Os britânicos Horrors regressam a Portugal em dezembro com um novo álbum. ‘V’ é o mais recente trabalho da banda de “hispters góticos”, como lhes chama o The Guardian. E é também uma nova abordagem ao som e à criatividade dos próprios elementos.
“Acho que nunca fomos hipsters góticos!”, atira Rhys Webb, o homem que toma conta das teclas, do baixo, dos coros - e da pandeireta. “Sabes, nem gosto muito do termo ‘hipster’, é só aborrecido, não?”, explica por telefone ao SAPO24. “Mas presumo que ainda somos uma cambada de velhos góticos. Não sei”, acrescenta.
“É ‘na boa’. Ainda gostamos do som mais escuro da música, mas gostamos de tudo. Isso às vezes é um problema, estas palavras, palavras sem sentido, que tanto quanto sei não significam nada na verdade.”
O último álbum da banda, que já conta com mais de uma década de trabalho, recebeu cinco estrelas de Alexis Petridis, crítico do The Guardian. Cinco estrelas que “souberam bastante bem” a The Horrors. Mas Rhys não se ilude: “Temos sempre alguma apreensão quando olhamos para as críticas, nunca sabemos o que vão dizer. Acredito que as críticas não importam muito, deve ser só uma pessoa, individualmente, a desfrutar da música pelas próprias razões, acho que toda a gente, pessoalmente, terá diferentes razões para gostar de música”.
“Todavia”, acrescenta, “ao mesmo tempo, penso em nós, como banda, e às vezes fico frustrado por muitas das referências e comparações com outras bandas ou estilos de música, muitas das vezes com um tipo de coisas que nós não pensamos ser mesmo importante ou inspirador.”
No fundo, Petridis “percebeu o objetivo”: “é uma banda que tem estado a dar no duro há muito tempo e, esperemos, a fazer algumas músicas boas e é bom ser reconhecido por isso”, completa o artista britânico.
Dar no duro, construindo um som diferente daquele com que começaram, mas não totalmente inédito nos álbuns da banda. “Sempre gostámos de explorar novos sons e novas ideias. Penso que é muito importante manter uma energia criativa e excitante, trabalhando de formas diferentes, com sons diferentes - é algo que temos sempre feito em cada álbum”, explica Rhys.
Explorar o equipamento é quase parte do processo de escrever uma música.
E experimentar é inventar. “Para nós, as mecânicas do processo de gravação e dos instrumentos e todas as máquinas envolvidas são bastante importantes no som em si, muitas das vezes a experimentação é trabalharmos com as máquinas nas nossas pistas, a primeira coisa que acontece quando estamos a escrever uma música, experimentando de alguma forma com os ritmos da percussão, revertendo-os, pondo-os ao contrário, alargando-os, passando-os por samplers, e isso cria uma atmosfera e é o início de uma música.”
“Esse tipo de gravação, explorar o equipamento é para nós quase parte do processo de escrever uma música”, explica. Acaba a ser um processo "bastante livre e pode ser bastante abstrato", diz, por entre risos. Um processo abstrato, um processo livre, talvez confuso para quem veja de fora, mas que culmina numa peça com princípio, meio e fim, explica Rhys.
A banda vai saindo da garagem. Tendo contado com a ajuda de Paul Epworth, que já produziu discos para Adele, Rihanna, Coldplay ou U2, se quisermos falar de nomes das grandes estradas, ou London Grammar, Foster the People e os próprios Horrors, se quisermos olhar para nomes mais de um eventual submundo indie/alternativo ou former indie.
"Foi bom ter as ideias de outra pessoa, alguém de fora do grupo, com uma opinião mais autoritária”, explica. Mais: “foi bom bom ter ideias criativas de fora do grupo que nunca tínhamos explorado e que fala de música de novas formas".
Não pusemos a nossa criatividade em causa para ter um álbum forte.
E daí nascem as composições, de um processo "bastante livre e [que] pode ser bastante abstrato", diz, por entre risos. Um processo abstrato, um processo livre, talvez confuso para quem veja de fora, mas que culmina numa peça com princípio, meio e fim, explica Rhys.
