“Et remotissima prope” é o motto da Hesperus, a editora britânica que anunciou o lançamento da primeira edição inglesa do livro de Friedo Lampe. O termo em latim sugere que se torne próximo aquilo que está distante e reflete o “compromisso” que a editora assume de recuperar “clássicos cruciais e importantes que tenham sido tristemente negligenciados ou esquecidos”, conta hoje o The Guardian.

Neste caso, o livro “Am Rande der Nacht” (nome no original) viveu na sombra desde que foi publicado em 1933. Confiscado pelos nazis no mesmo ano e retirado de venda, a obra foi considerada “perigosa e indesejável” pelo regime, em particular pelas passagens homoeróticas e pelas histórias da ligação entre uma mulher alemã e um homem negro.

Já o próprio escritor tinha a noção de que o seu romance tinha nascido “num regime em que não podia respirar”. Mas Lampe tinha esperança de que o seu texto pudesse vir a renascer anos mais tarde, lê-se numa nota no site da editora.

Esse tempo foi chegando, embora não de uma vez só. O livro voltou a ser publicado na Alemanha, em 1949, 1955 e em 1986, ainda com algumas passagens removidas. Foi preciso esperar pelo centenário do nascimento de Friedo Lampe, em 1999, para que a obra fosse publicada na íntegra pela primeira vez em alemão.

No dia 1 de fevereiro chega ao público em inglês.

O tradutor convidado pela editora britânica, Simon Beattie, recorda, em declarações ao The Guardian, a “interessante” história de vida do autor alemão: “Um escritor gay e com deficiência que viveu durante o Terceiro Reich [Alemanha nazi]. De alguma maneira foi sobrevivendo [ao regime] até ter sido morto pelo Exército Vermelho [forças armadas soviéticas]” seis dias antes do fim da guerra.

Beattie conta que o escritor acabou por ser morto “apenas” porque os militares não acreditaram que o cartão de identificação que lhes apresentou era real - Lampe tinha perdido tanto peso durante a guerra que já não se parecia com a fotografia.

Os textos de Friedo Lampe têm vindo a ser recuperados na Alemanha nos últimos anos e para 2019 está previsto o lançamento da sua biografia. Mas há uma figura de referência que acreditou no talento de Lampe desde o início. Hermann Hesse, prémio Nobel da Literatura em 1946, descrevia o escritor como tendo “uma qualidade rara” e a sua obra como sendo “tão bela e poderosa” que não “empalideceu” com a passagem do tempo, lembra a editora.