Notícia chocante, esta que vos trago, mas alguém tinha de o fazer. Não é algo de que me orgulhe, ou até que me seja fácil de aceitar, mas a verdade é que há mais portugueses para além do Ronaldo. Como é óbvio, somos todos de somenos importância quando comparados com o Deus da Portugalidade Aquém e Além Fronteiras Pai de Todos Nós Salvador da Nação Melhor Pessoa de Todo o Mundo Honra Lhe Seja Feita (título honorífico). Não é que não se soubesse que há mais portugueses, a questão prende-se mais com – alegadamente – Ele não ser realmente a única que pessoa que importa no país.

A comunicação social tem feito um trabalho excelente, atenção. Destaco em primeiro lugar a desportiva (jornalistas e comentadores) que, por exemplo, neste último jogo da Selecção em que Ele não jogou, conseguiram ainda assim, e de forma brilhante, falar mais Nele do que em qualquer outro jogador, incluindo aquele rapazinho que marcou dois golos cujo nome não importa. Sinto que ficou apenas a faltar um comentário que dissesse que com Ele na baliza teríamos levado ainda menos do que zero golos.

Felizmente, o resto da comunicação social também tem estado à altura deste acontecimento histórico: Ele também tem um lado humano, também ficou infectado com covid. Graças ao profissionalismo de tantos editores, temos sabido praticamente tudo o que precisamos de saber sobre a situação da covid em Portugal, ou seja, tudo sobre o Ronaldo. Dois dos momentos mais altos foram, primeiro, quando interromperam uma reportagem sobre a covid nas escolas, para mostrar em directo a forma como Ele entrava no avião: forte, alegre, corajoso, assintomático. Depois, quando ontem passaram a emissão para o live de Instagram que Ele estava a fazer para dizer aos seus fãs que se sentia muito bem.

Claro que não tem sido tudo perfeito. Tem havido dias em que não sabemos o que Ele comeu ao pequeno-almoço, como está a cor do ranho Dele, se fez cocó mole ou duro ou se tem algum pêlo encravado. Não saber isto pode (e deve) deixar-nos angustiados, mas temos de ser fortes.

Sabemos que Portugal é Ronaldo, e só quando Ele estiver bom é que nos podemos preocupar com os quase 3000 casos novos por dia, com o SNS, com a economia, com o desemprego, com as escolas e com todas essas trivialidades. Daí que o papel da comunicação social seja imprescindível para sabermos tudo sobre O Português.

No entanto, reitero que têm sido incríveis a fazer parecer que Ele é sinónimo de Portugal, e daí vir como um choque esta notícia de última de haver mais portugueses para além de Ronaldo.

Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:

- Mendigos e Altivos: que livro lindo do Albert Cossery. Mas lindo, lindo, lindo.