Há, porém, quem os acuse de desvirtuar o passado. Acusam-nos como acusaram os Arctic Monkeys, contemporâneos dos The Horrors. Mas para Rhys, não houve nada disso. Nem no “V”, nem no “AM”, da banda de Sheffield. “Tudo o que queríamos fazer era gravar um álbum muito forte para nós. Não pusemos a nossa criatividade em causa para fazê-lo”, explica.
“Não sei como foi com os Arctic Monkeys. Eu prefiro o que eles fizeram mais recentemente do que nas suas fases iniciais, acho que os riffs deles estão com um estilo ligeiramente mais rockalhado, mas mais interessante do que o primeiro álbum, que era muito indie e uma cena de saltos.” “Gosto de que tenham experimentado com o seu som, para ser sincero”, atira, antes de dizer que é precisamente isso que a banda de que faz parte também andou a fazer - a explorar.
Não estamos a tentar fazer apenas músicas de três minutos, não é sequer esse o nosso objetivo
E exploram muito. Com quase todas a músicas a prolongarem-se por mais de cinco minutos, coisa rara no tempo dos streamings, não há o perigo de aborrecer o ouvinte? "Bem... Talvez. Nunca pensámos muito nisso. Acho que agora vivemos num mundo onde as pessoas ouvem 20 segundos de uma música no Spotify e depois mudam para a próxima faixa. Mas isso não é algo que nós façamos. Sempre gostámos de uma experiência um bocadinho mais imersiva".
"Ainda gosto da ideia de pôr a agulha no disco no princípio do álbum. Ainda trabalhamos dessa forma. Talvez por isso o tipo da Austrália tenha razão ao dizer que estamos atolados ou somos um bocadinho à moda antiga, mas é essa a forma de que gostamos de fazer as coisas."
É como se o álbum fosse uma viagem, "levamos-vos numa jornada. Não estamos a tentar fazer apenas músicas pop de três minutos, não é sequer esse o nosso objetivo. Não estamos necessariamente a escrever canções de três minutos. Todavia, tentar definir essa regra pode ser um desafio e é uma ideia bastante interessante, entusiasmante para fazer no futuro", explica Rhys.
O “tipo da Austrália” é Barry Divola, da Rolling Stone Austrália, que não ficou impressionado com o mais recente trabalho da banda britânica. A revista especializada em música diz que este novo trabalho mostra uma banda “atolada e com falta de visão”. "Não sei bem o que preferiam ter ouvido", comenta Rhys, entre risos. "Talvez não o tenham achado suficientemente progressivo, como um passo em frente?".
"Não sinto que estejamos atolados. Explorámos novos territórios", acrescenta o músico. "A cena é: as críticas são opiniões de uma pessoa. No fim de contas, criámos um álbum e decidir se é desfrutado ou não cabe ao ouvinte".
Mas, não há, afinal, um difícil equilíbrio entre a fidelidade ao passado e uma busca por algo novo? "Sim, tentar encontrar o equilíbrio ideal. Mas a cena é que para nós não é apenas uma questão de tentar fazer algo mais comercial, é apenas tentar fazer uma música forte, para além de ser capazes de explorar um lado mais experimental de que também gostamos, que para nós tem a ver com a criação de uma atmosfera musical, uma paisagem sonora que envolve a canção".
É essa paisagem sónica que querem montar em Lisboa, no próximo dia 10 de dezembro. "Tanto quanto sei, só aí fomos a alguns festivais", diz Rhys Webb, puxando pela memória. Por isso, tocar numa sala vai ser "entusiasmante”, antevê.
“Temos estado a ensaiar e a tocar as novas canções ao vivo. Penso que vai ser um concerto com muito do novo material, que soa muito bem ao vivo, o que é ótimo, porque às vezes trazer novas músicas para o espetáculo não soa imediatamente bem, mas neste momento estamos com um espetáculo cheio e intenso", completa.
E por isso, para dia 10 no Lisboa ao Vivo, sala na zona oriental da capital portuguesa, promete "uma grande festa".
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