Na habitual conferência de imprensa no arranque do festival, ainda antes da abertura oficial, Lucrecia Martel revelou que não estará presente no jantar de gala, na sexta-feira, dedicado a Roman Polanski, no dia em que apresenta "J'Accuse".

"Não vou à gala dedicada a Polanski, porque represento as mulheres que estão a lutar na Argentina por questões como esta. Não quero pôr-me de pé e aplaudi-lo", disse Lucrecia Martel, referindo-se aos casos de violação e agressões sexuais envolvendo aquele cineasta.

Lucrecia Martel não se opõe à presença do filme de Polanski no festival, por considerar que é um pretexto para o diálogo e a discussão, mas é da opinião que se não se separa a obra artística do seu autor. "Creio que há aspetos importantes do trabalho que revelam o seu autor", disse.

Numa declaração enviada pelo festival horas depois, Lucrecia Martel disse que alguns relatos das suas palavras mostravam que havia sido “profundamente incompreendidas”.

“Já que não separo a obra do autor e reconheci muita humanidade nos filmes anteriores de Polanski, não me oponho à presença do filme na competição. Não tenho qualquer preconceito contra o filme e claro que o verei como qualquer outro trabalho em competição”, afirmou Martel no comunicado.

Em causa estão as acusações de abuso sexual e violação ao realizador franco polaco Roman Polanski, desde a década de 1970.

Em 1977, o cineasta reconheceu ter tido relações sexuais com Samantha Geimer, então com 13 anos. Em 2010, a atriz britânica Charlotte Lewis declarou que o realizador a tinha forçado a ter uma relação sexual quando ela tinha 16 anos. Em 2017, o realizador foi acusado por duas outras mulheres: uma identificada como ‘Robin’ alega ter sido vítima de agressão sexual aos 16 anos, em 1973; Renate Langer assegura ter sido violada por Polanski quando tinha 15 anos.

"É difícil definir qual a melhor abordagem perante pessoas que cometeram certos atos e foram julgadas por eles. Creio que estas questões são parte dos debates da atualidade", afirmou a realizadora, citada pela publicação Deadline.

Lucrecia Martel mostrou opiniões divergente do diretor do festival Alberto Barbera, presente também na conferência de imprensa e que defendeu Roman Polanski como "um dos últimos mestres vivos do cinema da Europa".

Outro dos pontos de discórdia entre ambos foi a escassa presença de realizadoras na seleção oficial desta 76.ª edição, com a cineasta argentina a defender a existência de quotas.

A competição oficial conta com 21 filmes, dos quais apenas dois são realizados por mulheres, com a saudita Haifaa al Mansour e a australiana Shannon Murphy.

"Não me deixa feliz [o recurso a quotas], mas não sei que outra forma podemos ter de forçar a indústria a pensar de maneira diferente. Isto não quer dizer que qualquer filme dirigido por uma mulher faz uma grande leitura sobre a Humanidade, mas é inquestionável que o cinema não representa a complexidade da sociedade", disse.

Alberto Barbera manifestou-se abertamente contra a existência de quotas na seleção de filmes em festivais, defendendo mudanças nas escolas de cinema e no acesso ao financiamento à produção.

O festival de cinema de Veneza, que começa hoje, conta com dois filmes portugueses na seleção oficial: “A Herdade”, de Tiago Guedes na competição pelo Leão de Ouro, e “Cães que ladram aos pássaros”, de Leonor Teles, na secção “Orizzonti”.

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