Paul Auster formou-se em Columbia, nos anos em que a contestação à Guerra do Vietname crescia na sociedade norte-americana e nas universidades em particular. Em 1968, foi um dos estudantes que se manifestaram contra o conflito na universidade nova-iorquina. O protesto durava há mais de um mês quando, na manhã de 30 de abril, a polícia entrou no Hamilton Hall e na Low Library, munida de gás lacrimogéneo, para desocupar os edifícios.

Frederico Lourenço junta-se ao É Desta Que Leio Isto no próximo encontro, marcado para dia 23 de maio, uma quinta-feira, desta vez com um horário diferente: pelas 20h00. Consigo traz o seu romance "Pode Um Desejo Imenso", editado pela Quetzal.

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Em maio, a propósito das comemorações dos 500 anos de Camões, o clube vai olhar de outra forma para o autor do poema épico "Os Lusíadas", através do romance de Frederico Lourenço.

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"A guerra do Vietname estava a enlouquecer toda a gente", disse Paul Auster 50 anos mais tarde à revista Vanity Fair, sobre a ocupação da universidade. "As coisas estavam a desmoronar-se e sentia-se que o caos reinava, ninguém sabia para onde íamos. A frustração de não ser capaz de parar a guerra levou-me ao relógio de sol [na alameda principal da universidade] nesse dia".

Paul Auster morreu na noite de terça-feira, em Brooklyn, Nova Iorque, quando já era madrugada de quarta-feira, na Europa. Tinha 77 anos.

É o escritor da coincidência e do acaso, do momento decisivo em que tudo muda. Os seus protagonistas parecem projeções de si mesmo e, não raro, novos enredos reencontram personagens de romances anteriores, sempre tecidos ao pormenor, num elogio ao aleatório e num desafio à improbabilidade de acontecer tudo o que acaba por acontecer.

No início de "A noite do oráculo" o protagonista da história, o escritor Sydney Orr, sobrevivente de uma doença quase fatal, encontra um caderno azul português, de capa dura, numa papelaria de uma cidade que só pode ser Nova Iorque. Há de abandonar tudo para reconstruir uma vida quase igual noutro lado, num remoinho de ficção sobre a ficção, em que a narrativa se entrelaça com notas à margem, que podem parecer reais. "As palavras são perigosas", conseguem mudar a realidade, conseguem matar, há de Paul Auster demonstrar a Sydney Orr.

O escritor nasceu em Newark, Nova Jérsia, em 03 de fevereiro de 1947, com o nome de Paul Benjamin Auster. Formou-se na Universidade Columbia, em 1970, e viveu os quatro anos seguintes em França, onde trabalhou como tradutor e preparou as teias da ficção.

Regressou aos Estados Unidos, em 1974, com a primeira mulher, a escritora Lydia Davis, e fixou-se em Nova Iorque. Iniciou então a publicação regular de artigos, histórias e traduziu autores franceses como Joseph Joubert - escritor da viragem para o século XIX, cuja obra apenas se desenha postumamente, através de cartas e pequenos textos, numa reconstrução que não deixa de sugerir uma personagem do próprio Auster.

O reconhecimento veio uma década mais tarde, em forma crescente, conforme publicava "A cidade de vidro", "Fantasmas" e "O quarto fechado à chave", que viria a reunir num só volume, como se fossem "três andamentos de uma sinfonia única", na "Trilogia de Nova Iorque". Para trás ficava o escritor de policiais Paul Benjamin, com o romance de estreia "Squeeze Play" (1984).

O primeiro livro, porém, vinha de 1982, três anos após a morte do pai. Em "Inventar a solidão" (1982) revisitou a infância, revelou que o avô paterno fora assassinado pela avó e, da relação com o pai, disse terem vivido ambos em lados opostos de um muro. "Um rapaz não pode viver este tipo de coisas sem ser afetado por elas como homem", escreveu Auster.

As memórias seriam retomadas anos mais tarde em "Diário de inverno" (2012) e em "Relatório do interior" (2013), mosaico de um percurso até à idade adulta e ao início da carreira como escritor, já depois de "Da mão para a boca" (1997).

