Hoje o dia amanheceu frio e húmido, o humano sente-se adoentado e resolve ficar de cama. Usa o smartphone para chamar o seu robô doméstico, que desperta da noite que passou ligado ao carregador de baterias e se dirige ao quarto. Quando chega ao pé da cama pergunta ao humano qual o seu pedido, ao que este solicita que lhe prepare o pequeno-almoço e que faça uma chamada ao seu médico de família. O robô dirige-se à cozinha e, enquanto efetua a chamada e a direciona para o smartphone do humano, comunica com o frigorífico e a torradeira para estabelecer os próximos passos: ir buscar o sumo, depositar as fatias de pão para torrar. Enquanto aguarda pelas torradas, o robô liga remotamente a televisão no quarto do humano, no seu canal preferido ou escolhe um programa que ele não pôde ver ontem, disponível online. Entretanto, a chamada para o medico de família terminou e o robô recebe por email a receita, reenviando-a a um robô autónomo de exteriores, membro da rede de robôs comunitários da freguesia local, que a vai levantar à farmácia mais próxima.

Feitas as torradas, o robô do humano regressa com estas e com o sumo num tabuleiro ao quarto do homem, servindo-lhe o pequeno-almoço. Depois parte para a rotina diária de aspiração do pó da casa, dirigindo-se aos locais detetados como mais sujos por sensores de lixo instalados na residência, com os quais está ligado em rede. É interrompido pela chegada do robô com os medicamentos, que aciona a campainha eletrónica do apartamento. Abre-lhe remotamente a porta e aguarda que o robô comunitário apanhe o elevador, ao qual comunica o andar do humano, para o receber à porta do apartamento, recolher os medicamentos e pagá-los por via eletrónica. Entretanto, um dos vizinhos do humano apanhou o mesmo elevador, mas o robô de entregas tem um comportamento social na presença de humanos e utiliza o elevador de uma forma que respeita as normas sociais, incluindo cumprimentar o vizinho. Recolhidos os medicamentos, o robô do humano fecha a porta e vai levar-lhos, descrevendo as doses diárias e o número de vezes por dia em que os deve tomar. Mais tarde, irá lembrar o humano para tomar os seus comprimidos nos momentos indicados.

Cenário de ficção científica? Talvez não faltem muitos anos para que deixe de o ser, e muitas das capacidades descritas neste cenário ilustrativo já estão disponíveis nos robôs de serviços modernos. O que falta é a execução fiável e por períodos longos sem intervenção humana para manutenção e reparação, bem como a integração de todas as capacidades descritas, e a sua interligação com as dos restantes dispositivos em rede. Não é pouco, mas o caminho está à vista.

Poderíamos alargar este cenário para incluir veículos autónomos (de transporte pessoal ou coletivo) que circulam nas nossas cidades, comunicam entre si usando a nova rede 5G que está a chegar ao nosso país, sabendo assim como gerir o trânsito em cruzamentos em avenidas congestionadas ou coordenar-se de forma a possibilitar uma velocidade média mais rápida na hora de ponta, reduzindo as emissões poluentes e os gastos de combustível. Estes veículos  podem ainda regressar sozinhos às garagens ou parques das habitações, libertando a cidade de milhares de veículos estacionados. Ou mesmo táxis aéreos, baseados em veículos aéreos autónomos.

Noutra área, podemos considerar ter robôs a ajudar médico(a)s e enfermeiro(a)s nos hospitais, transportando comida e medicamentos, realizando jogos com crianças hospitalizadas ou estimulando a atividade cognitiva de idosos com doenças neurodegenerativas, enquanto o(a)s profissionais podem dedicar mais tempo ao contacto pessoal com estes e outros doentes. Ou robôs que fazem a ronda noturna no supermercado para identificar produtos em falta e recolocar na prateleira correta produtos deslocados pelos clientes de forma inadvertida, e que depois ajudam durante as horas de trabalho a conduzir clientes ao produto, após estes terem dialogado com funcionário(a)s que os ajudam a encontrar o que necessitam, estando mais libertos das tarefas rotineiras.

Poderíamos ainda pensar em cenários menos frequentes, mas de grande risco e emergência, como a ocorrência de um tremor de terra. Nesse caso, equipas de robôs autónomos aéreos e terrestres, muito ágeis, seriam rapidamente lançados para fazer uma avaliação da situação no terreno e depois apoiar equipas humanas a chegar a locais de acesso difícil e perigoso para resgatar sobreviventes. Ou ainda robôs marinhos, que podem dirigir-se ao local do desabamento de uma ponte e mergulhar à procura de corpos de pessoas encarceradas em carros que caíram no fundo do rio.

Estes são cenários que poderão ser típicos das cidades inteligentes (smart cities) do futuro, à medida que conceitos de que ouvimos falar nos nossos dias, como os Sistemas Ciberfísicos e a Internet das Coisas (interligando dispositivos inteligentes que falam entre si, monitorizam variáveis diversas e atuam sobre o meio envolvente), passarem a incluir robôs móveis autónomos. Um cenário que é ilustrado num projeto financiado pela União Europeia, no âmbito do programa Horizonte 2020, que promove soluções para estes cenários através de competições de robôs em que participam universidades, centros de investigação e empresas.

As competições decorrem sob a égide da chamada European Robotics League (ERL), que teve como percursor um projeto europeu coordenado pelo Instituto Superior Técnico e pelo Instituto de Sistemas e Robótica em 2013, e incluem desafios para robôs domésticos, robôs profissionais (em centros comerciais ou hospitais) e robôs de busca e salvamento, terrestres, marinhos e aéreos. Os robôs interagem com humanos de diversas formas e auxiliam-nos numa variedade de tarefas. Recentemente teve lugar a primeira edição da ERL Smart Cities no maior centro comercial de Milton Keynes, no Reino Unido. Milton Keynes é ela mesmo uma cidade projetada nos anos 60 do século XX para ser dotada de inteligência (até tem robôs móveis comunitários para entrega de comida), pelo que foi o local ideal para este evento. Os robôs de 10 equipas europeias apresentaram-se no passado mês de setembro no centro comercial enfrentando vários desafios, como servir os clientes num café, partilhar um elevador com frequentadores do centro comercial, gerir produtos num armazém ou levar medicamentos através de multicópteros a pessoas que adoecessem subitamente no imenso espaço do centro comercial.

Em 2021 haverá nova edição da ERL Smart Cities, estando aberta uma Call para que cidades europeias se candidatem. Lisboa é uma das possibilidades, e há trabalho a ser realizado, em conjunto com a Câmara Municipal, nesse sentido. Veremos se os robôs do futuro nos virão visitar por essa altura.