Sou uma seguidora fiel da Catarina Oliveira, também conhecida nas redes sociais por espécie rara sobre rodas. Se não seguem, façam o favor, irão aprender muita coisa. Eu aprendo sobre o capacitismo, equidade, inclusão e, muitas vezes, pasmo com informações que, admito sem qualquer problema, me eram totalmente desconhecidas. 

Uma coisa é imaginarmos estar numa cadeira de rodas, ou com qualquer outra deficiência; outra completamente diferente é perceber como é a vida de quem tem de lidar com o que a sociedade proporciona – ou não! – a quem tem limitações de mobilidade. Como diz a Catarina, ela não quer ajuda para subir um passeio, quer uma rampa. 

Há dias, fiquei siderada com esta informação: para a Catarina vir do Porto a Lisboa de comboio, precisa de informar a CP com seis horas de antecedência. Seis horas, senhores, em pleno século XXI, porque a CP precisa de preparar terreno para receber uma cadeira de rodas. Escreveu a Catarina Oliveira na sua conta de Instagram: “Viajo de comboio, mas só com aviso. A CP continua a reduzir, e ainda bem, o número de horas necessárias para o pré-aviso exigido a pessoas com mobilidade condicionada para viajar". 

Começou com 24 horas, reduziram para 12 horas e agora, recentemente, para as 6 horas anunciadas! Então, qual é o problema, Catarina? Precisamente esse, o ter de avisar quando e a que horas vou viajar, quando não tinha de o fazer no passado, antes de ser uma pessoa com deficiência. Mas será complicada a logística de “não avisarem”? A logística, na prática, é simples. Acreditem, been there”. 

 E qual é a dita logística que implica que a CP precise das tais seis horas de aviso? A pessoa compra o bilhete e menciona a sua condição física e, na carruagem, o revisor valida o bilhete. Será que o revisor é avisado de que terá um passageiro com mobilidade condicionada? Quem sabe? Tudo é possível. 

O revisor é o do costume, o mesmo que faz as carruagens de fio a pavio durante a viagem, e que verifica se não existem passageiros clandestinos. Bom, como a Catarina Oliveira explica, a situação ainda é mais surreal porque tem de preencher um formulário e aguardar a confirmação, por parte da CP, de que pode embarcar. Se não receber o telefonema de confirmação, como é fácil de imaginar, a empresa lava daí as suas mãos e não se sente obrigada a embarcar seja quem for que tenha mobilidade condicionada. Essa coisa chata de terem de trazer a cadeira de rodas? Pois, uma maçada. 

Ora, uma vez aceite a viagem, a passageira e a sua cadeira, o que precisa de ser feito é simples: o revisor, na carruagem 4, carrega num botão e permite o embarque. 

“Ora bem, se eu quero hoje ir a Lisboa no próximo Alfa, não posso. Pasmem. Se eu estou em Lisboa e decido que quero voltar no Alfa seguinte, não posso. Pasmem. E porquê? Porque sou uma cidadã com deficiência. No século XXI, 2022”, escreve Catarina Oliveira. E acrescenta que está cansada de levar com areia nos olhos e que não tem como entender a complexidade da situação que a obriga às tais seis horas de pré-aviso, sujeitas a confirmação telefónica. Acham isto normal? Como é que isto é normal? A inclusão é fundamental. A deficiência, seja ela qual for, parece ser exacerbada por quem a não tem. Qual será o objetivo? Geralmente, as pessoas que não têm qualquer condição ou limitação não pensam nestas coisas, eu sei por experiência, mas a vida encarrega-se, tantas vezes, de nos surpreender e quando a sociedade fecha os olhos e discrimina e infantiliza quem tem menos mobilidade, ou outra deficiência, está a dizer o quê? Que são cidadãos de segunda? Tantas perguntas, tão poucas respostas. 

Nesta vidinha em que a velocidade ao nível da comunicação é estonteante (embora seis horas sejam um contra-senso e uma eternidade), ter alguém com a capacidade de meter o dedo na ferida, partindo da sua experiência, chamando os bois pelos nomes, é de saudar. Com tristeza e espanto, temos de aplaudir a Catarina e outros; temos de reconhecer que não fazemos o que devíamos e que as empresas não evoluem porque, parece, dá muito trabalho. Lá está, uma cadeira de rodas? Que maçada.