Ximenes Belo e os abusos sexuais. O que aconteceu em Díli?

Alexandra Antunes
Alexandra Antunes

O ex-administrador apostólico de Díli e Nobel da Paz Ximenes Belo terá cometido, durante vários anos, abusos sexuais. As alegadas vítimas eram menores e os casos vêm agora a público através do jornal holandês De Groene Amsterdammer, que publicou vários testemunhos.

De quantas vítimas fala o jornal?

Na sua edição online, o jornal explica ter ouvido várias vítimas e vinte pessoas com conhecimento dos casos, incluindo “individualidades, membros do Governo, políticos, funcionários de organizações da sociedade civil e elementos da Igreja”.

“Mais de metade das pessoas conhecem pessoalmente uma vítima dos abusos e outras têm conhecimento de casos. O De Groene Amsterdammer falou com outras vítimas que recusaram contar a sua história nos media”, refere a jornalista Tjirske Lingsma.

"Paulo" e "Roberto", as duas alegadas vítimas entrevistadas para o artigo, “conhecem outras vítimas”, refere o jornal, um dos principais semanários do país.

Quando aconteceram os abusos relatados?

É referido que os alegados abusos terão começado ainda antes de Ximenes Belo ser nomeado bispo, quando ainda era superior nos Salesianos de Dom Bosco, em Díli, na década de 1980.

Os timorenses citados no artigo referem alegados abusos cometidos na década de 1990. Hoje com 42 anos, "Paulo", uma das vítimas, alega que quando ainda era menor foi alvo de abusos sexuais na casa de Ximenes Belo, por troca de dinheiro.

O jornal explica que as primeiras investigações remontam a 2002, quando um timorense denunciou que o seu irmão era vítima de abusos.

Porém, não há detalhes públicos sobre se as denúncias chegaram a ser formalizadas, quer junto das autoridades policiais, quer junto do Vaticano.

Na altura das investigações, o que fez Ximenes Belo?

Em novembro de 2002, Ximenes Belo anunciou a sua resignação do cargo, alegando problemas de saúde e a necessidade de um longo período de recuperação.

“Estou a sofrer de fadiga mental e física, o que requer um longo período de recuperação”, referiu num comunicado em que informava ter solicitado à Santa Sé a renúncia do cargo de Administrador Apostólico de Díli, função que exercia desde 1983.

“Tenho vindo a sofrer de esgotamento, cansaço físico e psicológico, pelo que necessito de um longo período de repouso em vista de uma recuperação total da minha saúde”, apontou.

Ximenes Belo, hoje com 74 anos, explicou que o seu pedido – escrito com base no Cânone 401 do Código de Direito Canónico — foi aceite pelo então Papa João Paulo II.

Em entrevista à agência de notícias católica UCA News, em 2004, explicava que saiu do cargo em Díli para ser sacerdote assistente em Moçambique, estando atualmente a residir em Portugal.

A saída de Ximenes Belo de Timor-Leste causou grande surpresa na sociedade timorense, porque, até então, o bispo nunca havia indicado essa vontade de abandonar o cargo.

O que diz o Vaticano sobre esta situação? 

Os contornos da saída de Ximenes Belo de Timor-Leste, em novembro de 2002, nunca foram totalmente clarificados pelo Vaticano, com o assunto a tornar-se tabu no país.

Em 2020, em declarações à Lusa, um elemento superior da Igreja Católica em Díli, que solicitou o anonimato, escusou-se a revelar se houve ou não uma demissão formal de Ximenes Belo pelo então Papa João Paulo II.

A mesma fonte referiu-se, porém, ao que disse serem “instruções” para este “ter um perfil baixo, não viajar, não mostrar insígnias episcopais, ter uma atitude modesta”.

Parte do silêncio sobre o Nobel da Paz deve-se, admitiu a mesma fonte, ao facto da postura do Vaticano relativamente a abusos sexuais na Igreja ter mudado com os dois últimos papas, com a adoção de uma política de “tolerância zero”.

Hoje, Marco Sprizzi, representante do Vaticano em Timor-Leste, referiu que o caso está com os órgãos competentes da Santa Sé, sem confirmar se o prelado foi ou não investigado.

“Pessoalmente não posso nem confirmar nem desmentir porque é uma questão de seriedade da minha parte, visto a competência ser dos meus superiores na Santa Sé”, disse à Lusa. “Esta questão deve ser dirigida diretamente à Santa Sé”, referiu.

Contudo, Sprizzi explicou que o caso “está à atenção dos Dicastérios competentes da Santa Sé e da Secretaria de Estado de sua Santidade o Papa Francisco”, numa referência a estruturas que integram a Cúria Romana.

“Eles estão a examinar este artigo e o seu conduto e de outros que estão a ser publicados neste momento e, a partir disto, qualquer resposta virá diretamente da Santa Sé”, rematou.

Até lá, certamente muita tinta vai correr sobre o que aconteceu em Díli.

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