Longe dos mortos-vivos de "Walking Dead", das disputas de poder de "Game of Thrones" e de séries dramáticas cada vez mais sofisticadas, a "situational comedy" continua a atrair espectadores com o mesmo tipo de humor lançado no final dos anos 1940: personagens e cenários recorrentes, situações cómicas pontuadas por diálogos rápidos e por gargalhadas de fundo. Além de "The Big Bang Theory" [A Teoria do Big Bang],  e mesmo sem bater recordes de público, também "Modern Family" [Uma Família Muito Moderna], "The Goldbergs" e "Black-ish" têm sido renovadas ano após ano pelas grandes cadeias americanas.E, nesta temporada, novas séries aterraram nos ecrãs como é o caso de "Kevin Can Wait" e "Man With Plan".

"O género está a correr bem e espero que continue assim por algum tempo", afirma Martie Cook, professora de guionismo para televisão e cinema na Emerson College. Para ela, a longevidade destes formatos deve-se ao facto de as duas grandes alavancas das sitcom permanecerem efetivas na sociedade de hoje: o humor e histórias que são muito semelhantes às nossas vidas diárias, articuladas em torno de uma família, seja ela biológica, recomposta, ou mesmo sem qualquer parentesco.

Para Doug Smart, diretor e produtor que filma todos os anos uma sitcom com estudantes da universidade de Asbury, "o truque, é criar membros desta família que remetam para as memórias dos telespectadores", quer se trate do tio chato ou do colega de trabalho. Com a proliferação dos suportes de vídeo, incluindo o smartphone, e a produção de programas para nichos de audiência, a sitcom conserva também uma função rara: reunir a família."São 30 minutos ou uma hora em que se pode sentar com os seus filhos", observa Candace Cameron Bure, heroína da série "Fuller House" do Netflix.

Mesmo a "geração y" continua a assistir a este formato, atraída em parte por episódios de curta duração, de meia hora."Talvez adorem o imaginário, como é o caso de 'Game of Thrones', e o drama, mas gostam de comédias que estão mais próximas da realidade, com situações quotidianas", observa Doug Smart.

Outra chave para o sucesso das sitcoms é a sua virtude descompressora."Quando nos sentamos a ver", diz Martie Cook, "cortamos com o stress das nossas vidas. E rimos".

"Às vezes só quero sentar-me e rir-me de alguma coisa. Não quero pensar muito. E é exatamente esse o mote de 'Fuller House'", admitiu Candace Cameron, personagem central desta série, numa entrevista com repórteres em Nova Iorque.

O estilo teve representantes clássicos e pioneiros como "I love Lucy", "I dream of Jeannie" e "Bewitched". Nos anos 80, houve uma proliferação de títulos, não tanto memoráveis, com exceção de "Bill Cosby Show" e "ALF". De 1990 a 2000, conquistaram de vez o público, com destaque para "Seinfeld", "Will & Grace" e "The Nanny".

Netflix também aposta nas sitcoms

Evidência da durabilidade do conceito, "Fuller House" foi criado pela plataforma de televisão online Netflix, que por muito tempo manteve distância do género sitcom. Entre as poucas evoluções do conceito, está o fim das gargalhadas pré-gravadas, a famosa "pista do riso". Agora, as gargalhadas, quando existem, vêm de uma verdadeira plateia durante a gravação.

Atores e guionistas sublinham que, atrás da rotina aparente, o exercício da sitcom não é nada óbvio."Pode fazer mal ao ego quando não funciona" e o público não ri, afirma Justina Machado, a heroína de "One Day at a Time", uma sitcom que o Netflix vai lançar em janeiro.

Sob uma aparente superficialidade, Martie Cook lembra que as sitcoms, assim como as séries dramáticas mais sofisticadas, questionam regularmente a sociedade americana. Seis anos antes da legalização do casamento gay em todos os Estados Unidos, "Modern Family" escolheu entre os personagens da sua "família" um casal de homens, Mitchell e Cameron, pais de uma criança adotada. Já em fevereiro, um episódio de "Black-ish" abordou frontalmente a questão da brutalidade policial contra negros."Quando alguém fala de maneira cómica, as pessoas tendem a estar mais dispostas a ouvir", afirma Martie Cook."Pode ser que não provoque nenhuma mudança direta", explica Doug Smart, "mas ao longo do tempo, atrai a atenção dos telespectadores" sobre certas questões.