A escola de computação que a UPTEC vai organizar em junho é, antes de muitas outras coisas, o exemplo de um encontro feliz. É assim que o descreve o seu principal mentor, Luís Sarmento, quando se refere à sua "parceira" de iniciativa, Clara Gonçalves, diretora executiva da UPTEC. Os dois desenharam um programa pensado para aprender, mais do que ensinar, sobre coisas que ainda não existem mas que já estão a ser pensadas um pouco por todo o mundo. Não é por acaso o cognome da iniciativa remete para o que será a tecnologia em 2068 - é porque é exatamente isso que os seus promotores querem por do "alunos" a pensar.

O Future of Computing vai trazer ao Porto um conjunto de oradores internacionais, alguns de empresas como Microsoft e o Swiss National Supercomputing Center e outros de universidades como a de Zurique (Suíça), Jena e Heidelberg (Alemanha), Porto e Lisboa (Portugal), Delft (Holanda), entre outras.

Luís Sarmento começou a pensar nesta ideia no último ano, que foi o primeiro que passou em Portugal depois de estado desde 2013 como engenheiro na Amazon. Quando regressou encontrou um país diferente, com grande dinamismo na criação de startups, mas sem grande capacidade de diferenciação tecnológica.

"As startups estão a ficar todas iguais, porque seguem todas a mesma cartilha de empreendedorismo que alguém as convence que é o caminho. E estamos a assistir a um fenómeno de autoconvencimento de que estamos a fazer tudo bem", afirma Luís Sarmento.

Nem vale a pena pergunta: "e não estamos?". Percebe-se no tom e, na realidade, é senso comum assumir que nunca se está a fazer tudo bem. Mas, então o que falha? "A nossa tecnologia está atrasada, e está assim porque as nossas universidades estão 10 anos atrasadas. Porquê? Porque os professores dão aulas e não fazem investigação, porque há subfinanciamento, porque as universidades não têm capacidade de atualizar os seus programas de ensino rapidamente e não criam cadeiras em antevisão daquilo que podem ser as necessidades futuras. O facto de termos dois ou três casos muito positivos, como ainda recentemente aconteceu com a Elvira Fortunato, não faz a regra nem o ecossistema".

O desafio da Escola da Computação é precisamente ajudar a suprir esse atraso, colocando as pessoas a pensar em tecnologias emergentes e em problemas e soluções que nos serão colocados nos próximos cinco, 10, 20 anos."Como serão os computadores em ... 2068" é mais que uma pergunta retórica; trata-se do mote para um programa de 5 dias onde serão discutidos temas como computação neuromórfica, computação quântica, computação química e computação biónica. Não é ficção científica, assegura Luís Sarmento, são todas elas tecnologias que estão em desenvolvimento e em alguns casos em teste no mundo fora. Um comboio que, na sua opinião, é preciso apanhar para podermos criar coisas diferentes. "O que nos falta em Portugal neste momento é o passo da imaginação, ninguém diz que quer por o homem em Marte".

Do lado da UPTEC, este é o tipo de desafio a que a organização gosta de se lançar. Mesmo sendo um dos mais antigos e dinâmicos ecossistemas de startups — ou por isso mesmo. Pela razão óbvia, diz Clara Gonçalves: quem trabalha na UPTEC quer pensar o futuro. Nomeadamente o dos computadores, essas máquinas que tanto têm evoluído e que ainda vão chegar mais longe. “Faz parte daquilo que vão ser as nossas atividades nos próximos 10 anos avançarmos com um conjunto de escolas que preparem o futuro em diferentes áreas”, explica diretora executiva. E o pontapé de saída é dado com esta “escola de computação”.

A ideia é “perceber o que será eventualmente a computação nos próximos 10, 20, 30, 40, 50 anos, com alternativas com base na química, na física e na biologia, que nos permitam começar de novo a computação, com base num suporte científico diferente que não a computação mecânica e eletrónica — que é a que existe e a que é comum a quase todas as áreas e suporta o desenvolvimento económico”.

No Porto, de 25 a 29 de junho, fala-se de computadores. Mas podia ser sobre qualquer outra coisa — e vai ser, num futuro próximo. “Talvez daqui a meio ano, ou ainda lá para o final do ano, lançamos um novo desafio, de uma nova escola, a pensar um novo futuro que passe, por exemplo, por perceber o que vai ser o futuro da alimentação, o que vai ser uma possível colonização do homem em Marte, o quê que eventualmente pode ser o futuro de muita coisa. Porquê? Pensar o futuro implica que nós tenhamos de mudar muita coisa no presente. Isto é histórico, não é nada que venha da nossa cabeça”, diz Clara.

Nesta escola, o conhecimento vai transbordar e pode vir um pouco de todo o mundo. “O grande objetivo da UPTEC com isto é, primeiro, juntar um conjunto de especialistas do mundo inteiro, que traga know how e que diga a muita gente o quê que está a fazer e que transmita o conhecimento a muita gente; e colocar um conjunto de alunos — o foco destas escolas são efetivamente alunos de doutoramento que estão a fazer investigação e que se interessam por estas matérias ou as estão a trabalhar, o que não significa que não venha mais gente — que possam pensar connosco o que é a tecnologia e o que vai ser a tecnologia. Vamos poder vislumbrar o que vão ser os modelos de negócio do futuro, com base na tecnologia que não existe”.

A escola tem feito os possíveis para atingir o maior número de pessoas. “Estamos a fazer um grande esforço de divulgação para chegarmos a todos os locais do mundo, aos cinco continentes. Não sei se já chegámos à Austrália; à Ásia, à China, já chegámos com toda a certeza, a Singapura, à Nova Zelândia. O objetivo é mesmo [atingir] os cinco continentes e termos aqui a nossa base de dados alargadíssima”, explica. As inscrições decorrem até 29 de abril.

Luís Sarmento confessa que gostaria de ver uma "turma" nesta escola distribuída de forma equilibrada entre alunos, nomeadamente de mestrado e doutoramento, e profissionais que já estão a trabalhar com tecnologia em empresas, sejam startups, sejam grandes empresas. "Para uns e para outros, tenho a certeza que estes dias vão ajudar a pensar novas ideias".

Pensar o futuro é, também, dar bases a quem passa pela UPTEC e ter sempre a porta aberta para o que for necessário. “Nós apoiamos gente que traz tecnologia e ideias e trabalhamos com eles — podem ser investigadores, podem ser alunos, ex-alunos, gente de Portugal, gente internacional, seja de onde for.” Para isto, existem momentos de networking e de apresentação de quem se é e do que se faz. Mas, no fim, o que importa é, segundo Clara Gonçalves, olhar "para a tecnologia ou ideia e percebermos que existem vários modelos de negócios, articulá-los e depois testá-los”.

Mas o processo não fica por aqui. “Se nós trouxermos estes alunos de doutoramento, estes alunos que estão a fazer investigação, estamos também a potenciar a probabilidade de que eles criem uma startup. Estas escolas terminam com um hackaton, que serve essencialmente para pensar estes modelos de negócio e que tragam pessoas que ajudem estes alunos a pensar. Os que eventualmente estiverem interessados têm na UPTEC um suporte, claro”, acrescenta.

São cinco dias futuristas, intensos, num programa que conta com alguns dos mais reputados nomes na computação ao nível mundial. Uma ideia que, na realidade, pode ser sumarizada nas palavras de Luís Sarmento: "o que é que vai ser fixe daqui a cinco anos?"


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