A história de “À Procura de Nemo”, filme da Pixar lançado em 2003, seria muito diferente se o estúdio que a produziu tivesse dado ouvidos aos especialistas de duas universidades parisienses que agora vêm explicar o processo de mudança de sexo dos peixe-palhaço.
É que pela altura em que Marlin e Dory chegassem ao consultório de P. Sherman, no número 42 da Wallaby Way, em Sidney, para onde Nemo é levado, Marlin, o pai do peixe perdido, seria uma pessoa nova. Porém, não seria a experiência de atravessar o oceano que o transformaria, numa metamorfose de viagem, bem ao gosto literário, noutra pessoa. Mais do que isso: Marlin chegaria ao pé de Nemo não como pai do único sobrevivente do violento ataque que abre o filme, mas como mãe. O jornal britânico Daily Mail propôs que o seu nome fosse Marlene.
Todavia, como explica Suzanne Mills, bióloga da École Pratique des Hautes Etudes, sabemos que quando a fêmea de uma família de peixes-palhaço morre ou é comida por uma barracuda (ou qualquer outro predador), o macho sofre alterações hormonais e torna-se na fêmea. A teoria não é nova, mas ressurgiu com novos detalhes acerca da transformação.
Na entrevista à emissora britânica BBC, Mills conta que “quando Nemo volta para a sua anémona, no final do filme, não vai encontrar o pai, mas a mãe”. Este processo de transformação ocorre ao longo de algumas semanas, ao fim das quais o macho, neste caso Marlin, se torna numa fêmea, que se reproduzirá com um jovem macho que viva na anémona.
“Dada a mudança de sexo, o mesmo indivíduo pode ter a oportunidade de se reproduzir como macho e como fêmea”, explica Ricardo Beldade, investigador do Centre National de la Recherche Scientifique ao Daily Mail.
Divisão de tarefas
As famílias de peixes-palhaço são um caso particular. Passam a vida em anémonas, de que nunca se afastam muito, para se manterem protegidos. Mas como nos mostra o filme, as fêmeas são mais decididas que os machos, e são elas quem defende a famílias de ataques dos predadores.
Quando a barracuda se prepara para atacar, a mãe de Nemo sai em defesa dos ovos. Marlin leva com uma barbatana e cai no equivalente piscícola da inconsciência. Só mais tarde acorda e encontra, só, o ovo de Nemo.
Esta parte da história bate certo com a biologia marítima. É que nas famílias de peixes-palhaço, as fêmeas são o maior exemplar, bem como o mais agressivo, defendendo a família até de ataques de tubarões. “A fêmea é agressiva e protege a anémona”, diz Suzanne Mills.
É por isso, explicam os investigadores, que Marlin se transformaria em "Marlene": para defender a ninhada, neste caso, o único sobrevivente dela, Nemo.
Se as fêmeas são quem defende a anémona, os machos são quem trata do apoio parental. Cuidam dos ovos e tratam dos juvenis - como, aliás, nos mostra Marlin, no filme. Uma outra equipa de investigadores, esta norte-americana, descobriu que os peixes-palhaço macho desenvolvem uma hormona semelhante àquela que facilita a criação de laços entre mães e bebés humanos após o parto, a oxitocina, ou hormona do amor.
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