A expressão é de El-Rei Dom Carlos, o “Rei Turista de São Martinho do Porto” que consta ter passado férias no emblemático Solar das Palmeiras. A sua célebre citação fez sentido entre a aristocracia belle epoque, rendida aos casarios e aos encantos da vila à beira-mar, e nos tempos em que a praia era o “bidé das marquesas”: ainda hoje há quem se recorde das senhoras que iam lavar os pés na água salgada da baía. A frase é uma opinião comungada e por isso tem honras de capa, no livro de Filipa Vera Jardim e de Pedro Soares de Mello.
«São Martinho do Porto, Momentos…» tem o registo poético da escritora e a homenagem fotográfica do homem que encontrou em São Martinho do Porto a sua alma gémea. O livro da sua co-autoria é um compêndio das muitas experiências proporcionadas pela vila, de onde, nos anos 40, partiu Marcello Caetano para ir ser Ministro das Colónias. Do relvado por onde passou, conhecido como “jardim dos macacos”, avistamos os barcos à vela, de balões insuflados pelo vento de nortada que inspira regatas e competições náuticas. Pedro Soares de Mello faz vela, aqui, desde 1966. Exatamente onde terão sido construídos (com madeira do Pinhal de Leiria) os navios que levaram D. Sebastião a Alcácer-Quibir.
Esta é “a sua praia”. É da embarcação à vela e distante do pontal que traça os seus ângulos e de onde aprecia a vila cheia de momentos imperdíveis.
Top 4 São Martinho
«Assistir ao pôr do sol no Farol é obrigatório», diz-nos o homem das caminhadas de final de tarde em maré vazia. Pedro também destaca as vistas a partir da Praça Velha (Largo da Junta), do Cruzeiro e do Túnel. E aconselha-nos a visita à Praia de São Romeu – não pelos acessos, que são feitos por terra e nem sempre acessíveis, não pelos mergulhos, porque a praia não é vigiada nem perfeita para banhos. «Quando lá chegar abaixo, vai perceber porquê», garante Pedro, enaltecendo a beleza mágica daquele local. Falta falar das “almofadinhas” que se comem na pastelaria Concha, inspirada pelo formato de Concha da baía de São Martinho.
Almofadinhas ou Tranças?
“Há lugares de onde nunca se regressa, apenas se permanece”, no livro «São Martinho do Porto, Momentos» é confirmado por Nuno Guerra. Prefere as tranças da pastelaria Concha e apresenta mais uma característica distinta de Pedro, no que toca à ligação a São Martinho do Porto. Há mais de 50 anos, às mães de ambos, rebentaram-se-lhe as águas quando estavam de férias em São Martinho do Porto. Ao contrário da mãe de Pedro, a mãe de Nuno não teve tempo de chegar a Lisboa e Nuno nasceu no Oeste. «Com muito orgulho», revela-nos. Há 50 anos que passa férias na “sua terra”. Embora trabalhe em Lisboa, a romaria de verão e fins de semana é garantida e até há bem pouco tempo, os seus filhos pequenos não conheciam outro mar que este. A cada verão que passa, as famílias crescem e a tradição mantém-se: «a minha mulher aprendeu a linguagem do Oeste. Com alguma resistência, aprendeu que um dia espetacular em São Martinho pode começar com um nevoeiro forte, daqueles que não nos permitem avistar a baía. Mas faça chuva ou faça sol, o espírito é pegar na toalha e ir para a barraca e quem sabe tomar um banho na água fresquinha a dar para o gelada».
Melhor praia para ir em família
Em 2015, a praia de São Martinho do Porto foi considerada a “Melhor praia para ir em família”. Mas São Martinho sempre foi uma praia de famílias – as fotos a preto e branco registam as famílias com 10 filhos no areal (as águas são seguras para banhos), recortado pelas barracas enfileiradas, grande parte delas alugadas de ano para ano, e umas quantas “heranças” de família. E ainda há quem se recorde das empregadas fardadas que, dos casarios, vinham entregar os lanches às crianças, na praia.
Os tempos mudaram. Com a recente morte de Cecília, ícone desta praia que aqui vendeu bolas de Berlim durante mais de 40 anos, as bolas com creme nunca mais terão o mesmo sabor. Mas as maravilhas da baía estão intactas: Nuno Guerra fala-nos dos passeios de bicicleta no paredão e até Salir, convida-nos a pisar as dunas de areias finas e a ir até Alfeizerão, à casa de chá, comprar o típico pão de ló.
Lazer e bem-estar. Ramalho Ortigão já se mostrava conhecedor dos benefícios de São Martinho do Porto: «Pelo simples facto da residência à beira-mar, o apetite aumenta, a digestão opera-se mais regularmente e mais rapidamente, a respiração exerce-se com mais atividade, o sistema nervoso sobre-excita-se.»
Por estas e por outras, começamos com El-Rei Dom Carlos e fechamos com o falecido médico Sílvio Rebelo: “para veraneio, São Martinho ou a Itália”.
Este é um artigo da autoria de Paula Santos do projeto Desculpas para Ler.
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