O prémio, instituído pela Federação Nacional dos Professores (Fenprof), foi atribuído na quarta-feira por unanimidade do júri, constituído pelos escritores, professores e ensaístas José Manuel Mendes, Paula Mendes Coelho e Paulo Sucena.
“Misericórdia”, publicado em outubro do ano passado pela Dom Quixote, “confronta-nos com os nossos ‘últimos dias’, com o universo dos lares e residências onde são depositados e amontoados os que ‘vieram para ficar’. Um relato pungente dessa realidade cruel e complexa, […] uma radiografia ficcional ímpar das tensões e contradições que tal microcosmos potencia”, descreve o júri, na sua ata de decisão.
Nas palavras dos jurados, este é “um livro sobre o poder da memória e da Literatura — escrita, lida e ouvida — para combater a reclusão e o exílio impostos. Um livro sobre resistência a partir do entendimento da nossa condição neste mundo onde, afinal, ‘a história de todos nós é só uma'”.
Este foi o concurso “em que se apresentou um maior número de obras de inegável qualidade”, com “Misericórdia” a destacar-se de entre os quatro romances selecionados, a partir de uma lista de 18, referiu o júri.
Trata-se da segunda vez que Lídia Jorge é distinguida com o Prémio Urbano Tavares Rodrigues, pois já tinha sido a vencedora da segunda edição deste prémio, em 2015, com o romance “Os Memoráveis”, destaca a editora.
“Misericórdia” foi escrito por Lídia Jorge, porque a mãe, internada numa instituição para idosos, no Algarve, várias vezes lhe pediu que escrevesse um livro com aquele título.
A história decorre entre abril de 2019 e abril de 2020, data da morte da mãe da autora, que foi uma das primeiras vítimas da covid-19 no sul do país.
“A minha mãe pediu-me várias vezes para escrever um livro que se chamasse ‘misericórdia’, porque ela achava que havia um desentendimento, no tratamento das pessoas, achava que as pessoas procuravam ser amadas, mas não as entendiam. Pediu-me que escrevesse um livro chamado ‘misericórdia’, para que se tivesse compaixão pelas pessoas e as tratássemos como se fossem pessoas na plenitude da vida”, revelou a autora em entrevista à agência Lusa, por altura da publicação do romance.
Segundo a escritora, este não é um livro “mórbido” e a sua escrita não lhe suscitou sentimentos de tristeza ou dor. Antes, é um “livro sobre o esplendor da vida que acontece quando as pessoas estão para partir”, sobre os “atos de resistência magníficos, que as pessoas têm no fim da vida”.
“Misericórdia” ganhou o Grande Prémio de Romance e Novela 2022 da Associação Portuguesa de Escritores (APE) e está atualmente nomeado para o Prémio Femina 2023, o único português na corrida àquele galardão das letras francesas.
O vencedor da última edição do Prémio de Novela e Romance Urbano Tavares Rodrigues, em 2021, foi “Livro de Vozes e Sombras”, de João de Melo, sucedendo a Luísa Costa Gomes, com o romance “Florinhas de Soror Nada” (2019), a Isabela Figueiredo, com “A Gorda” (em 2017), a “Os Memoráveis” (em 2015), e a Ana Cristina Silva, com “O Rei do Monte Brasil” (em 2013).
Este prémio da Fenprof alterna com o Prémio de Poesia António Gedeão, cuja última edição, em 2022, distinguiu A. M. Pires Cabral, com “Caderneta de Lembranças”.
Os outros poetas distinguidos foram António Carlos Cortez (2020), Daniel Jonas (2018), Nuno Júdice (2016), Manuel Gusmão (2014) e Ana Luísa Amaral (2012).
Os dois prémios distinguem a obra literária de escritores que também são professores, com o objetivo de valorizar o seu trabalho “além do que é a sua exigente atividade na escola”.
Comentários