A Comunidade Judaica do Porto e a Fundação Hispano-Judia de Madrid lançaram, esta semana, o documentário “As 2.000 Crianças Judias Raptadas”, uma produção de 30 minutos que relembra um episódio dramático e pouco conhecido da história do povo judeu em Portugal. O filme está disponível gratuitamente no YouTube, legendado em vários idiomas.

O documentário recorda a deportação de cerca de duas mil crianças judias, em 1493, ordenada pelo rei D. João II. As crianças, com cerca de oito anos, foram enviadas à força para a então desabitada e inóspita ilha de São Tomé, no Golfo da Guiné, a mais de 7.500 quilómetros de distância, depois de os seus pais — judeus sefarditas recém-expulsos de Espanha — não conseguirem pagar o tributo exigido para permanecer em Portugal.

O lançamento da obra é também uma homenagem simbólica às famílias dos reféns sequestrados pelo Hamas em Gaza, segundo as organizações promotoras. David Hatchwell Altaras, presidente da Fundação Hispano-Judia, sublinha em comunicado, a ligação entre passado e presente: “O sentimento de perda, dor e agonia causado pelo rapto das nossas crianças foi vivido pelos judeus muitas vezes ao longo da história”.

O episódio histórico é documentado por cronistas e estudiosos da época como Garcia de Resende, Isaac Abravanel e Shlomo Ibn Verga. Estima-se que, poucos meses após a deportação, cerca de 1.400 crianças tenham morrido devido às condições extremas da ilha, onde enfrentaram doenças, animais selvagens e gases vulcânicos tóxicos. A ilha ficou conhecida no mundo judaico como I Ha Timshaim, ou “Ilha dos Lagartos”.

Apesar das adversidades, os sobreviventes e os seus descendentes lançaram as bases para o desenvolvimento económico da ilha, com destaque para as indústrias do açúcar, vinho, carne e queijo.

Michael Rothwell, diretor dos Museus Judaico e do Holocausto do Porto, considera esta uma história essencial para compreender os ecos do passado na atualidade: “Foi uma tragédia amplamente desconhecida que sentimos o dever de recordar, pela lição histórica que oferece”.

Além da disponibilização online, a Comunidade Judaica do Porto e a Fundação Hispano-Judia estão a organizar sessões presenciais com debates em várias cidades do mundo. Em Portugal, o filme será exibido no Cinema City, em Lisboa, numa sessão presidida pela embaixada de Israel.