, era o Hernâni Carvalho. Gostava de sugerir a Suzana Garcia, mas agora está demasiado ocupada a dar entrevistas a dizer que “não é racista, mas…”. Se o Hernâni não puder, se calhar uma boa hipótese é ir buscar o juiz do Juiz Decide. Sempre gostei dele. E claro, temos sempre a Cristina Ferreira, rainha de Portugal, que com certeza seria do agrado do povo português para liderar a justiça neste caso.

Portugal é tanto o país que tem um ex-Primeiro-Ministro corrupto — mas que não é julgado por isso porque o crime prescreveu —, como é o país que tem 50.000 pessoas a assinar uma petição porque não gostaram da decisão de um juiz. Portugal é tudo.

Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:

- Normalizing Non Monogamy: podcast que tenho ouvido e achado muito interessante.
- Q: documentário sobre o QAnon. HBO.