Não há dia em que não me digam que tenho, e temos, de ser moderado, de despolarizar, de ser menos extremista, sempre em relação a fascismo, racismo, machismo ou direitos LGBTI+. E com tanto reparo, fiquei a perceber então que, para muitas pessoas, ser democrata, anti-racista, feminista e pro-direitos LGBTI+ é ser um tão perigoso extremista como quem quer destruir a democracia, quem aprova e pratica a opressão de pessoas segundo a sua etnia, quem aprova e pratica a violência de género sobre a mulher, e quem aprova e pratica a discriminação a todas as pessoas não heterossexuais e cisgénero.

Assim sendo, num pólo temos a defesa dos direitos humanos, querendo a melhor vida possível para o maior número de pessoas possível, e no outro temos a sua destruição e, portanto, o sofrimento e morte da grande maioria da população. E o que me dizem é “nem tanto ao mar, nem tanto à terra”. Ou seja, é ficar ali a morrer na praia. O que pode ser literalmente, por exemplo no caso dos refugiados que tentam chegar a uma Europa moderada nos direitos humanos.

Eu ia jurar que estas coisas não eram pólos, que ser antifascista não era um extremo como ser fascista, e que apreciar a democracia seria algo já em si bastante moderado e não extremista.

Pensava que havia posições mais progressistas ou mais conservadoras, de esquerda e de direita, dentro do espectro democrata, e que fora disso estava o fascismo. Mas pelos vistos temos de ter mais calma a ser antifascistas, quer sejamos de esquerda ou de direita, para não sermos extremistas que chamam logo fascista a alguém, só porque esse alguém acredita na supremacia branca, no patriarcado, na destruição do Estado Social e na eliminação das liberdades sexuais, de género, de criação artística e muitas outras. É capaz de ser precipitado chamar logo fascista a estas pessoas, de facto. Temos de ser mais moderados nisto e também no resto.

Moderadamente anti-racistas deve ser achar divertido ver um pivôt negro, mas achar parvo que pessoas negras se indignem com o racismo sistémico evidenciado na polémica do Soul. Ser despolarizado no feminismo deve ser repudiar a violência doméstica, claro, mas também apelar à calma nisso de as mulheres quererem exactamente os mesmos direitos que os homens. E por aí fora.

Isto tem grandes vantagens, sendo que uma das maiores é não termos de nos comprometer séria e profundamente com nenhuns destes valores, não tendo também de beliscar o nosso privilégio de localização social.

Portanto, já sabem. Moderem-se. Acreditar na democracia e nos direitos humanos, sim. Mas com calminha.

Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:

- Lugar de Fala: livro de Djamila Ribeiro.
- Ver os debates: ou ser sobre eles e sobre os candidatos, para votar informadamente. Já passou o tempo do “não quero saber de política”. Isto é sobre a vida de todos, sobre o futuro do país.