A Semana de Moda de Nova Iorque, que acontece duas vezes por ano na cidade americana, começou na quinta-feira passada e termina amanhã, quarta-feira. Calhou na mesma semana de calendário da cerimónia dos óscares, o que não era o ideal para uma iniciativa que ainda tenta recuperar de várias temporadas sem brilho. Os estilistas tentam sempre encher a primeira fila com atores e atrizes famosos, mas este ano muitos estavam em Los Angeles, onde as grandes festas de Hollywood competiram com as de Nova Iorque.
Até Tom Ford, diretor do Conselho de Designers de Moda dos Estados Unidos (CFDA na sigla em inglês), que ajuda a organizar o evento em Nova Iorque, decidiu rumar a Los Angeles. "Não há nada realmente mais visível que Los Angeles no momento dos óscares", disse Ford. "Alguém me perguntou outro dia como posso justificar o desfile em Los Angeles sendo o diretor da CFDA", alegou em entrevista ao site Business of Fashion. "Lembrei-lhe que se trata do Conselho de Designers dos Estados Unidos, não de Nova Iorque".
A chegada de Tom Ford à chefia do CFDA gerou esperança em relação a um evento que estava com claras dificuldades de afirmação: o estilista reduziu a semana de moda para cinco dias para lhe dar mais força e grandes nomes como Tommy Hilfiger e Rihanna desfilaram as suas coleções em Nova Iorque em setembro do ano passado.
Mas, nesta edição, Tommy Hilfiger apresentará a sua coleção em Londres, e Jeremy Scott, em Paris. A atriz e cantora Rihanna, que desfilou sua famosa segunda coleção de lingerie para Savage x Fenty, também não vai estar em Nova Iorque.
Ralph Lauren, Phillip Lim, Tomo Koizumi e o estilista Kerby Jean-Raymond, da marca Pyer Moss, que causou sensação na semana passada, decidiram não desfilar nessa temporada em Nova Iorque. O mesmo aconteceu com Zero+María Cornejo, que fará uma apresentação íntima em vez de um desfile.
Está clarificado o nível de dificuldade que enfrentou o evento nova-iorquino.
Apesar de tudo, grandes nomes compareceram: Marc Jacobs, Michael Kors, Carolina Herrera e Oscar de la Renta são mais suficientes para encher o olho.
As irmãs Mulleavy, da marca Rodarte, consideradas as estilistas mais originais da sua geração, voltaram também a Nova York e são um estímulo importante ao evento.
A marca Rag & Bone, cujo show conta com a utilização de inteligência artificial, volta a Nova Iorque pela primeira vez desde 2016.
Há estilistas jovens - a revista Vogue deu destaque para Kee Kim, Olivia Cheng, Tia Adeola e Kenneth Nicholson - e o a Semana de Moda de Nova Iorque tentado procurado ser mais diversa com desfiles de estilistas como o senegalês Omar Salam da Sukeina, marcas como Fe Noel, e coleções dos estilistas Aliette, LaQuan Smith e Christopher John Rogers.
Anna Wintour, diretora da Vogue (à esquerda) assiste ao desfile de Carolina Herreracréditos: John Lamparski/Getty Images/AFP[/caption]
No seu esforço de relançamento, Nova Iorque abriu as portas aos estilistas chineses nas últimas temporadas com a meta de conquistar esse cobiçado mercado. Este ano, essa foi uma meta condicionada por um fator externo à moda: o surto de coronavírus.
As marcas chinesas Mukzin e Sheguang Hu mantiveram os planos de desfilar mas outras como Angela Chen, Ricostry e Hui anunciaram a desistência devido ao coronavírus. O fecho das fábricas, divulgaram as marcas, impediu de terminar as coleções a tempo.
O arranque foi sombrio na quinta-feira, 6 de fevereiro, com o desfile de uma das marcas chinesas a ter lugar numa sala quase vazia . "A Mukzin deve ser a única marca chinesa que será vista nesta Semana de Moda de Nova Iorque", disse uma locutora antes de apresentar a coleção outono-inverno 2020 da estilista Kate Han. No desfile de Han, que mostrou peças com influências tradicionais chinesas e um toque moderno, havia filas de bancos inteiras vazias, uma raridade no evento.
"Não estamos aqui somente para apresentar as geniais vestimentas, mas também estamos a mostrar aos chineses e às pessoas do mundo todo que temos vontade, força e amor em todas as dificuldades e adversidades", disse a apresentadora.
Cerca de 1.000 compradores chineses, jornalistas, estilistas e outras pessoas ligadas à indústria da moda cancelaram, no entanto, o evento.
