Ainda que as sondagens não sejam uma ciência exata, à volta de 16 milhões, ou seja, 26% dos 61 milhões de eleitores alemães ainda não terá decidido sobre em quem votar no domingo, mas essa incerteza não chega para pôr em causa a reeleição de Merkel para um quarto mandato após 12 anos de poder. Merkel representa para os alemães um pilar de estabilidade num mundo instável. Com ela a conduzir o governo de Berlim, o modelo de vida dos alemães não só passou quase incólume pela crise financeira de 2008, como até prosperou. A maioria não tem aspiração de mudança.
Merkel chegou ao governo de Berlim em 2005, como uma solução de recurso, talvez transitória. Talvez porque o estilo dela não inflama, não passa entusiasmo. Não é eloquente, é monocórdica nos discursos. Na crise financeira e na do Euro impôs a vontade alemã aos países do sul em crise: tornou-se detestada na Europa mediterrânica, revoltada com o que chegou a ser chamado de austericídio comandado por Berlim, mas protegeu a fortaleza alemã. Mostrou liderança na crise da Ucrânia, também perante a eleição de Trump e frente ao Brexit e, sobretudo, ao abrir as portas da Alemanha no começo da crise dos refugiados.
No momento em que milhões de desesperados em fuga da guerra na Síria tentaram a esperança na Europa, Merkel fez o que tinha a fazer: acolheu-os. Embora sabendo que isso lhe ia valer hostilidades internas e muitos votos, Merkel levou a Alemanha a acolher um milhão e 200 mil refugiados. Na Europa, só a Grécia e a Itália foram assim generosas – Portugal também merece lugar no pódio da solidariedade.
Num mundo que tem nas cabinas de comando gente como Trump, Putin, Erdogan e criaturas como o alucinado de Pyongyang, talvez a Europa e até o mundo precisem mais do que a Alemanha de Merkel como líder.
Resta saber como será o próximo governo de Merkel. A coligação CDU-CSU encabeçada por Merkel tem prometidos uns 37% dos votos. Vai precisar de aliados. O SPD, que há seis meses, quando Martin Schulz assumiu a liderança do grande partido à esquerda, chegou ao topo nas sondagens, caiu para à volta dos 20%. O SPD está no governo em coligação com Merkel, os ministros sociais-democratas passam por ter feito bom trabalho, mas os louros ficam com a chanceler chefe do governo. Schulz não foi capaz de mostrar convincentes políticas alternativas.
Será que a “GroKo”, a grande coligação de bloco central entre a CDU/CSU e o SPD vai continuar? É uma das questões no voto do próximo domingo. A que se acrescenta a possibilidade de Schulz vir a assumir a pasta das Finanças, até aqui gerida por Schauble, detestado, como o malvado da austeridade, por muita gente nos países do sul. Especula-se com essa possibilidade de um social-democrata respeitável tomar a condução financeira da potência alemã, mas talvez não haja mais do que as especulações. Tudo vai depender da distância eleitoral entre a CDU/CSU e o SPD. Se for, de facto, na ordem dos dezassete pontos percentuais anunciada nas últimas sondagens, alguma base SPD tenderá a reclamar que o partido entre numa cura de oposição.
É também por isso que há atenções voltadas para os lugares seguintes no quadro destas eleições: os liberais FDP, agora politicamente deslocados para a direita, aparecem com 9,5% das intenções de voto; os verdes, surgem com 7,5%. Poderão ser alternativa na parceria com a coligação democrata-cristã/cristã-social.
Mas há um outro caso: é a extrema-direita Alternative fur Deutschland (AfD), que aparece com 10 a 12% das promessas de voto. É um partido formado há apenas quatro anos por um grupo de académicos com postura anti-europeia e xenofóbica. Soube explorar o sentimento anti-imigrantes. Merkel, como Schulz, não quer nada com eles, mas tendem a ser uma fonte de alta pressão no próximo parlamento.
Afinal, estas eleições alemãs, merecem mesmo maior atenção. O governo que resultar do voto tem papel vital para a Europa. Positivo ou não.
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Duas primeiras páginas escolhidas hoje, esta do Libération e esta do The New York Times.
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