Lisboa, 2028. O leitor recebe uma notificação nos óculos de realidade aumentada, pela manhã, antes de se dirigir para uma manifestação a favor da restituição do Rendimento Básico Universal (consagrado em 2023 e abolido em 2025).

Santos Populares cancelados

Após muita especulação, foram finalmente divulgadas informações concretas em relação à abolição das celebrações dos Santos Populares. Na verdade, a festa em si não será extinta, mas desenrolar-se-á com profundas alterações.

Em primeiro lugar, a partir do ano corrente, as bancas de sardinhas estão “absolutamente proibidas”, revela documento oficial da Câmara Municipal de Lisboa (CML). Em vez do costumeiro grelhador instalado no meio da via, o tradicional petisco apenas poderá ser degustado nesta época se for entregue através de drones da Uber Eats. Mas há mais.

A bifana foi interditada, na sua versão de febra de porco em pão, sendo apenas permitida uma bifana de seitan em tapioca. Segundo a previsão de vários penalistas, ingerir entremeada poderá vir a constituir crime público, nas vindouras alterações ao Código Penal. Para além disso, versões originais de Quim Barreiros e demais artistas de música ligeira estão também barrados, sendo que, dentro do género, apenas o projeto Dois Brancos e Um Preto poderá ser escutado e, atenção, somente através de earphones.

É “expressamente proibido” fumar em todo o recinto do evento, com exceção dos miradouros. “Se precisa muito de um cigarrinho, não custa nada ir à janela”, atira a Presidente da CML, a quase-septuagenária Madonna Louise. As festas têm de acabar às 21h, porque, segundo refere a edil “os nossos residentes jantam pelas seis e isso é preciso ser respeitado”. Isto na generalidade das zonas da cidade, porque no Quartier Mauresque (anteriormente conhecido como Mouraria), as celebrações serão consentidas apenas até às cinco da tarde, em virtude de ser um condomínio fechado.

Recorde-se que o atual executivo camarário vive em estado de graça após ter aprovado a instalação de Pilaretes Anti-Pobres, polémico mobiliário urbano que impede que alguém com rendimentos inferiores a 30 000€/ano aceda aos bairros históricos.

Mais importante do que as alterações práticas, será porventura a mudança do conceito. A denominação “Santos Populares” foi proibida, sendo que naming foi vendido a uma empresa de mediação imobiliária. Doravante, as festas da capital serão designadas por “Sotheby’s Lisbon Festival”.

A população maioritária da cidade, os turistas, apresenta pela primeira vez a sua marcha popular, em que os participantes se locomovem de Segway, para não cansar. Contudo, nem tudo se altera. Os bailaricos, por exemplo, ainda são tolerados. Ainda assim, se um indivíduo do género masculino convidar outro do sexo feminino para dançar, sujeita-se a ser detido de imediato por assédio sexual agravado.

Num esforço para conter a despesa, os casamentos de Santo António foram substituídos pelos matches no Tinder do mesmo padroeiro. Sociólogos do ISCTE afirmam que, ao contrário do que se poderia prever, as relações provenientes deste último contrato são, na verdade, mais duradouras.

Apesar de várias alterações já serem conhecidas, por ora nem tudo está esclarecido em relação ao certame deste ano. A Confraria de Gastronomia Politicamente Correta ainda não se pronunciou sobre a questão do Caldo Verde. A iguaria poderá ainda ver a sua designação alterada para Caldo Multicolor, em virtude das queixas ao Tribunal de Haia por parte da Associação de Defesa da Cor Castanha e do Movimento Pelo Avermelhado, pigmentos também presentes na afamada sopa de couve. É esperar para ver.

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