O ano de 1979 foi também o do divórcio de Lydia Davis. Dois anos mais tarde, conheceu a escritora Siri Hustvedt com quem viveu o resto da vida. O romance de Auster "Leviathan" (1992), sobre um homem que se faz explodir por acidente, tem uma personagem chamada Iris Vegan, heroína do primeiro romance de Hustvedt, "The Blindfold" (2003).

A obra de Auster soma duas dezenas de romances, incluindo "Palácio da lua" (1989), "A música do acaso" (1990), "Livro das ilusões" (2002), "Sunset park" (2010), mais de uma dúzia de volumes de ensaios e obras de não ficção, e uma dezena de livros de poesia, que reuniu pela primeira vez em 2007.

Escreveu para palco e cinema, como "Smoke", que Wayne Wang dirigiu e Harvey Keitel protagonizou, e "Lulu on the bridge" e "A vida interior de Martin Frost", que também dirigiu.

No ensaio "Why write?" ("Porquê escrever?"), para a revista The New Yorker, de 17 de dezembro de 1995, o escritor norte-americano confessou que a sua vida literária começou na verdade aos oito anos, quando não conseguiu obter um autógrafo do seu herói de basebol, Willie Mays, dos New York Giants, porque nem ele nem os pais tinham um lápis. Auster gostava de basebol, do acaso do jogo, do modo como se decidia. Nunca mais deixou de ter um lápis consigo.

A noção do acaso seria reforçada mais tarde, quando tinha 14 anos e estava num campo de férias, recordou no mesmo ensaio. Na altura, Ralph, um rapaz da sua idade, foi atingido por um raio, num prado, a poucos metros de distância do sítio onde estava. Ralph ficou inconsciente, mas quando anos mais tarde Paul Auster usou o incidente no romance "4 3 2 1", de 2017, foi fatal para uma das quatro versões do protagonista, Archie Ferguson.

“Baumgartner”, o último romance de Paul Auster, foi publicado no ano passado, depois de ter anunciado que estava em tratamento a um cancro. A obra centra-se em Sy Baumgartner, um escritor e professor de Filosofia à beira da reforma, que tenta sobreviver à ausência da mulher, o amor da sua vida, que morrera anos antes.

No início de 2023, publicara “Bloodbath Nation”, com imagens de Spencer Ostrander, no qual refletiu sobre a violência nos Estados Unidos e a relação dos norte-americanos com as armas.

Em 2017, quando esteve em Portugal, no âmbito do Festival Internacional de Cultura, em Cascais, falou do panorama político do seu país, quando Donald Trump se aproximava do primeiro ano na Casa Branca.

Auster considerou-o um indivíduo "furioso, irracional, instável e narcisista: um perigo que se alimenta da atenção" que o mundo lhe dá. Na ótica do escritor, cabia "aos jornalistas apurarem a verdade de tudo o que se passa", partindo do princípio que o "bom jornalismo" é o "trabalho mais importante para o bem-estar do mundo" - uma profissão que via "sob ataque", colocando em risco "a fé das pessoas na verdade", numa fase em que nunca os jornalistas foram tão necessários.

Paul Auster, entre muitas outras distinções, recebeu o Prémio Príncipe das Astúrias de Literatura 2006, foi feito Comendador da Ordem das Artes e das Letras de França, em 2007, e é membro da Academia Americana de Artes e Letras e da Academia Americana de Artes e Ciências.

"A vida é simultaneamente trágica e divertida, ao mesmo tempo absurda e profundamente significante", escreveu Paul Auster na apresentação do projeto do filme "A vida interior de Martin Frost", que a Medeia Filmes de Paulo Branco coproduziu em 2007, e que hoje recorda, na sua página na rede social Facebook.

"Mais ou menos inconscientemente, tentei abarcar este duplo aspeto da experiência nas histórias que escrevi – quer nos romances quer nos argumentos cinematográficos", prossegue Auster, citado pela Medeia Filmes. "Sinto que é o modo mais honesto e verdadeiro de olhar para o mundo e quando penso em alguns dos escritores de que mais gosto – Shakespeare, Cervantes, Dickens, Kafka, Beckett – todos eles foram mestres em combinar a luz e a escuridão, a estranheza e a familiaridade."