A coleção de “romances guerra e paz”, hoje apresentada na Cinemateca, em Lisboa, pelo editor, Manuel Fonseca, arranca já este mês com “Mãe para jantar”, do escritor judeu americano Shalom Auslander, e “Esta ferida cheia de peixes”, da colombiana Lorena Salazar Masso.
Esta ideia nasceu de uma “vontade de sistematização dos clássicos”, que não existia até agora – com alguns romances clássicos publicados esparsamente e sem um critério específico, como “O físico prodigioso”, de Jorge de Sena, ou “Ensaio sobre a cegueira” e “Memorial do convento”, de José Saramago.
“Agora que [a Guerra & Paz] se quer converter em editora menos rebelde”, vai apostar em organizar as publicações em novas coleções – que acrescem às que já existiam -, que começam com “romances guerra e paz”, mas não se ficam por aqui, adiantou Manuel Fonseca, que tem em vista ainda para este ano o lançamento de coleções de não ficção, de ficção portuguesa e de clássicos do século XX.
O editor descreve esta primeira coleção como “elegante, intrigante, extravagante”, que dá prioridade a obras de grandes autores nunca antes publicadas em Portugal, e que “tem por trás um conceito que é o do ‘world novel’”.
Estão já preparados oito romances, os dois primeiros saem este mês e marcam a estreia dos seus autores no mercado livreiro português.
“Shalom Auslander é visto nos Estados Unidos como uma espécie de Philip Roth misturado com Woody Allen. Já tem outros três romances publicados – ‘Foreskin's Lament: A Memoir’, ‘Beware of God: Stories’ e ‘Hope: A Tragedy’ – mas decidimos pelo último, que é um romance de humor negro”, explicou.
Trata-se de uma sátira que tem por protagonista a mais inesperada minoria étnica, os canibais-americanos, é o romance de uma mãe que diz aos seus filhos “comam-me” e é um “romance com todos os cheiros, sons e paradoxos da Nova Iorque de hoje”.
O outro romance, que será publicado igualmente este mês, é a estreia literária de uma escritora colombiana, Lorena Salazar Masso, que teve uma “receção critica muito boa”, e já foi vendido para 12 países, disse Manuel Fonseca.
Nesta história, uma mãe branca leva o filho negro, que criou, a ver a mãe negra biológica que o quer conhecer. Os dois sobem um rio mergulhado numa selva de inquietação, rumores e perigos que podem desembocar no horror.
Em abril chegam mais dois livros: “As metamorfoses do elefante”, do angolano José Luís Mendonça, um narrativa de sonhos e pesadelos que começa com um surto pandémico de riso em Angola, e “Um almoço de negócios em Sintra”, do holandês Gerrit Komrij, um dos casos raros em que a editora recupera um livro já anteriormente publicado em Portugal.
Em maio, a Guerra & Paz publica “Jacob, o mentiroso”, do alemão Jurek Becker, “um êxito extraordinário em todo o mundo, traduzido em 25 línguas, com vendas de mais de um milhão de exemplares só na Alemanha e em 8.ª edição no Brasil, que deu origem a filmes e que, estranhamente, em Portugal nunca foi publicado”.
Em junho, chega às livrarias “O vidente de Étampes”, livro do escritor francês Abel Quentin, vencedor do Prix de Flore, um romance sobre um historiador, com ligação a movimentos antirracistas, que escreve a biografia de um negro, mas valorizando a sua componente poética, ligada ao jazz e à poesia, em vez da componente rácica, o que lhe vai valer ataques da esquerda progressista.
No mesmo mês, será publicado “Vida mortal e imortal da rapariga de Milão”, do já consagrado escritor italiano Domenico Starnone, um romance passado em Nápoles, “de grande trabalho linguístico”.
Em julho, chega um romance cubano, “Fantasmas de ferro”, de Emerio Medina, que ganhou quatro prémios: Casa de las Américas, Prémio Julio Cortázar, Prémio Alejo Carpentier e União dos Escritores e Artistas de Cuba.
Abrangendo um arco temporal que vai desde o início do século XX até aos autores contemporâneos, incidindo particularmente nestes últimos, esta coleção publicará um total de dez romances ao longo deste ano.
Contudo, a aposta em novas coleções não se fica por aqui, adianta o editor, afirmando estar “outra a caminho”, que começará entre maio e junho e que vai recuperar clássicos do século XX, como James Joyce, Stefan Zweig ou Joseph Roth, de quem se irá publicar “Direita e esquerda”, nunca editado em Portugal.
“Ainda este ano quero começar uma coleção de ficção portuguesa e em breve será lançada também uma coleção de não ficção, onde vamos publicar ensaios clássicos, dos séculos XX e XXI”.
Intitulada “Os livros não se rendem”, esta coleção arrancará com “O crisântemo e a espada”, de Ruth Benedict, mas publicará muitos outros autores, entre os quais Ernst Jünger e Allan Bloom.
Manuel Fonseca planeia editar também nesta coleção um livro de Steven Koonin sobre as alterações climáticas, que valeu ao autor, antigo cientista-chefe da BP e subsecretário do departamento de Energia na administração de Barack Obama, duras críticas por parte dos especialistas da área.
A Guerra & Paz está também a apostar nos suportes digitais, tanto na publicação de ‘e-books’ em paralelo com as edições de papel, como na edição de ‘audiobooks’, para o que se associou ao grupo editorial Leya.
As quatro coleções já existentes – livros brancos, livros negros, livros vermelhos e livros amarelos – são para continuar, garantiu.
“A editora quer crescer e afirmar-se com prestígio”, afirmou Manuel Fonseca, recordando que atravessou anos difíceis, em que foi preciso ir buscar a editora “ao fundo do poço”, mas que agora recuperou e quer deixar uma marca diferenciadora.
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