O conselho britânico de moda disse que também espera um número de chineses "consideravelmente reduzido" na Semana de Moda de Londres, que acontece de seguida, entre 14 a 18 de fevereiro.
Tudo isto não impediu, todavia, que a organização e os estilistas dessem tudo para tornar a Semana da Moda de Nova Iorque inesquecível. Vejamos o que por lá foi feito e mostrado.
A chique Longchamp
A marca francesa Longchamp inspirou-se nas parisienses elegantes e femininas dos anos 1970. Ao estilo de Catherine Deneuve e de Romy Schneider, mas com um toque moderno.
A filha de Kate Moss, Lila Moss, a modelo Coco Rocha e Kendall Jenner, embaixadora da marca, viram da primeira fila as bermudas de couro até o joelho, as botas altas e justas de couro envernizado e as saias e vestidos bordados.
A diretora criativa da marca, Sophie Delafontaine, disse que sente que hoje pode arriscar mais em Nova Iorque do que em Paris. "Sinto-me mais livre em Nova Iorque. Quando viajamos vamos mais longe, exploramos mais", afirmou após o desfile.
Tory Burch e os Beatles
Com as atrizes Julianne Moore e Lucy Liu na primeira fila, além da editora-chefe da Vogue americana Anna Wintour, a estilista Tory Burch fez o seu desfile de domingo com tecidos floridos inspirados em porcelanas turcas, inglesas e francesas.
A coleção outono-inverno 2020, apresentada na casa de leilão Sotheby's, teve vestidos de crepe com mangas bordadas e jaqueta de napa aparentemente inspirada no álbum Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band dos Beatles.
A artista nova-iorquina Francesca DiMattio projetou as estampas, e as modelos caminharam entre 11 de suas esculturas através de cinco salas.
As estampas de DiMattio "desfazem as linhas entre feminilidade e masculinidade", disse Burch em entrevista à AFP. "Identifico-me com isso, e com toda a nostalgia da cerâmica".
Pornhub chegou à passarelle
As atrizes de filmes pornográficos Asa Akira, Marica Hase e Jade Kush foram as protagonistas do desfile "Herotica" da marca Namilia, que desfilou em colaboração com a plataforma de vídeos pornográficos Pornhub.
"A nossa marca é principalmente sobre ser positivo em relação ao sexo e a desafiar os limites", disse Nan Li à AFP.
A dupla de estilistas de Berlim Li e Emilia Pfohl desfilou em 2015 a coleção "My pussy, my choice" (A minha vagina, a minha escolha).
O desfile inspirou-se no universo pornográfico na visão masculina, mas também na representação dos ocidentais na Ásia.
Uma mulher com franjas que caem em cascata, botas de motoqueiro, minissaia e tops com pompons bordados: Namilia fascinou o público, que recebeu de prenda porta-moedas em forma de vagina.
Christopher John Rogers: "Esta roupa é cara, e deve parecer cara"
O ousado estilista afro-americano de 26 anos é um estrela em ascensão. Já trabalhou com Diane Von Furstenberg e ganhou em novembro o prémio anual do Conselhos de Designers dos Estados Unidos e Vogue (no valor de 400.000 dólares). No sábado conquistou a plateia com uma coleção ultracolorida, glamourosa e sexy.
Com 'drag queens' aplaudindo na primeira fila, Christopher John Rogers, que já vestiu Rihanna e Lady Gaga, levou para passarela um arco-íris de ternos sofisticados, macacões e vestidos monocromáticos, além de tecidos brilhantes como seda e muitos bordados com cristais Swarovski.
As modelos -várias transexuais- caminhavam lentamente, orgulhosas e confiantes.
"Esta roupa é cara, e deve parecer cara", disse Rogers à publicação Fashion Week Daily após o desfile.
Carolina Herrera: o segredo está na cor
Uma profusão de cor e vestidos refinados de "exuberância disciplinada" foram o foco nessa segunda-feira do desfile de Carolina Herrera, que apostou em Wes Gordon como estilista há dois anos, após a aposentadoria da famosa criadora venezuelana-americana.
Tecidos luxuosos, corte impecável e linhas simples criaram um drama policromático em vermelho e fúcsia, amarelo (muitas vezes combinado com preto) e azul elétrico, somado aos tradicionais branco e preto usados pela marca.
"Nesta época, minha missão e a minha obsessão tem sido trazer para marca quanta cor for possível. Amo a cor, adoro as combinações de cores diferentes", disse Gordon em entrevista à AFP após o desfile.
Em tempos de "de incerteza (...) faço com que minha vida e as coisas sobre as quais tenho impacto sejam as mais coloridas possíveis", disse o estilista.
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