Quando dizemos, criticamente, que os portugueses têm memória curta, talvez devêssemos, algumas vezes, afirmá-lo como um elogio - porque só essa circunstância permite, a prazo, um olhar imparcial sobre os factos e uma investigação limpa e meridiana. No imediato, irrita-nos a ideia de parecermos um povo alheado da realidade, e incapaz de julgar com rigor os responsáveis pelo estado em que estamos - mas depois, quando olhamos com distância para vidas e percursos como a de Mário Soares, conseguimos aceitar que a nossa memória curta garantiu, a prazo, que estadistas como ele fossem reconhecidos pela boa parte do melhor que hoje temos.
Nessa medida, foi um verdadeiro exercício de pacificação - e, em alguns de casos, de reposição da justiça… - todo o desfile de depoimentos, opiniões e análises que andaram pelos media, e até mesmo pelas redes sociais (com as excepções do costume, sempre tão tolas e previsíveis que nem conseguem incomodar, e a que nos temos de habituar, como aos emplastros que sempre aparecem nos momentos cruciais).
Há certamente muito por saber - mas a sensação com que fiquei foi a de que se fez História com alguma ponderação e sensatez, mesmo que apaixonadamente, o que só é possível porque se fala de um homem cujas intervenções decisivas para Portugal ocorreram há mais de 25 anos. Provavelmente, daqui a 25 ou 30 anos saberemos mais e com menor peso emocional - o que talvez ajude a entender atitudes, gestos, decisões, que ainda nos escapam. Mas, para começo de conversa, foram dias que revelaram maturidade e bom senso.
Bem sei que estamos perante uma figura excepcional, e que nem todos os protagonistas da nossa História recente merecerão o mesmo olhar, por mais anos que passem. Muitas figuras que hoje achamos que terão um parágrafo nos livros de estudo do futuro não passarão de uma escassa nota de rodapé. Ainda assim, serão sempre melhor avaliados se por eles passarem os anos essenciais a um análise ponderada.
Como foi o caso. Passou tempo. E o tempo é essencial quando queremos ter amplitude na análise, e profundidade no pensamento. Lições como esta podiam aplicar-se à nossa vida de todos os dias, sempre marcada pela precipitação e pelo impulso, pela rapidez com que nos exigem uma resposta ou uma decisão, e pelo generoso numero de erros que cometemos por manifesta falta de tempo. Mas isso seria toda uma outra conversa. Para hoje, só quero mesmo elogiar o tempo, lá está, “esse grande escultor”…
Três momentos imperdíveis. Para ver (e ouvir)…
Marcante, arrepiante, de uma inteligência incontornável, o discurso de Meryl Streep nos Globos de Ouro merece ser visto e revisto. O poder dos “famosos” passa mais por estes minutos uma vez na vida do que vinte passagens pela passadeira vermelha…
Felizmente, ainda há rádio. Felizmente, ainda há quem faça rádio na rádio e esta maravilhosa invenção que foi a Internet permite agora perpetuar a melhor rádio que se faz. Desafio-vos a parar o “zapping” no computador e seguir Fernando Alves (sonorizado por Herlander Rui) nesta genial reportagem feita a partir de "A Vida no Campo", o livro de Joel Neto. ”Leva-me à Estrada do Paraíso” leva-nos, sim, ao paraíso do rádio.
É uma notícia. É uma reportagem. E ainda por cima é um vídeo inspirador. Editado pelo jornal britânico The Guardian, recorda-nos que o jornalismo do presente é feito desta capacidade de interactividade entre notícias, conjugação de plataformas e linguagens. Além de sensibilidade à flor da pele.
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